Deus dos Preenchimentos

DEUS DOS PREENCHIMENTOS
Miguel Carqueija


“No princípio era o Verbo, e o Verbo estava junto de Deus, e o Verbo era Deus. Ele estava no princípio junto de Deus.
Tudo foi feito por ele, e sem ele nada foi feito. Nele havia vida e a vida era a luz dos homens. A luz resplandece nas trevas e as trevas não a compreenderam.”
(Jo 1,5)


Nas discussões com ateus e descrentes esbarrei, e isso faz pouquíssimo tempo, com a bizarra expressão “Deus das lacunas”. Espantado, descobri — e sabe-se lá há quanto tempo eles vêm usando isso — que polemistas ateus acusam os crentes em se apegarem às lacunas da Ciência para justificar a existência do Ser Supremo.
Não sei se me fiz entender. A extravagante tese dos nossos irmãos ateístas é a de que, como a Ciência explicou uma série de fenômenos naturais como a eletricidade (explicou em termos, pois há muito que aprender) os crentes, em desespero, vão se encurralando nas áreas ainda não esclarecidas para aí “justificar” Deus, com os fenômenos ainda não cientificamente esclarecidos. Ainda segundo tal tese, quanto mais a Ciência avança, mas a Religião fica encurralada, apegando-se ao que não foi explicado para dizer que “aí está a ação de Deus”.
Ora de que argumentos ridiculos fazem uso os adversários da Fé!
Antes de mais nada, vamos esclarecer um ponto muito importante: Ciência é uma coisa, Ateísmo é outra. A Ciência não tem, é bom que se lembre, compromisso algum com o ateísmo; ela não tem nenhuma obrigação de endossar ou justificar teses materialistas. O compromisso da Ciência é com a Verdade, e a pesquisa do universo material.
Isto posto, lembremos também que o campo da Ciência é aparentemente infinito. Certa vez o falecido Pastor Roberto Rabelo (adventista), numa de suas interessantes palestras radiofônicas, observou com propriedade que quanto mais a Ciência avança, quanto mais descobre, mais coisa ficam para descobrir, novas incógnitas se abrem, “numa série divergente e não convergente”. Se fôssemos depender das lacunas para defender a crença em Deus teríamos quase a eternidade... mas não precisamos disso. O que os amigos ateus precisam compreender é que, para os crentes (pelo menos os católicos, e com certeza muitos e muitos outros crentes) o campo da Ciência refere-se à obra de Deus, na área imanente, enquanto a Teologia trata da área transcendente. Ora, por que chamamos ao universo de Criação? Porque é a obra de Deus. Assim, o que a Ciência estuda é a obra de Deus. Tudo, tudo o que sabemos pela Ciência — a fisiologia de uma borboleta, os processos termonucleares do interior das estrelas, as mudanças geológicas, a morfologia das baleias, o funcionamento do órgão humano da visão, o espectro eletromagnético, tudo enfim é o Livro de Deus. Portanto, se o nosso Deus é o Deus das Lacunas como eles insistem em falar, tudo bem, é o Deus das Lacunas, mas é também o Deus dos Preenchimentos. Pois não apenas as lacunas, as incógnitas, mas também os connhecimentos acumulados, os preenchimentos enfim, nos falam em Deus.
E não é por mero acaso que tantos cristãos fizeram avançar a Ciência, inclusive sacerdotes cientistas como Lemaitre (descobridor do big bang), Copérnico (iniciador da moderna Astronomia), Cristóvão Clavius (diretor da Reforma do Calendário), Mendel (descobridor das leis da Genética), Roberto Landell de Moura (pioneiro brasileiro da telefonia e radiodifusão) e tantos, tantos outros.

Rio de Janeiro, 29 de dezembro de 2013.