Os hebreus
Como a criação do mundo e do homem, o pecado original e a expulsão do paraíso, são narrações poéticas e simbólicas sem sentido literal, e que por isso mesmo, não podem ser passadas para o leitor comum, sem uma interpretação exegética, hermenêutica e lógica, vamos nos ater aos fatos históricos que se seguiram ao Dilúvio.
Segundo os relatos bíblicos, assim que as águas baixaram, Noé sai da Arca com a esposa e seus três filhos: Sem, Cam e Jafé. Todos casados, mulheres e filhos estão com eles.
A linhagem de Jafé perde-se nas trilhas do tempo e presume-se que tenha dado origem a raça ariana indo européia que mais tarde invadiu a Índia.
De Cam, historicamente o filho mais importante é Canaã, que foi proprietário de muitas terras, conhecidas na época como “Terras de Canaã” as quais seriam, mais tarde, “doadas” por Deus ao povo hebreu e denominada de Terra Prometida.
De Sem, descendem os semíticos, dinastia da qual nasceu o patriarca Abraão que saindo de Ur na Caldéia veio fixar residência na localidade de Hebron, motivo pelo qual o seu clã e toda a sua descendência passou a ser conhecida, entre os cananeus, como os hebreus e a sua língua de origem aramaica semítica passou a denominar-se hebraica.
Dos vários filhos que Abrahão teve, dois são essenciais para a história. O primeiro com a escrava egípcia Agar, e que se chamou Ismael, e o segundo com a esposa Sara, que foi chamado de Isaac.
Assim que Isaac nasceu, Abraão expulsou Agar e seu filho, então com mais ou menos quatorze anos, para que morressem no deserto.
Assistidos por Deus, que prometeu fazer dele, um grande povo, mãe e filho sobreviveram. Ismael, unindo-se a uma mulher egípcia, deu origem à nação árabe, ou filhos do deserto, que são os ismaelitas, do meio dos quais saiu Maomé, o fundador do Islamismo.
Isaac desposou Rebeca, com quem teve dois filhos, Esaú e Jacó. Esaú, mais tarde chamado Edom, toma por esposas duas mulheres cananéias, mas casa-se com Maalat, filha de Ismael.
Sua descendência, os denominados edomistas praticamente desaparecem dos escritos. Jacó, mais tarde, denominado Israel, teve duas esposas, Lia e Raquel e duas escravas. Com todas teve filhos, treze ao todo, sendo doze homens e uma mulher. Os filhos homens deram origem e nome às doze tribos de Israel.
O menor desses filhos chamado José é vendido por seus irmãos a uma caravana ismaelita, que vai para o Egito, onde se torna vice-rei e para lá leva toda a sua gente que se multiplica em solo egípcio. Com a subida de um novo Faraó ao trono, os hebreus são submetidos à escravidão.
Aí surge Moisés, que liberta seu povo, fazendo-os atravessar a pé enxuto o Mar Vermelho. Chegando ao Monte Sinai, Moisés, recebe de Deus, os “Dez Mandamentos”.
Por falar em “Dez Mandamentos” o povo hebreu que saiu do Egito ainda não tinha uma religião formada. A crença que os orientava era alguns resquícios Abramicos agora mesclados com as crenças politeístas e esotéricas egípcias. Somente a partir de Moisés é que o monoteísmo começa de fato a fazer parte da crença judaica.
Depois de vagar durante quarenta anos pelo deserto o povo hebreu, agora sob a liderança de Josué, atravessa também a pé enxuto, o Rio Jordão e chega finalmente em Canaã a “Terra Prometida”.
Essa terra, já estava ocupada por cananeus, amorreus e heteus, grupos estes descendentes de Cam, de Jafé, de outros clãs semíticos, inclusive alguns de Esaú, e de povos autóctones.
Para lutar pela posse da terra, os hebreus reorganizam suas tribos, cada uma com o mesmo nome da casa paterna e chefiada por um de seus descendentes.
Durante o longo período de beligerância surgiram muitos profetas, heróis, sacerdotes, homens e mulheres como Ester, Rute e reis como Saul, Davi e Salomão sob as ordens do qual foi construído o Templo de Jerusalém.
Com a morte do rei Salomão, em 930 a.C, os hebreus se dividiram, dez tribos formaram o rico reino de Israel, conhecido como reino do norte, com a capital na Samaria, de onde se originou a denominação de samaritanos.
As tribos de Judá, e de Benjamim, formaram o reino pobre de Judá ou reino do sul, com sede em Jerusalém, que veio a dar origem a denominação judeus. Os samaritanos em contato mais direto e permanente com os povos do norte foram se mesclando, absorvendo a cultura e parte da religião Cananéia e deixaram de observar a lei mosaica.
