AMOR DA MÃE!

NOSSA SENHORA DE FÁTIMA E EU – EM QUATRO TEMPOS

(Vicente de Paulo Clemente)

I – 1953

Mamãe havia fritado batatas e colocado em um prato que deixou à beira do fogão de serragem, para mantê-lo aquecido. Minha irmã, Maria das Graças, com quase quatro anos, como toda criança sadia e curiosa, se aproximou, na ponta dos pés, esticando-se para pegar uma. Seu vestidinho de organza, com o movimento que ela fez, foi pego por uma labareda que escapou pela boca do fogão. O fogo se alastrou rapidamente e ela gritando saiu correndo pelo quintal, em chamas, onde eu brincava com um amiguinho e irmãos. Foi um “Deus nos acuda”. Mamãe estava no quarto atendendo as necessidades de Ana Maria, minha irmã mais nova, de onze meses e demoraria a chegar. Paulinho, nosso amigo, mais velho que nós, pegou uma toalha de banho, que estava à mão e jogou por cima dela e nós juntos, batendo nossas mãozinhas, conseguimos debelar as chamas; mas ele já estava toda queimada, braços, tronco, pescoço, pernas...

Levada à Santa Casa, lá ficou internada com queimaduras de todos os graus, desidratada e com sério risco de morte. Era o mês de maio e a imagem peregrina de Nossa Senhora de Fátima estava visitando nossa cidade. Um religioso a levou até ao hospital, e quando passava pelo corredor, a maca saia do quarto levando minha irmãzinha para a cirurgia, que estava muito mal. Mamãe rezou fervorosamente ao pé da imagem, pedindo saúde e reabilitação da menina. A partir daquele momento e dos dias seguintes, a melhora foi surpreendente e ela, vinte dias depois teve alta e continuou sua recuperação em casa e todos nós orávamos por ela, à Nossa Senhora de Fátima. As chamas deixaram marcas pelo seu corpo todo, mas ela se recuperou e está saudável até hoje.

Demos Graças a Deus!

II - 1987

Após uma grande decepção profissional, quando me vi sem trabalho, esposa e duas filhas pra criar, em 1985, dois anos antes, estava me firmando, trabalhando por conta própria, mas, não sabia: Havia criado uma doença grave em meu rim esquerdo. Há tempos, sentia dores locais, mas, como cálculos renais eram uma constante, não me preocupava tanto. Injeções de buscopam e baralgim resolviam as dores que me atingiam em ondas, mas, passavam. Um exame de rotina, detectara um tumor, que deveria ser extirpado imediatamente. Em 12 de maio estava internado no Hospital Bom Pastor de Juiz de Fora para a cirurgia de nefrectomia. Sem planos de saúde, o SUS ou o INPS de então, foi a única solução. Nem conhecia o médico, antes da cirurgia. Fui encaminhado pelo urologista, Dr. José Licério, que me atendera no INPS.

Um fato a registrar. Estava fazendo um Curso de Bíblia, no Seminário Santo Antônio, à noite e na véspera, antes do início da aula, pedi aos colegas e ao instrutor, orações para o bom andamento da cirurgia. Quando falei isso, uma colega de curso, que mal conhecia, perguntou se eu sabia o nome do médico que me operaria. Respondi que não o conhecia, mas seu nome era Hélio. Ouvindo isso, ele sorrindo disse para todos nós, que seu marido era médico cirurgião, se chamava Hélio e lhe havia dito que operaria no dia seguinte, um homem com um tumor no rim. Aquilo seria um sinal divino?

A cirurgia retirou-me o rim esquerdo, uma costela flutuante, ureter e limpou toda a área adjacente. Três dias depois, estava de pé. Dr. Hélio, passando a visita, mandou-me levantar e ir tomar banho e começar a movimentar. Eufórico, arrastando o suporte do soro que estava ainda em minha veia, fui até ao banheiro, onde tomei um banho refrescante e morno. Ao retornar, pelo corredor, tendo como acompanhantes dois colegas que também haviam tomado banho, um com cirurgia recente, de apêndice e outro de artérias e veias, tive uma queda de pressão, vi tudo girando, escurecendo e fui ao chão. Meus dois guarda costas, bem que tentaram me apoiar, mas, também foram ao chão, causando grande estardalhaço. Acordei em meu leito, com diversos rostos preocupados, sobre mim, conferindo pressão arterial... Soube depois, que minha pressão havia caído para 5x3 e quase fui ver Nossa Senhora pessoalmente.

