IMPERATRIZ TEODORA

Uma igreja em Ravenna, no nordeste da Itália, exibe um mosaico de uma mulher vestida de roxo. Ela tinha seus próprios cortesãos e os seu mosaico ocupava um enorme espaço ao lado de um mosaico de Cristo. A mulher era a imperatriz Teodora e as suas histórias ainda despertam muita curiosidade devido aos muitos extremos que ela frequentou.

Teodora viveu em uma época de grandes mudanças na igreja, linguagem e Estado. O que tinha sido Roma estava prestes a se tornar o Império Bizantino e as regiões do leste, incluindo o Egito, estavam querendo usar suas próprias línguas, insinuando a sua autodeterminação. O profeta Maomé só nasceu 20 anos depois da morte da Imperatriz.

Apesar da grande quantidade de história escrita sobre aquele período, Teodora foi praticamente ignorada. No livro História Secreta, de Procópio, que foi escrito pouco tempo depois da sua morte, em 542, ela é descrita como uma espécie de Senhora Maquiavel. Procópio a chama de prostituta, se refere a ela como “Teodora do bordel” e conta os detalhes das suas apresentações no palco onde ela permitia que os gansos bicassem grãos colocados em suas partes íntimas e dançava nua.

Procópio também conta que Teodora lamentava que Deus lhe tenha dado apenas três orifícios para o prazer. Mas quando Procópio descreve o marido de Teodora, o Imperador Justiniano, como um demônio sem cabeça, podemos supor que nem tudo que ele escreveu é verdade e que muitas histórias sobre Teodora podem ter sido exageradas com a intenção de caluniar a imperatriz e seu marido, talvez por ser contra a dinastia Justiniana ou por ser contrário às leis que Teodora apoiou como imperatriz.

O ponto de vista de Procópio sobre Teodora, que não foi publicado até o século 17, influenciou outros escritores mais tarde, mas Teodora permaneceu um enigma. O que sabemos sobre ela cria a ideia de uma mulher moderna, feminista, e quase sempre controversa. A vida e a história de Teodora chegam muito perto de se parecer com uma história de ficção.

Ela nasceu em Constantinopla por volta de 500 DC. Seu pai, domador de ursos no hipódromo, morreu quando ela tinha cinco anos e sua mãe casou com um outro domador que não conseguiu o antigo trabalho de seu marido morto. Então, ela ensaiou movimentos de súplica com suas três filhas. Vestiu as meninas e as levou para o hipódromo, um vasto complexo com capacidade para trinta mil pessoas, para solicitar formalmente um trabalho para seu novo padrasto. O desejo foi concedido e Teodora, que atuou muito bem executando os movimentos de súplica, se tornou atriz, dançarina, mímica e comediante.

Com 15 anos de idade ela era a estela do hipódromo, atuando em espetáculos que, pela narração de Procópio, não estavam longe do burlesco moderno. Ela também era, assim como a maioria das atrizes naquela época, uma prostituta.

Quando Teodora tinha 14 anos ela teve o seu primeiro filho e, por volta dessa época, ela e sua irmã mais velha eram acompanhantes de muitos homens ricos. É provável que elas tenham feito muitos abortos. Aos 18 anos, Teodora se afastou de sua carreira surpreendente, para se tornar amante de Hecebolus, o governador do que hoje é conhecido como a Líbia. Quando eles se separaram, não muito tempo depois, ela ingressou em uma comunidade ascética no deserto perto de Alexandria, onde aconteceu a sua conversão religiosa para um ramo do cristianismo primitivo, o monofisismo, que estava sob ataque por parte do estado romano.

O problema religioso era entre aqueles que acreditavam, com o estado romano, que Cristo era ao mesmo tempo humano e divino, e aqueles que, como Teodora, acreditavam que a divindade de Cristo era a sua força principal. Depois de sua conversão, ela viajou para Antioquia onde ganhou fama por ter trabalhado com a Macedônia, uma mulher um pouco mais velha do que ela, que era prostituta, dançarina e espiã. Antioquia era uma grande cidade da Síria, uma das muitas províncias que estavam começando a questionar a supremacia de Constantinopla. Os dois lados contavam com serviços de espionagem.

