Recusa: pés dos imigrantes
Padre Geovane Saraiva*
Quando olhamos para o mundo dos refugiados e dos imigrantes, vemos como são grandes os apelos por constante esforço de acolhida e solidariedade entre os povos, consequência da fé e da esperança que chegam a nós de muitos modos, em variados tempos e circunstâncias. Na feliz ocasião da celebração da Páscoa do Senhor, na qual se experimenta a vitória da vida sobre a morte, a liturgia da Igreja está a nos dizer que é tempo de superar o egoísmo, o medo e o desânimo e nos convida a dizer não às nossas próprias ideias. Como seguidores de Jesus ressuscitado que somos, que o nosso compromisso seja de levar paz onde há discórdia, vida onde há sinais de morte. A postura de Tomé vai muito além do gesto de agnóstica indiferença - nas razões para crer ou para não crer. A incredulidade de Tomé foi providencial, porque seu gesto de tocar nas feridas de Jesus marcou profundamente a humanidade, consolidou a nossa fé e nos afasta de qualquer dúvida.
Parece algo inacreditável para o mundo cristão e civilizado o cancelamento da cerimônia do lava-pés, na Igreja de San Michele Arcangelo, diocese de Oria, em Manduria, província de Taranto, Itália. Isso aconteceu entre os fiéis na celebração litúrgica, na qual deveriam estar imigrantes ou refugiados. Mas a reação foi negativa e contundente do sacerdote: “Se eles tivessem vindo, eu não estaria aqui” ("Correiere della Sera", de 2 de abril de 2018). É o ministro dessa Igreja contribuindo com provas, infelizmente, na profecia do Papa Francisco: cresce a “globalização da indiferença” contra a “cultura do encontro, do intercâmbio e da solidariedade”. Quantas barreiras a superar, quando tudo parece ser consenso dentro da Igreja, no contexto do testemunho e da hospitalidade.
O pároco daquela Igreja europeia, em sua alegativa de cancelar a cerimônia do lava-pés porque entre os fiéis participantes no ritual deveriam estar os imigrantes, foi muito infeliz: “Se eles tivessem vindo, eu não estaria aqui”. A palavra de ordem do Papa Francisco, na sua permanente luta por um mundo mais justo e inclusivo, no constante esforço de construir pontes, contraria a lógica do mundo, insistindo na edificação de muros.
Que Deus nos dê a graça, pela força da Eucaristia, a exemplo de São Tomé, em enxergar a face de Deus também no estrangeiro e imigrante. Assim seja!
*Padre, Jornalista, Colunista e Pároco de Santo Afonso, Parquelândia, Fortaleza-CE. Da Academia Metropolitana de Letras de Fortaleza geovanesaraiva@gmail.com