Realmente, confirmou-se o que Dr. Hélio me havia prometido. “Em três dias você estará em casa”, mas, não me disse que a recuperação seria longa e somente após 90 dias pude aprumar o corpo.

O tumor, enviado para exames, confirmou ser “carcinoma” de 5 cm e de cor alaranjada. A proteção de Nossa Senhora de Fátima se estendeu além do internamento no hospital e ao ser encaminhado ao Instituto Oncológico para tratamento de radiologia e quimioterapia, tive a “sorte” de ser atendido por um médico radiologista, Dr. Rui, que fora meu colega de ginásio (Escola Normal). Pegando minha ficha, telefonou para o colega cirurgião, Dr. Hélio e ficaram conversando por um longo tempo. Sorriso estampado no rosto, me assegurou que não faríamos nem radio e nem quimio, pois que “o mal fora tirado com a raiz” e teria que fazer exames periódicos durante cinco anos.

Já se passaram 26 anos... Dia 12 de maio de 2013 - “Demos Graças a Deus”!

III – 2007

Ano da Graça de Nosso Senhor Jesus Cristo. Estava realizando um sonho. Visitar Portugal, terra de meu avô Materno. Após passar por Lisboa e arredores, chegara à cidade de Fátima, onde Nossa Senhora aparecera a três crianças, em 1917. Era o dia 12 de maio de 2007. Após visitar a Basílica, onde o corpo dos três Pastorinhos estavam enterrados, (Lúcia fora a última, após longa vida) Jacinta e Francisco, morreram jovenzinhos, onde me emocionei muito.

Ajoelhado, comecei a orar a AVE MARIA e um choro misterioso me tomou todo o corpo. A cada sílaba, soluçava e lágrimas me rolaram dos olhos. Nunca havia acontecido algo semelhante comigo. Minha esposa ao meu lado rezava junto comigo e eu nem me importava com a vizinhança. Ao final da primeira Ave Maria, meu rosto banhado em lágrimas, dava a impressão que tomara um banho. Aos poucos foi se “amainando a tempestade” e uma calmaria chegou até o mais íntimo de meu ser e continuei a orar por todos que me pediram orações. Lavado e enxaguado, saí, com minha esposa, para a área fronteiriça, onde pude visitar a Capelinha construída no local onde Nossa Senhora aparecera naquele longínquo 13 de maio de 1917. Uma “azinheira” (árvore de pequeno porte) ainda está lá, ao lado da Capela, para todos os romeiros conferirem. Uma grande Praça, com uma fonte edificada ao centro dela, estava apinhada de pessoas de todas as nacionalidades. Ao fundo, uma nova Igreja, dedicada à Santíssima Trindade foi edificada, com capacidade para cerca de 5 mil pessoas, para atender aos romeiros que antes sofriam com frio, sol e chuva, quando das grandes celebrações no local.

Descemos a escadaria e nos dirigimos até à fonte (essa fonte de água apareceu quando derrubaram a floresta de carvalhos, que havia no local). Eram cinco jatos que corriam sem parar e as pessoas faziam filas para encher garrafinhas ou beberem com as mãos. Procurei uma bica, sem “bicha” grande (bicha=fila) e ao aproximar minha vez, tive um vislumbre. Há dias, me atormentava uma dor localizada na lateral do calcanhar esquerdo, que analgésico nenhum dava jeito. Pensei: vou rezar e pedir a cura dessa dor. Chegou minha vez e o que fiz? Tirei o calçado e a meia e meti meu pé esquerdo inteirinho sob o jato d'água, deixando a água banhar todo o calcanhar e a área dolorida. Todos me olharam de lado, estranhando minha atitude, mas eu continuei meu ritual, como que nada daquilo fosse comigo. Calcei a meia e o sapato, molhado assim mesmo e segui em frente, feliz da vida. A dor, continuou a mesma. Prossegui a visita, fotografando e conferindo os peregrinos que se aproximavam. Um grupo deles, identifiquei logo, eram franceses, com pessoas rezando a Ave Maria. Nos dirigimos até à nova Igreja da SS Trindade, ao fundo da praça. Estava fechada, pois que seria inaugurada somente no dia seguinte. Pelas frestas do tapume pudemos conferir as largas rampas de acesso e as portas enormes.

