RAZÕES QUE JUSTIFICAM A MENTALIDADE DO CATOLICISMO GUERREIRO NO CONTINENTE LATINO-AMERICANO
Luiz Barros Pereira
A Igreja Católica não tinha um projeto de evangelização para o continente Latino-Americano no período colonial. Sua história estava mesclada com a história da conquista espanhola e portuguesa. Segundo PREZIA, Benedito e HOORNAERT, Eduardo (1989, p. 64), “a Igreja se afastou de seu espírito evangélico, tornando-se uma grande aliada dos conquistadores”.
Essa terra tinha dono, mas foi “doada” pelo papa para os reis de Espanha e Portugal, mas em contra partida eles deviam evangelizar os povos que aqui se encontravam. Então durante longo período os reis de Espanha e Portugal foram os grandes “missionários” do “novo mundo” através dos missionários católicos que aqui chegaram.
“Conta-se que um frade foi explicar para os nativos da costa colombiana que o papa tinha dado essas terras para o rei da Espanha, por isso todos lhe deviam obediência: ‘Disseram que o papa devia estar bêbado quando fez isso, pois havia dado o que não era dele. E o rei que pedia e tomava a doação devia ser um louco, porque pedia o que era dos outros...’ (Bidegain, Ana Maria, 1993, p. 66).
Claro que os interesses dos reis não era a evangelização dos povos nativos, mas a conquista expansionista e o lucro, por isso, travaram guerras contra os índios dizimando populações inteiras e os que não morreram foram reduzidos à condição de escravo. Para ilustrar, cito aqui, trecho da carta de Mem de Sá ao rei de Portugal.
“Mandei outros índios atrás deles, que os seguiram perto de 2 léguas e lá pelejaram de maneira que nenhum tupinikin ficou vivo. E os trouxeram a terra e os puseram ao longo da praia em ordem (de forma) que tomavam os corpos (alinhados) perto de uma légua. Muitos vieram pedir misericórdia e lhes dei pazes com a condição que haviam de ser vassalos de Sua Alteza (o Rei) e pagar tributos e tornar a fazer os engenhos” ( Carta de Mem de Sá ao rei de Portugal, de 31/03/1560. Crônica da Capitania de São Jorge de Ilhéus, apud PREZIA e HOORNAERT).
É bom lembrar que nem todos os missionários vieram aqui para legitimar a conquista, houve exceções. Segundo COMBLIN, José (2008, p.166), “muitos foram verdadeiros representantes do Evangelho e agiram profeticamente”. Entre eles podemos citar frei Antônio de Montesinos, Bartolomeu de Las Casas e os franciscanos no México.
A cruzada aqui travada contra os povos nativos encontra também sua justificativa no campo religioso. As crenças e os ritos sagrados dos nativos eram atribuídos a Satanás. Daí quando José de Anchieta, na sua criatividade artística escrevia suas peças teatrais os demônios eram trajados com a indumentária indígena e os santos com os trajes europeus.
A mentalidade de um catolicismo guerreiro implantado aqui no continente Latino-Americano tem suas origens em ideologia semelhante a que gerou a guerra contra os árabes. Aqui começou uma nova Cruzada, não mais contra os hereges, mas contra os povos por eles considerados “pagãos” e “selvagens”.
As Cruzadas eram guerras contra os hereges na defesa da fé católica, porém nesse emaranhado ideológico religioso, existiam os interesses econômicos, políticos e graças a elas Espanha e Portugal se afirmaram como pátria.
A mentalidade das Cruzadas permaneceu viva no imaginário simbólico dos povos lusos por tempos infindos e renasce nos séculos XV e XVI na expansão colonial a qual tem também os mesmos interesses.
Outro dado histórico que alimentou ainda mais a mentalidade de um catolicismo guerreiro aqui no continente Latino-Americano, foi a invasão francesa conhecida como França Antártica (1555-1567). Aqui se troca de bandeira. Antes era a bandeira divina defendida por Mem de Sá contra a bandeira demoníaca dos povos “pagãos” e “selvagens”. Agora de outro lado está a bandeira do catolicismo, contra a bandeira dos protestantes calvinista franceses.
Essa mentalidade ainda não morreu, mas sobrevive e se manifesta nas expressões preconceituosas e ante-ecumênicas entre as Igrejas cristãs e contra as expressões cultuais e culturais dos povos nativos e afrodescendentes.
Não faz muito tempo que um frade capuchinho nos seus sermões tratava os protestantes de bodes e por sua vez, os protestantes, tratavam os católicos de idólatras, adoradores da besta.
A história é como a areia da praia. Ela não esbarra em um determinado limite de maneira fixa e rígida, mas desliza-se como que lambendo a areia até perder suas forças.
A comparação serve para dizer que a mentalidade simbólica de um catolicismo guerreiro vai perdurar ainda por muito tempo e só perderá sua força quando a inspiração partir mais do Evangelho do que das páginas velho testamentárias das Sagradas Escrituras que justificam as guerras e a não aceitação do diferente.
RESUMINDO
A conquista e a evangelização do continente Latino-Americano foram feitas por membros da cristandade da Europa ocidental e eles começam aqui uma nova Cruzada, não mais contra os árabes, mas contra os povos por eles considerados “pagãos” e “selvagens” e depois contra os Calvinistas franceses. Daí pode-se chegar a uma conclusão que é a partir desses dados históricos que se estabelece no continente Latino-Americano uma mentalidade de um catolicismo guerreiro.