PECADOS VIRTUAIS - As armadilhas da liberdade de opinião
“Portanto, meus amados irmãos,
todo o homem seja pronto para ouvir,
tardio para falar, tardio para se irar” (Tg 1.19).
Umberto Eco, semiólogo italiano, morto em 2016, aos 84 anos, era famoso por suas frases de efeito. Uma das mais questionadas foi a que transcrevo a seguir: “As mídias sociais deram o direito à fala a legiões de imbecis que, anteriormente, falavam só no bar, depois de uma taça de vinho, sem causar dano à coletividade. Diziam imediatamente a eles para calar a boca, enquanto agora eles têm o mesmo direito à fala que um ganhador do Prêmio Nobel. O drama da internet é que ela promoveu o idiota da aldeia a portador da verdade”.
Se a frase pode ser em parte questionável, o tema que ela aborda é de todo relevante. Vivemos a era da superficialidade, em que não só relacionamentos, mas, também, opiniões, são frágeis e impensadas. As pessoas descambaram a opinar sobre tudo e sobre todos, o que, do ponto de vista da liberdade de expressão é perfeitamente saudável, mas, por conta de uma prática irresponsável, torna-se passível de crítica e preocupação.
Longe de mim, e de todos os brasileiros, pensar na possibilidade de algo como a censura prévia existente nos governos militares. Deixem o povo se expressar. Mas, que todos saibam que, à semelhança do dito acerca dos jovens pelo sábio: “sabe, porém, que por todas estas coisas te trará Deus a juízo” (Ec 11.9), também, sobre o comportamento dos internautas nas redes sociais, Deus pedirá conta.
Em se tratando do povo evangélico, especialmente dos que se dizem comprometidos com a verdade do Evangelho, o comportamento precisa ser outro, bem mais responsável do que os milhões de postagens diárias fazem supor. Até porque, dos cristãos se espera algo além do supérfluo: a justiça deve exceder (Mt 5.20) e o ministério também (2Co 3.9). Que dirá do comportamento cibernético! O comportamento dos cristãos nas redes sociais deve ser comedido e estabelecido com base nos valores bíblicos vividos no mundo real.
Algumas dicas para agir corretamente diante do aluvião de postagens que pululam diariamente na internet, especialmente no Facebook; de longe, a mídia mais requisitada no Brasil.
1ª) Você não precisa se posicionar sobre tudo o que aparece à sua frente. Aprenda a selecionar as postagens que mereçam sua opinião ou sentimento.
2ª) Você não pode se omitir quando sua fé está sendo questionada. Ser omisso diante de algo que contraria sua fé – apenas para manter-se de bem com todo mundo –, é escolha excelente pra quem quer garantir um lugarzinho no inferno. É o único pecado sem perdão: não escolher ficar do lado de Deus (Mc 3.29).
3ª) Você precisa aprender a falar corretamente nas redes sociais. A comunicação virtual é apressada. Então, precisa ser concisa e objetiva. Mas, não é sobre isso que quero falar. É preciso saber dizer o que tem que ser dito da forma correta. Falar, sem ofender. Um pouco de polidez não faz mal a ninguém!
4ª) Você deve ter cuidado ao opinar sobre tema que não seja do seu domínio. Melhor não fazê-lo. Uma das acusações que se faz aos internautas é que, pela facilidade das mídias, muitos se aventuram por temas vários que vão surgindo e, de repente, todos se fazem entendidos em Teologia, Filosofia, Educação, Antropologia, Sociologia e outras áreas do saber. Está aí uma porta aberta para se incorrer em erro. Se tiver que comentar sobre temas que estão fora de sua especialização, faça-o sem radicalismos.
5ª) Você deve ter cuidado com as armadilhas das pseudoverdades. Há coisas, pensamentos, frases, abordagens que aparecem nas redes sociais com uma capa aparente de verdade e de valor. Nem sempre assim o é. É preciso saber de fato o que aquela postagem representa. Já vi gente boa compartilhando pensamentos que tenho certeza não acreditam, além de postagens de origem duvidosa.
6ª) Você deve perguntar sempre a intenção do outro com aquela postagem. Há casos em que o conteúdo é correto, mas o uso do conteúdo é demoníaco. Num outro contexto e em outra situação alguns conteúdos poderiam ser curtidos, compartilhados e comentados. Mas, dependendo da intenção da pessoa que postou, deve-se evitar entrar na polêmica, na intriga e na dissimulada intenção de mandar recados para alguém. Há internautas que são especialistas em indiretas virtuais. São covardes.