Aos 21 anos, Teodora voltou a capital e conheceu Justiniano. Eles eram um casal muito improvável. Justiniano era filho de um agricultor da atual Sérvia que foi para Constantinopla com 11 anos de idade para trabalhar para seu tio, o imperador Justiniano I. Justiniano tinha uma mente forte, sua codificação do direito romano, que ainda é parte da formação jurídica atual, tinha uma lei criada com a intenção de elevar o status de Teodora, e outra lei criada para permitir que ela casasse, algo que as atrizes e ex-atrizes não podiam fazer legalmente. Eles se casaram contra a vontade da tia de Justiniano, a imperatriz Eufêmia, ela mesma uma ex escrava e concubina que viu suas próprias origens em Teodora. Quando Justiniano I morreu e seu sobrinho Justiniano tornou-se imperador em 527, também como Justiniano I, “Teodora do bordel” recebeu o título de imperatriz de Roma.

Quando os senadores se encontravam com Justiniano e Teodora, eles se prostravam no chão e a relação entre Justiniano e Teodora foi descrita como uma relação entre senhores e escravos.

Teodora exercia muito influência sobre Justiniano e realizou muitas conquistas no poder. Juntos, eles reformaram toda a cidade de Constantinopla, eles construíram e reformaram aquedutos, pontes, e mais de 20 igrejas, entre as quais a Catedral de Santa Sofia. Como imperatriz, ela trabalhou para impedir os cafetões de receber dinheiro de prostitutas. Bem ciente da impossibilidade do casamento e de uma vida segura para essas mulheres, a imperatriz montou uma casa onde elas podiam viver em paz. Teodora trabalhou pelo casamento das mulheres, a legislação anti estupro, e ajudou as muitas jovens que eram vendidas como escravas sexuais pelo preço de um par de sandálias. Suas leis baniram os cafetões de Constantinopla e de todas as principais cidades do império.

Tudo isso faz de Teodora uma das primeiras feministas, mas sua história é ainda mais complicada. Existem indícios de que ela estava envolvida em envenenamentos, torturas e casamentos forçados, e mesmo tendo feito muito para ajudar mulheres e meninas em dificuldade, ela não se esforçou para ajudar as mulheres em posição mais elevada, atacando qualquer uma que ameaçasse a sua posição, incluindo a imperatriz Eufêmia.

Escravocrata e extremamente cruel, Teodora, quando aprendeu a doutrina essênia, ficou com muito medo de reencarnar como uma escrava negra e ordenou a Justiniano que revisse os códigos canônicos “para que aquilo nunca pudesse ocorrer”.

Depois de um concílio totalmente fanfarrão, votou-se que a versão oficial da Igreja seria a Helenista, baseando-se em conceitos de “Céu” e “Inferno” adaptados catolicamente do Hades e Olimpo, com uma diferença: pela imposição de Teodora, não haveria “reencarnação”.

Dessa forma, acreditavam que seria possível simplesmente finalizar o que quer que você tenha feito na Terra e subir aos céus se tivesse os contatos certos (daí surge a doutrina das indulgências).

Teodora morreu em 28 de junho de 548. Relatos da época dizem que Justiniano chorou durante todo o funeral e nunca a esqueceu. A imperatriz foi sepultada na Igreja dos Santos Apóstolos, em Constantinopla e foi declarada uma santa pela Igreja Ortodoxa Oriental onde sua festa litúrgica acontece todos os anos em 14 de novembro.

Parece que não foi só o imperador Justiniano que não a esqueceu... a própria Igreja Católica nos dias atuais, continua lembrando e respeitando a decisão que ela tomou de retirar dos Cânones o princípio da reencarnação, mesmo que isso prejudique na essência, a compreensão dos fiéis quanto à progressão da alma no mundo espiritual.