Foto da nebulosa de Carangueijo tirada pelo telescópio espacial Hubble
Posso perguntar se Deus existe?
Não posso provar materialmente que Deus existe, mas posso deduzir sua possibilidade.
Diante de meus olhos se apresenta uma realidade que me impõe limites. Integro o que vejo, faço parte do enredo.
Há elementos no cenário inteiramente dependentes de mim para existirem, porém, há outros completamente independentes.
A natureza e o tempo, por exemplo, preexistem a mim e a todos os seres.
O mesmo não podemos dizer das coisas construídas socialmente, estas sim, intrinsecamente vinculadas à experiência humana.
A observação da natureza desde os seus primórdios até os dias de hoje apresenta encantadores desdobramentos.
De meros adoradores animistas divinizando fenômenos ainda incompreensíveis à argutos filósofos e cientistas compreendendo e transformando a realidade, vamos seguindo na indefectível odisséia civilizatória.
Dos mistérios do átomo revelado, aos poucos, pela física quântica às insondáveis e impressionantes distâncias entre os corpos celestes vamos da surpresa à perplexidade.
Não foge a uma observação mais atenta também o contexto temporal em que tudo se desdobra.
O tempo, esse dado tão siginicativo da realidade, se apresenta como o mais persistente mistério.
A dimensão cronológica a tudo perpassa, poderíamos, de maneira ousada, dizer que dos elementos que compõem a realidade o que mais se aproxima em grandeza da idéia que geralmente se faz de Deus é o tempo.
Numa simples comparação entre a dimensão temporal e a espacial não é difícil concluir qual precede a outra.
O tempo precede a tudo.
É o tempo que permite a existência de toda e qualquer outra coisa.
É dentro do tempo que a história se faz possível.
Acho encantadora a idéia de que o tempo não é algo necessariamente dinâmico.
Dinâmica é a nossa percepção dele, assim com dinâmica é a nossa experiência fisica em relação a ele.
Se observarmos bem ele está sempre alí, sempre esteve e sempre estará.
A realidade que decorre do tempo é efêmera, transitória, mutável ante ao dado imutável e constante que lhe sustenta, o tempo.
Qual a origem do tempo? Há algo fora do tempo? O tempo pode ser relativizado?
A origem do tempo reside num dos dados da realidade que definitivamente não se tem esperança de que um dia o ser humano irá conhecer.
Quando muito há uma firme esperança de se chegar à compreensão da origem do universo material tal qual o conhecemos.
A origem do tempo, no entanto, que a tudo possibilita e permite, essa, está para além de todo entendimento racional. Essa impossibilidade, felizmente, não nos impede de indagar de querer saber, de perguntar, de supor.
Qual a origem de tudo? Haveria uma origem?
Ou a realidade existe desde sempre ou passou a existir num dado momento.
Se existe desde sempre é preciso reconhecer que não existe desde sempre tal qual se apresenta agora e se é perceptível uma mudança, é possível perceber também uma direção, uma ordem uma coerência.
Se passou a existir num dado momento e passando a existir assumiu uma configuração percebemos também essa coerência.
Coerência e caos estebelecem um fluxo de inteligência, caos só gera caos, caos não gera ordem. Para que do caos se passe à ordem é preciso ação inteligente.
Se admito a passagem do caos para a ordem sem que uma ação inteligente esteja envolvida nisso sou forçado a acreditar que existe papai noel ou fada madrinha.
Qual a natureza dessa inteligência, esse é o grande problema. Se admito a inteligência subjacente à realidade das coisas estou deduzindo algo que a meu ver parece irrefutável.
O ser humano na tentativa de comprender o incompreensível a partir de instrumentos racionais deveras limitados tem por hábito antropomorfizar esse elemento inteligente. Dando-lhe características humanas, sentimentos humanos, como raiva, tristeza, alegria, preferências etc.
Com todo o respeito às diversas cosmogonias ( lendas e teorias sobre as origens do universo) prefiro aquelas que partem de deduções racionais como as que estamos fazendo neste ensaio em detrimento à outras que defendem idéias um tanto quanto dissociadas da realidade e que se embasam somente na revelação ou tradição.
Posta a questão temporal, a questão espacial/material também apresenta questões de fundo profundamente enigmáticas.
Qual a natureza da matéria? O que mantém os átomos ligados? O que os liga de determinada forma? Haveria uma realidade física sutil no universo físico que conhecemos que não pode ser captada por nossos instrumentos?
As respostas progridem na medida em que a capacidade humana de compreender progride também.
Não censuro aqueles que buscam suas respostas na simplicidade de uma explicação teológica qualquer ou em um agnosticismo radical, pois admitimos que indagações filosóficas e científicas profundas exigem um certo preparo e nem todos o possuem.
Relacionar-se de forma coerente e racional com o universo que nos cerca é um dever imposto a mentes saudáveis em busca do conhecimento.
Pode ser que não encontremos, ainda, as respostas mas, de imediato, o que podemos fazer é, ao menos, compreender as perguntas.