A NECESSIDADE DO MITO

O médium João de Deus, o padre Cícero Romão e o personagem Roque Santeiro têm algo em comum: os prefeitos de suas cidades se esforçam até a última gota de suor para que eles permaneçam dignos da confiança dos seus discípulos!

Pesa contra o primeiro uma verdadeira enxurrada de denúncias de abuso sexual e provavelmente passará para a história como o maior maníaco sexual do Brasil. Já são quase 300 denúncias de crimes sexuais tipificados das mais diversas maneiras, entretanto, a preocupação do prefeito do município de Abadiânia (GO), José Aparecido Alves Diniz (PSD), é outra: puramente financeira!

Com cerca de 20 mil atendimentos de brasileiros e estrangeiros por mês, a Casa Dom Inácio de Loyola, local onde João de Deus faz seus serviços religiosos, emprega 40 funcionários e motiva, indiretamente, 1,2 mil postos de trabalho em Abadiânia. A cidade fica no entorno do Distrito Federal com 19 mil habitantes. O médium nega todas as acusações.

José Aparecido teme um “prejuízo monstruoso” se os turistas pararem de frequentar a cidade após as acusações de abuso sexual contra João de Deus. Essa deve ser a mesma preocupação do prefeito de Juazeiro do Norte (CE), cidade que fatura R$ 375 milhões por ano através dos romeiros que visitam a cidade todos os anos para pagar promessas ao profeta falecido em 1934.

Venerado por milhões de pessoas, especialmente nordestinas, Padre Cícero divide opiniões. Um fato notório é que ele manteve uma aliança inescrupulosa com o rei do cangaço "Lampião". Quando o cangaceiro chegava ao Juazeiro do Norte, prontamente era recebido por Padre Cícero, que o ajudava a devastar novas frentes enquanto a sua terra vivia a plena paz!

O terceiro caso, trata-se de um personagem da novela da Globo. A história de Roque Santeiro, interpretado pelo saudoso ator cearense José Wilker, é ambientada na fictícia cidade de Asa Branca. O coroinha Luís Roque Duarte, conhecido como Roque Santeiro por esculpir imagens sacras, teria morrido ao defender os habitantes de Asa Branca dos capangas do perigoso Navalhada, um bandido que havia invadido a cidade. Santificado pelo povo de Asa Branca, que atribui milagres à sua imagem, e outras pessoas, que buscavam até mesmo a sua canonização, Roque Santeiro tornou-se uma lenda e fez a cidade prosperar com sua história de heroísmo. Mas também despertou o interesse de muitos que se aproveitaram da lenda para lucrar.

Quem assistiu a novela sabe que Roque Santeiro não havia morrido e a notícia de que ele iria retornar à Asa Branca deixou toda a elite preocupada, dos comerciantes e religiosos ao prefeito, pois a cidade passara a lucrar muito em razão do mito.

Talvez sejam pelas razões acima que quando uma pessoa tenta me convencer de que todo ser humano precisa acreditar em um ser superior imaginário, eu prefira ficar em silêncio e às vezes até concorde! Há uma crença verdadeira da parte de muitos, a ingenuidade de outros e uma meia dúzia lucrando muito com o mito. Ai de quem ousar a desconstruí-lo!