Refutando comentários de recantistas
Sou uma pessoa que respeita a crença de todos e não escrevo para convencer ninguém a acreditar no que eu acredito. Apenas tenho a intenção de expressar aquilo que penso e pessoa alguma tem obrigação de gostar e concordar com o que escrevo. Porém, se eu tenho o bom senso de não entrar nas escrivaninhas dos outros para criticá-los e dizer que estão errados em suas crenças, penso que tenho o direito de exigir que não entrem na minha fazendo comentários que muitas vezes nada têm a ver com o que registro. Muitos desses comentários são impróprios, inconvenientes e aborrecidos. Houve quem me acusou de ter uma visão superficial de Deus, de ter confundido Deus com Papai Noel e até quem falou que eu queimaria no inferno.
No entanto, quero aproveitar para refutar quem criticou um texto no qual digo que a crença ou a descrença em Deus não influi no caráter, que o fato da pessoa acreditar em Deus não significa, automaticamente, que ela seja boa. Eu já tive de ler comentários realmente absurdos de gente que disse que eu deveria ver o quanto o ateísmo é prejudicial por causa das ditaduras comunistas, que mataram muita gente. Bem, isso é verdade mas, se devemos admitir que os ditadores comunistas mataram milhões de pessoas e que ninguém devia ser ateu por causa disso, então, era para ninguém ser cristão (católico ou protestante) por causa das monstruosidades cometidas por instituições religiosas durante a Inquisição, caça às bruxas, Cruzadas, colonizações e episódios como a Noite de São Bartolomeu e as Bruxas de Salem. Outros bons motivos para não ser cristão seriam o fato da Igreja ter martirizado grandes cientistas e pensadores como a filósofa e matemática Hipátia, Bruno Giordano, Miguel Servet e outros. As mortes dessas pessoas e outros tristes acontecimentos como o incêndio da Biblioteca de Alexandria prejudicaram e muito a difusão do conhecimento e da ciência. Embora se fale que na Idade Média foram criadas as primeiras Universidades, não podemos negar que o conhecimento era restrito aos religiosos e que fazer coisas como tomar banho era considerado pecado, pois significava luxúria.
Falar que o Cristianismo se espalhou pelo mundo pelo amor é negar a verdade. O que fez o Cristianismo se espalhar foi o medo. Na época da Inquisição, qualquer pessoa podia ser acusada de bruxaria. Pessoas canhotas, ruivas, com conhecimento de ervas ou suspeitas de ser judias eram presas e torturadas até confessar seus supostos crimes. Se alguém quiser, pode assistir ao filme Sombras de Goya, e ver o padre interpretado por Javier Barden aconselhar aos religiosos a prestar atenção a outros homens urinando para constatar se seus membros não eram circuncidados. Outra cena pungente é a prisão da personagem de Natalie Portman que, apenas por não gostar de carne e porco é presa por ser suspeita de ser judia. Se alguém acha que se deve deixar de ser ateu por causa dos massacres das ditaduras comunistas, então, todo mundo que for católico ou evangélico devia abandonar as igrejas depois de ler qualquer livro de História.
Entre os muitos absurdos que li foi o de que um ateu pode ser bom caráter, mas não por causa do ateísmo. Em nenhum momento, falei isso. Até porque caráter não está ligado a ser ou não ateu. Caráter é algo pessoal. Se a crença influísse, não haveria inclusive tantos cristãos nas cadeias, padres pedófilos, pastores desonestos e tantas outras pessoas que podem não perder uma missa ou culto, mas são maldosas, perversas e cheias de perfídia. Um outro preconceito é o de que faltam ao ateu os critérios mais sólidos do Cristianismo. Basta estudar as religiões e se verá que religiões mais antigas que o próprio Cristianismo possuem princípios morais. Leiamos os Vedas, Upanishads ou estudemos o Budismo para constatar. Também não foi sensato dizer que não vale o ateu ser bom porque ele não valoriza a santidade ou que ele é honesto por conveniência social, pois lhe faltariam a compaixão e pureza de costumes. Compaixão é capacidade de ter empatia, de se colocar no lugar do outro. Não é algo que é incutido em nós por causa da religião. Também não vale citar o padre Duvivier, que diz que a honradez dos ateus é apenas fachada. Tal argumento é superficial, preconceituoso e não possui consistência. Ele conhece todos os ateus para fazer tal afirmação? E quantos cristãos existem que exibem diante dos outros uma máscara de moralidade e, em segredo, levam vidas devassas, são corruptos e desprovidos de compaixão? Estudemos o Vaticano para ver seus muitos podres.
Eu também li um absurdo sem tamanho ao ver um comentário a um texto de Richard Foxe. Neste comentário, falou-se que as campanhas estimulando o uso de preservativos é que ajudavam a disseminar a Aids e que o certo seria ensinar os princípios da moral cristã. Ledo engano. Isso parece não servir nem para os sacerdotes. Se servisse, não haveria padres e pastores homossexuais, pedófilos e estupradores. Houve quem ainda tentasse me contra-atacar, falando que o número de padres pedófilos é mínimo. Não importam os números. Importa que há padres pedófilos e que, se os princípios cristãos servissem mesmo para refrear os impulsos da libido, não haveria padres pedófilos. Vale salientar ainda que campanhas de abstinência sexual contra a gravidez na adolescência se revelaram inócuas e que países que investem em educação sexual como a Suécia e Noruega têm os mais baixos índices de gravidez na adolescência. Melhor ensinar a se proteger. E é inútil dizer que campanhas ensinando a usar camisinha estimulam a promiscuidade. Uma pessoa é promíscua porque é, não por causa de campanhas esclarecedoras.
Talvez falem da compaixão cristã e que os ateus não têm compaixão mas, se alguém assistir ao filme Em nome de Deus(The Magdalene sisters), ficará realmente estupefato. Esse filme é baseado em histórias reais ocorridas na Irlanda e se passa nos anos 70, quando moças que não eram "direitas" eram mandadas pelas famílias às lavanderias dos conventos das Magadalene sisters*, em que ficariam por tempo indeterminado para expiar seus pecados. Era comum mandar mães solteiras, moças consideradas devassas ou que não fossem mais virgens. Muitas eram inocentes, como Bernadette, mandada só por ser muito bonita ou Margareth, estuprada por um primo. Quem assistir, verá como as freiras eram cruéis, loucas por dinheiro, submetiam as pobres moças a um regime de escravidão, matando-as de fome, espancando-as e humilhando-as. Numa cena repugnante, as freiras mandam todas as moças ficarem nuas e zombam de suas características físicas. No final, Bernadette escapa com sua amiga Rose e é contado um epílogo. Uma das internas, Crispina, morre louca e com anorexia. Onde estava a compaixão cristã dessas freiras que pareciam ter esquecido as palavras do próprio Cristo sobre que quem não tivesse pecado que atirasse a primeira pedra?
Então, com o fim deste artigo, espero ter esclarecido todos os pontos que pretendi refutar. Tentar diminuir os ateus e dizer que lhes faltam a compaixão e moral cristãs é tão simplório quanto usar o argumento do péssimo filme Deus não está morto, que vilanizou os ateus e colocou todos os cristãos como pessoas de bom caráter e tolerantes.
*referência a Maria Madalena, símbolo da pecadora arrependida.