DEUS DOS DESGRAÇADOS

"Senhor Deus dos desgraçados! Dizei-me vós, Senhor Deus! Se é loucura... se é verdade, tanto horror perante os Céus?!

Valho-me dos versos de Castro Alves, para descrever a degradação humana do "mundo pobre africano". Pobre de alimento, de saúde, de alegria, de dignidade e de saber. Pobre, inclusive, de Deus. Apenas abundam a fé e a esperança que nunca chega... Haja esperança para esses desesperados órfãos de Deus !!.

As imagens grotescas que a TV nos mostra, retrata, com fidelidade, o cenário onde a história acontece, mostrando ao mundo que nem governo nem religião consegue humanizar o homem e afastar dele, a exuberância da sua maldade.

A vida reclama por fraternidade que parece está distante de ser alcançada. O egoísmo humano tem chegado a nível insuportável. Colocar-se no lugar do outro, seria a melhor maneira dos homens entenderem o que se passa no "mundo africano dos miseráveis". Thomaz Hobbes tinha razão quando disse que o homem é lobo do homem. Triste verdade.

Resta-nos, então, conversarmos com Deus e, tentar entender, se possível, por quê tanto sofrimento ao miserável povo africano. Por quê tanta desigualdade? Tanto descaso. Por quê, Deus ?.

Às vezes, essa é a pergunta mais dolorosa. As pessoas fazem essas perguntas com tristeza quando a guerra e a extrema pobreza fazem padecer velhos e moços, mulheres e crianças inocentes... Todos padecem com as mãos estendidas aos deuses. Ninguém ouve seus gemidos, ninguém se importa com a sua miséria. Ninguém dar crédito à palavras de Deus que diz: ama o teu próximo, como Eu te amei. Ou talvez pensem: Se Deus amasse os pobres, ninguém o fariam sofrer... É possível que estejam certos. Parece que Deus não gosta de pobres ou não tem "poder" pra nada...

Se Deus é onipresente, NÃO estar na África.

Se Deus é onisciente, NÃO sabe o que se passa com aquele povo.

Se Deus é onipotente, por que permite o sofrimento dessa gente?

Se Deus tudo pode, por que permite tanto ódio, tanta injustiça e tanta desigualdade na terra?

Se Deus é o Todo-Poderoso, Ele tem o poder para impedi-lo. Por que, então, se refreia de agir? Não somos todos filhos do mesmo Deus?!..

Pessoas de várias religiões recorrem a seus líderes e instrutores religiosos para saber por que existe tanto sofrimento na terra. A resposta, em geral, é que Deus sabe o que faz e todo sofrimento é da vontade d'Ele. Será que isso basta? É da vontade do pai que o filho sofra? Deus não é amor? Deus não é justo?... Então, por que tanta desigualdade?

Outros tentam nos consolar, dizendo que Deus não causa o sofrimento; que Deus não é responsável pelas guerras, pelos crimes, pela opressão, nem mesmo pelos desastres naturais que fazem as pessoas sofrerem. Se não bastasse, ainda existem os que dizem que Deus deu ao homem o livre arbítrio. Tudo bem. Livre arbítrio!. - Deus cria as "armas", as "bombas atômicas" e é o livre arbítrio do sanguinário que provoca a guerra e faz o inocente sangrar? Como assim? Que pecado cometeu o povo refugiado do Iraque e da Síria?!.. A criança nasceu sem pernas e sem braços porque ela quis ser diferente? Uma família foi seqüestrada, brutalmente assassinada por vontade própria? O livre arbítrio de um, faz sofrer o outro? Como entender isso?.

Então, por meu livre arbítrio resolvo ser criminoso e o pobre pai de família é quem perde a vida? - E se eu quiser ter o livre arbítrio de não morrer, posso?!.. Isso não. Inclusive, não pode fazer muitas perguntas a Deus. Melhor que eu pare por aqui !..

