O LEGADO ESPIRITUAL DE UM POVO

É uma experiência valiosa estudar a origem dos cultos de matriz africana no Brasil e seu universo ritualístico. Existe uma diversidade ritualística entre as diferentes regiões do Brasil, embora a tradição provenha da "Mãe África".

Os orixás atravessaram o Oceano Atlântico dentro do coração do negro escravizado. Tratados como animais,os escravos eram transportados nos tumbeiros (navios negreiros),onde se misturavam negros de diferentes locais da África, falando dialetos diversos. Esta era a forma de dificultar a comunicação e enfraquecer a identidade cultural, visando a anular qualquer articulação de uma insurreição, durante o transporte, ou uma fuga em massa.

Aqui, no Brasil, seus orixás foram sincretizados com os santos católicos, travestindo-se para driblar a cultura dominante (branca). O processo sincrético, utilizado pelo escravizado, é do conhecimento dos interessados e estudiosos deste período da nossa história; porém a questão à qual se deve estar atento, nesse processo de aculturação imposta, é: o que foi feito com este legado? A resposta exige uma compreensão quanto à banalização desta tradição religiosa, além do infame mercantilismo desrespeitoso e de má fé que se utiliza desta herança milenar, legada pelos ancestrais africanos.

A mistura de diferentes grupos étnicos, oriundos de diversos locais da África, torna este resgate difícil,ficando a cargo da oralidade a perpetuação dos dogmas e preceitos, que fundamentam qualquer religião, pois o "batuque", como é conhecido popularmente no meu Estado (RS), não possui um livro escrito de cunho sagrado que seja a referência, no qual os orixás, por meio dos "dons espirituais" dos primeiros sacerdotes, teriam ditado as normas do culto e suas leis cósmicas aos "simples mortais", a exemplo da Bíblia ou do Alcorão.

Infelizmente, algo que representa uma fatia importante do legado de uma cultura,neste caso, da africana , e a sua forma sagrada de comunicação com o Divino (ORUM), vai se transformando em algo bizarro ou excêntrico numa simulação de culto aos orixás para "Inglês ver".

Nesta breve análise, resta-nos outra questão : este processo, de banalização desta tradição milenar, é irreversível ? Os praticantes ("filhos de Santo" / iniciados) percebem a vulgarização desrespeitosa do axé (força do orixá) que é proporcional ao poder aquisitivo do cliente em prol do seu bem estar espiritual? A partir destes questionamentos, Faz-se urgente refletir , reavaliando os verdadeiros valores espirituais e culturais...

Que Oxalá nos abençoe!