Dia seguinte, 13/05/2007 já estávamos na cidade do Porto, norte de Portugal e à noite, cansados da jornada de passeios, ligamos a televisão e vimos a reportagem da inauguração da dita Igreja. Uma festa e tanto, lotação total e a história da derrubada dos carvalhos para adquirir espaços novos para a Praça e Igreja. As madeiras das árvores dos carvalhos, foram trabalhadas e usadas na confecção de miniaturas da nova Igreja, que inseridas em ricos estojos adornados seriam comercializados para cobrir os gastos com as obras. O primeiro estojo foi enviado à Roma, endereçado à SS o Papa João Paulo II.

Mais uns dias de belas paisagens e relatos da história do Brasil, cujas origens fomos buscar em Portugal, estávamos retornando. Arrumando as malas, no Hotel Corinthia, em Lisboa, lembrei-me da dor no calcanhar e do banho na fonte de Fátima. Não doía mais, não tomei mais dorflex e nem me lembro de quando cessou a a dor. “Demos Graças a DEUS”!

IV – 2011

06 de agosto de 2011, um sábado. Estava varrendo ao redor de minha casa, quando parei e comecei a massagear meu braço esquerdo. Uma dorzinha muscular estava renitente, mas não me preocupava com ela. Já a sentira antes e uma massagem com um comprimido dava jeito nela. Mas a dor subiu para o antebraço, para onde nunca fora e me assustei. Falei com minha esposa e telefonei para meu genro que desejaria ir até à Santa Casa consultar. De imediato ele me respondeu que era somente calçar um tênis e estaria à minha porta. Foi tudo muito rápido e em poucos minutos estava sentado na sala de espera do hospital, enquanto ele fazia minha ficha. Uma enfermeira me chamou e conferiu minha pressão arterial. Eu estava bastante assustado, quando ela me passou para o cardiologista de plantão, que me levou para uma maca, conferiu minha pressão, fez um eletrocardiograma e em seguinte mandou tirar sangue para exame. Enquanto me fisgavam a veia do braço, veio o médico, mandou-me abrir a mão, colocando ali quatro comprimidos e mandando engolir dando-me um copo de água. Acabara de engolir, quando me deram mais três comprimidos mandando mastigar. Assim o fiz. Estava ainda engolindo quando veio por cima de minha cabeça um aparelho de ar, com dois tubinhos, que enfiaram em minha narina. Falei que retirassem aquilo, visto não estar com falta de ar. Em vão, minha lamentação, disseram que era assim mesmo, o procedimento estava correto. Permaneci ali naquela maca, das 13 até as 18:30 hs., e minha esposa já chegara e fazia companhia ao genro, quando o médico chegou e falou que tudo estava alterado, a pressão, o eletro e o exame de sangue. Então, eu teria que ficar internado para tratamento e maiores exames.

Do dia 06 até o dia 18 fiquei internado para acompanhamento médico, quando um cateterismo constatou o entupimento de 4 artérias. O médico, Dr. Fred marcou a cirurgia cardíaca para a manhã do dia 18/08/2011, com duas pontes de safena e uma ponte mamária.

Na manhã desse dia, como estava no 11º andar da Santa Casa, fui até a uma Capelinha, no mesmo andar, onde no altar se destacava uma bela imagem de Nossa Senhora de Fátima, de mãos postas. Me coloquei bem pertinho dela e olhando para cima lhe disse: - “Nossa Senhora, eu estou aqui e muito assustado com a operação que vão fazer em mim. Me proteja, olhe por mim e guie as mãos do médico” e em seguida, saquei do bolso um tercinho azul, que meu amigo João, me trouxera dias atrás e dependurei nas mãos postas da imagem. Ficou ali dependurado o tercinho azul e eu voltei bem aliviado para o quarto. A maca do transporte já estava lá me aguardando. Despedi de todos, embarquei nela e fui levado até a sala de cirurgia.

Tudo correu tranquilo e depois de quatro dias de UTI voltei para o quarto, permanecendo lá, até 30/08/2012, quando me deram alta, voltando à Capelinha todos os dias para agradecer, até a alta.

Já em casa, decorridos mais de quinze dias, telefonei para meu amigo João, da Pastoral da Visitação e lhe pedi para ir até à Capelinha do 11º andar e conferir se meu tercinho azul ainda estava lá. Qual não foi minha surpresa, quando ele me confirmou: - “Caro Vicente, não só seu tercinho estava lá, mas também uns oito tercinhos lhe faziam companhia”. Fiquei estarrecido e agradecido.

Demos Graças a DEUS!