O abandono de parte das tradições e da religião hebréia acentuou ainda mais a animosidade entre samaritanos e judeus. Esta rivalidade é bem retratada nos evangelhos de Lucas 10-30,37 O bom samaritano, e em João 4-1,26 Colóquio com a samaritana.
No primeiro império babilônico, o rei Salmanasar II, da Assíria, manda atacar o reino de Israel, saqueia a capital Samaria, e deporta parte da população para a Babilônia. Em 586 a.C. no segundo império, Nabucodonosor, submete o reino de Judá, arrasa Jerusalém, destrói o Templo e leva os judeus, cativos para a Babilônia.
Libertados em 537 a.C. por Ciro, rei persa, os judeus e os remanescentes do antigo reino de Israel que ainda estavam na Babilônia retornam a sua terra e reconstroem o Templo.
Durante o longo cativeiro a convivência fez com que o povo hebreu assimilasse parte da cultura e da religião babilônica e de outros conhecimentos e práticas notadamente o zoroastrismo e crenças esotéricas como astrologia, reencarnação, espiritualismo e a magia que viriam a formar o hermetismo judeu .
Por ser oriunda de um povo errante pode se dizer que a religião judaica é uma colcha de retalhos formada com pedaços das crenças dos povos por onde passou e que foi se consolidando ao longo do tempo incorporando as crenças egípcias, a idolatria e religião dos cananeus, o esoterismo e a astrologia dos babilônicos e a religiosidade dos persas que viriam a formar as tradições e os costumes religiosos dos hebreus.
Assim, a mescla esotérica religiosa que começou no Egito mais as seitas trazidas dos povos mesopotâmicos sincretizadas nas tradições da torah ou a lei mosaica viria a criar diferentes formas de servir a Deus e dar origem a enigmática e mística cabala.
As diferentes práticas religiosas dividiram a crença e o povo hebreu em diversas seitas como as dos essênios, saduceus, farizeus, nazarenos e zelotes e influenciaram o comportamento das classes dos publicanos e dos escribas.
A seita dos essênios é a mais antiga, hermética e mística das seitas, surgiu durante o cativeiro no Egito onde teria sido fundada por um mago egípcio. A denominação Essênio vem da palavra egípcia kasai, que significa “secreto”. Para os sacerdotes de Jerusalém os essenios não passavam de uma casta desprezível de feiticeiros e curandeiros e por isso eles abandonaram as cidades e foram viver isolados nas montanhas do deserto.
A seita dos saduceus ou os justos, era formada por sacerdotes ritualistas, religiosos e políticos poderosos mais materialistas, não acreditavam em espíritos, nem na ressurreição muito menos em céu ou inferno.
A seita dos fariseus ou os separados, embora formada por comerciantes e lideres do povo com forte influencia em Jerusalém e em toda a Palestina não era essencialmente religiosa, mas acreditava em anjos, demônios, céu e inferno.
Os nazarenos não era propriamente uma seita, era formada por pessoas mais místicas religiosas que acreditava numa determinação especial de Deus, para enviar um espírito mais elevado para a terra como os profetas, e mensageiros como Elias, João Batista e o Próprio Jesus.
A seita dos zelotes era formada por grupos de judeus radicais que zelavam pelo cumprimento da religião mas não gostavam dos pobres. Na clandestinidade lutavam contra a dominação romana e foram os últimos judeus a resistir até a morte na Fortaleza de Massadas.
No ano 70 da era cristã, Jerusalém é novamente destruída, desta vez, pelas forças imperiais romanas. Do antigo Templo, só restou uma parte dos alicerces de contenção, hoje conhecido como Muro das Lamentações.
Depois dos romanos, a Palestina ainda seria dominada e ocupada por vários outros povos como persas, árabes, cruzados e ingleses, fazendo com que os judeus pouco a pouco abandonassem sua terra e se disseminassem pelo mundo. Em l947 a ONU dividiu o território entre árabes e judeus e em 1948 foi criado o Estado de Israel.
Seguindo as trilhas da história, vamos constatar que tanto os árabes, quanto os hebreus, são da linhagem de Sem o primeiro filho de Noé, e que todos são descendentes diretos do patriarca Abraão.
Assim, podemos dizer que todos os descendentes de Abrahão são ao mesmo tempo semíticos e hebreus. Ismaelitas são os descendentes de Ismael e israelitas são os descendentes de Jacó ou Israel.
Embora por analogia e por princípios religiosos se considere todos os israelitas como judeus, a rigor judeus são apenas os descendentes da tribo da Judá, inclusive Jesus.