UMA REVIRAVOLTA NA IGREJA BRASILEIRA AQUI E AGORA!
A história do povo de Deus hoje não é diferente daquela vivida no Antigo Testamento. Em dois mil anos de história (de Jesus aos dias atuais), a igreja tem cometido muitos desacertos. Nos dois mil anos anteriores (de Abraão a Jesus), Israel também cometeu outros muitos erros.
Os escândalos do povo eleito estão registrados no Antigo Testamento e os da igreja, no Novo Testamento e nos compêndios da história eclesiástica.
O ser humano é o mesmo desde a queda, quando afundou na rebelião, tanto nos dois milênios antes de Cristo como nos dois milênios depois de Cristo. Deus também é o mesmo, ontem e hoje. Ele é continuamente misericordioso, “as suas misericórdias são inesgotáveis” e “renovam-se cada manhã” (Lm 3.22-23). Por isso, os crentes da Antiga e da Nova Aliança não são consumidos. Porque Deus é Deus, ele “leva adiante seus propósitos em meio à perversidade dos homens”. A história mostra que “a maldade humana e a providência divina não são incompatíveis” (John Stott).
Alguém precisa escrever um livro contando a história das reviravoltas positivas na história do povo de Deus. Uma reviravolta após outra, numa sucessão imprevisível, depois de longos ou pequenos intervalos, é o que tem mantido a igreja viva. A reviravolta acontece de surpresa, muitas vezes quando o declínio chega ao ápice ou quando a escuridão atinge seu ponto mais alto.
Na maioria das vezes, a reviravolta começa de baixo para cima e não o contrário. Via de regra, não são os sábios, os poderosos e os nobres, segundo os padrões humanos, os primeiros a desejar e a participar da renovação espiritual da igreja, fato observado e registrado por Paulo (1Co 1.18-31).
A reviravolta que marca uma mudança para melhor não é outra coisa senão a repetição de uma reviravolta anterior, com menor ou maior intensidade. Trata-se da recuperação da rota perdida, do entusiasmo perdido, da santidade perdida e da consagração perdida. É a feliz volta ao primeiro amor (Ap 2.4). Daí a famosa oração de Habacuque: “Nesta hora em que precisamos tanto de ajuda, ajude-nos novamente como fez no passado!” (Hc 3.2, BV).
O pior período da história de Israel foi aquele que precedeu e causou a queda de Jerusalém, por ocasião da invasão babilônica, no ano 586 antes de Cristo. O povo cometia verdadeiros desatinos e recusava-se terminantemente a ouvir Jeremias (Jr 25.3). Entretanto, o profeta mistura o juízo que cairia sobre eles com o anúncio da reviravolta que sucederia o juízo. A diferença entre uma situação e outra é enorme.
Graças à reviravolta a ser experimentada por Israel depois do cativeiro babilônico, “o povo de Israel [o reino do Norte] e o povo de Judá [o reino do Sul] virão juntos, chorando e buscando o Senhor, o seu Deus. Virão e se apegarão ao Senhor numa aliança permanente que não será esquecida” (Jr 50.4-5). A bênção mais marcante dessa reviravolta não foi o retorno dos exilados nem a reconstrução da cidade e do templo de Jerusalém, setenta anos depois do exílio, mas a dissolução do pecado e da culpa. Quando esse dia chegou, mesmo procurando, ninguém achava iniqüidade em Israel nem pecados em Judá, pois Deus havia passado uma esponja em todo o remanescente (Jr 50.20).
Por sua vez, o pior período da história da igreja foi quando “nada era mais corrupto, pestilento e odioso do que a cúria romana”.1 Os que enxergavam a prolongada crise, cuja duração excedia trezentos anos, e esboçavam alguma reação eram excomungados, destituídos de suas funções, denunciados como “filhos da escuridão” e lançados nas fogueiras da inquisição, como aconteceu com João Huss (em 1415) e com Jerônimo Savonarola (em 1489). Porém, Deus não permitiu que a igreja naufragasse por completo e levantou homens na Europa Central e nas Ilhas Britânicas, que ele usou para provocar a maior, mais ampla e mais duradoura de todas as reviravoltas registradas na história eclesiástica, conhecida como Reforma Protestante do Século 16.
Resta perguntar se a igreja evangélica brasileira, embora crescendo em número, estaria precisando de uma reviravolta, para corrigir alguns rumos, algumas distorções, alguns escândalos e algumas omissões (Veja Confissões).
Nota
1. “Carta de Lutero a Leão X, sumo pontífice”, escrita em 1520 (“Martinho Lutero, Obras Selecionadas”, vol. 2, p. 429).