7ª) Você deve estar ciente de que o simples ato de “curtir” representa concordância. Ou a afirmação de que gostou do que foi postado. Conheço indivíduos que saem curtindo indiscriminadamente o que veem pela frente no Facebook. Isso é preocupante. Há coisas que não merecem ser curtidas e há aquelas que não devem ser. Por exemplo, alguém posta: “Papai morreu!” Aí você vai lá e curte. Você está dizendo: concordo, gostei, que legal. Sempre questionei isso, no tempo em que não havia as opções, como há agora, de mostrar sentimentos, além da simples curtida. O que é mentira, é calúnia, semeia discórdia, promove desagregação, não representa um bom valor e nem parte dos princípios cristãos que defendemos não pode, terminantemente, ser curtido. Um cristão não se regozija a não ser com a verdade (1Co 13.6).
8ª) Você deve estar ciente de que a ação de “compartilhar” representa divulgação. E isto, no mínimo, entre seus amigos, pois outros também poderão ver o que você está compartilhando. Compartilhar é o mesmo que postar. Isto, porque você está assumindo como sua, a postagem de outros. E um cristão não pode difundir aleatoriamente vídeos, fotos, textos, áudios e outros que tenham conteúdo reprovável dos pontos de vista bíblico, moral, ético, legal e espiritual.
9ª) Você deve estar ciente de que o investimento em tempo para “comentar” pode ser a lenha que faltava na fogueira. Sim, porque para “curtir” ou “compartilhar” basta um clique. Mas, para comentar é necessário um pouco mais de investimento. Sim, porque para “comentar” o seu interesse deve ter sido despertado para o assunto e, aí, por conta disso, você resolveu dar a sua participação. Antes, porém, de fazê-lo reflita e, depois, se pergunte: Vale a pena? Pode ser que o seu comentário, despretensioso, chegue atravessado para alguém, incomodante para outrem e estimulante para alguns mais. E aí, o que vai acontecer depois você não poderá prever. Já passou por esta situação? Então, pense duas vezes antes de colocar sua opinião em algo que viu, principalmente se o que lhe chamou a atenção traz o cheiro da pólvora da polêmica.
10ª) Você não deve se esquecer nunca que a vida real sempre será melhor que a virtual. Viver é melhor do que postar. Mas, nem todos têm esta consciência. Haja visto a quantidade de horas que jovens e adolescentes passam no mundo virtual, inclusive quando estão em eventos de sua faixa etária em que o convite a socialização é intenso. Mas, preferem se esconder atrás de um aparelho celular. Cuidado com a escravização às redes sociais. O grande cantor clássico evangélico, Feliciano Amaral, cantava a música “Pudesse Contar” cujo estribilho dizia: “Melhor que contar é viver”. Quem passa o tempo todo por trás de uma tela de computador ou celular, contando causos, não vive.
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Quero apresentar, agora, minhas considerações finais sobre o que foi abordado. Neste artigo, quisemos despertar o leitor para as armadilhas que o uso impensado da liberdade de expressão, tão bem vinda no mundo, pode fazer cair os incautos. Devemos ter cuidado com os indivíduos do mal. Há milhões deles transitando faceiramente no território livre da Internet. A admoestação paulina vale para os nossos dias: “Rogamo-vos, também, irmãos, que admoesteis os desordeiros, consoleis os de pouco ânimo, sustenteis os fracos, e sejais pacientes para com todos” (1Ts 5.14). Gente de toda sorte circula nos mundos real e virtual. Devemos aprender a lidar com elas.
Outra questão diz respeito aos falsos. Sejam de origem evangélica ou não. E, também, há milhares deles circulando por aí. Estes são aqueles que vestem uma capa bonita para camuflar sua maldade. Não são o que aparentam ser. Alguns circulam no meio evangélico, tão somente por conta do chamado “mercado gospel”. Não foi à toa que João Alexandre, autor da bela canção “Pra Cima Brasil”, sentindo ojeriza ao gospel, pediu veementemente que seu nome fosse desvinculado de tudo que possa ser identificado como gospel em nosso país. Acerca destes, ainda o Apóstolo Paulo falou sobre como era e é seu comportamento e instruiu: “Tendo aparência de piedade, mas negando a eficácia dela. Destes afasta-te” (2Tm 3.5).
Por fim, a sábia constatação do escritor bíblico acerca dos tempos e das oportunidades: “Tempo de estar calado, e tempo de falar” (Ec 3.7b). Tem gente que quer dar palpite em tudo, participar de todas as conversas e ter opinião formada sobre todo e qualquer assunto. Antes de fazê-lo, porém, questione-se se aquele seu momento e aquela oportunidade que se lhe apresenta faz parte do tempo de falar ou do tempo de se calar. Se você agir assim, irá bem! Que Deus, para tanto, nos abençoe!