Posso compreender, certamente, que as pessoas evitam questionar a Deus e indignar-se com religião, pois contestá-las pode acarretar atos de total estigmatização. - Se eu vivesse na França ou na Inglaterra, poderia até renegar a fé em Deus ou declarar-me um ateu, sem nenhum problema. Eu poderia, perfeitamente, descrer por mera falta de evidência e justificar: Não tive nenhuma experiência pessoal com Deus, não sei se Deus é homem ou mulher, negro ou branco. Não vejo nada no mundo ao meu redor, onde quer que eu olhe na história, ciência, arte ou em qualquer outro lugar, que me convença que isso foi obra de Deus em vez da natureza. Também não sei qual a natureza de Deus.

E, posso indagar mais: Que motivo eu tenho para acreditar nos profetas? Para explicar o sofrimento desse povo esquecido pelo Deus que eles acreditam? Os marqueteiros da fé utilizam-se de uma campanha infalível: Quem não tem, pede pra ter; quem tem, pede pra não perder. - E assim a fila anda...

Os miseráveis de extrema pobreza, um dia vão se cansar de esperar pela misericórdia do seu Deus inteligente, todo-poderoso que se diz preocupar com os seres humanos, mas nada faz para modificar o seu destino... Felizmente, em alguns lugares do mundo, a crença religiosa tem enfraquecido o suficiente para que as pessoas não matem umas às outras por causa dessas crendices populares e sem sentido. Já passou da hora de a raça humana crescer, amadurecer e aproveitar o que é bom da vida, incluindo o prazer de aprender como o mundo funciona, e se libertar completamente das crendices sobrenaturais para enfrentar os problemas e as tragédias reais de nossas vidas.

Não creio que dos céus ou da terra, ninguém fará contas das minhas virtudes ou dos meus defeitos... A fé religiosa é uma busca da humanidade por um significado mais profundo para a existência... Mas só porque buscamos, isso não significa que esteja lá; que o encontraremos. Então, isso posto, não acredito em dogmas de nenhuma religião, porque os mitos associados a elas me soam fantasiosos e arbitrários para que eles tenham qualquer credibilidade.

O homem não pode produzir um Deus e nele acreditar. Tampouco acreditar num Deus invisível.

Cristóvão, meu amigo cabeleireiro, lá dos "tabuleiros" de Santo Estevão, na sua simplicidade, com outras palavras, me disse: A única vez em que sou sempre tentada, momentaneamente, a acreditar em um Deus é quando tenho raiva dele pelo sofrimento monstruoso infligido ao "mundo pobre dos desvalidos", sem nenhuma razão; quem ama cuida. Sentenciou, Cristóvão!..

Achei interessante o dizer simples do meu amigo Cristóvão, porque, o sábio Filósofo francês, Voltaire, depois do terremoto de Lisboa, também disse que Deus seria um mostro, por matar tanta gente. Friedrich Nietzsche, outro sábio, disse que Deus está morto. Já o escritor português José Saramago disse que não é um ateu e, todos os dias tenta encontrar um sinal de Deus, mas infelizmente não o encontra.

Por algum momento, acho que existem dois Deuses:

O Deus que "criou" o mundo e os homens, que saiu de sena, morreu e deixou o mundo para que os homens administrassem à sua maneira, exercendo o seu livre arbítrio. Aí Nietzsche está certo em afirmar que Deus está morto. E, estando morto, nada pode fazer por ninguém.

O outro é o Deus "criado" pelos homens; não passa de imagem de adoração. Sem vida, sem força e sem eficácia.

Quero poder acreditar, mas a idéia de um Deus que tudo sabe, tudo vê, tudo pode, e, permite que coisas ruins aconteçam com seus filhos, realmente me dá arrepios... Prefiro então, acreditar, que o nosso destino está totalmente em nossas mãos e cabe a cada um de nós fazer o melhor de nossas vidas. Na dúvida, acreditando ou não, quero pedir, por derradeiro, aos Três Deuses: Senhor Deus Pai, Senhor Deus Filho e Senhor Deus Espírito Santo: Se não queres, ou não podes dar uma vida confortável a teus filhos africanos, pelos menos, então, permita-os que tenham uma morte rápida e menos sofrida !!..

Manoel Lobo, setembro/2015.

Manoel Rocha Lobo
Enviado por Manoel Rocha Lobo em 14/12/2015
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