CHARGES E RELIGIÃO
Muitos ocidentais têm dificuldade em entender porque alguns traços atiçam a fúria de muçulmanos, a ponto de alguns deles (extremistas) cometerem assassinatos contra os responsáveis pelos desenhos.
Para buscarmos um pouco de luz ao tema, é preciso voltar nosso olhar para o Antigo Testamento da Bíblia, pois muitas ideias bíblicas foram mantidas pelo islã. E uma delas é aquela que proíbe retratar Deus ou qualquer outra imagem ou pronunciar o nome de Deus em vão. No livro bíblico chamado Êxodo (20,4) lemos o seguinte:
“Não farás para ti escultura, nem figura alguma do que está em cima, nos céus, ou embaixo, sobre a terra, ou nas águas, debaixo da terra.”
Mais adiante:
“Não pronunciarás o nome de Javé, teu Deus, em prova de falsidade, porque o Senhor não deixa impune aquele que pronuncia o seu nome em favor do erro.”
Desde os tempos de seu profeta o islã proibiu retratos de Maomé e de Deus. Para entender porque eles se enfurecem com charges ridicularizando seus símbolos sagrados, devemos ter em mente que um católico também se enfurecerá ao ver um pastor evangélico chutando a imagem de Nossa Senhora, ou um desenhista representando Jesus de forma desrespeitosa. Ninguém gosta de ver sua mãe ou pai difamados.
Para um católico, Nossa Senhora é amada tanto ou mais do que a própria mãe desse devoto; o mesmo acontece com muitos muçulmanos que chegam a amar mais a Deus e seu profeta que aos próprios pais. A questão é: um artista deve ter total liberdade para criticar uma religião, ou é preciso parar em certo ponto?
Será que ridicularizando a fé, o crítico abrirá os olhos para o devoto testar sua fé ou vai produzir efeito contrário, isto é, vai fazer com que o devoto se apegue ainda mais forte à sua religião e odeie mais fortemente quem blasfemou contra sua crença, aumentando talvez o contingente de extremistas que grassam cada vez mais rápido em solo ocidental?
Embora eu seja a favor da liberdade dos desenhistas – também sou cartunista - eu pergunto, será que não há meios mais sutis de apontar os equívocos da religião, sem precisar lançar mão de ofensas a imagens tão caras aos religiosos? Será que vale à pena ser tão ácido nas charges, sabendo que uma minoria, mas infelizmente, mortal, pode se levantar e carregar nas tintas da vingança?