O ORGULHO RELIGIOSO é o que nos representa

Lá vou eu tatear por um terreno minado... Mas quem disse que tenho medo de expressar minha opinião? E embora entenda que em futebol, política e religião não caiba discussão, fica impossível ignorar o tema diante das “Felicianidades” e “Malafaiades” do contexto atual.

Bom, eu detesto futebol. Detesto é uma palavra forte. Digamos que eu não compreenda toda essa “paixão” por um time, cujos próprios jogadores não têm pelo clube que defendem a mesma fidelidade demonstrada pelo torcedor. Afinal, trocam, vendem, valorizam, internacionalizam e superfaturam seus passes sem qualquer constrangimento. Estão hoje aqui, amanhã estão ali. E os torcedores, lá, defendendo a “entidade”, já que o corpo atlético dificilmente perdura unido por mais do que uma temporada.

A partir desse pensamento concluí que os torcedores torcem pelo prazer PESSOAL de torcer. De ESCOLHER um time e dizer: esse é o meu! E enaltece-lo, divulgá-lo, propagar suas qualidades, amenizar suas falhas e, é claro, troçar do adversário quando este perde. Sim, pois que graça tem a vida se a gente não puder alimentar o nosso orgulho nos momentos de maré alta?

Presumo que daí possa transportar o conceito para o chamado “orgulho religioso”.

A maioria de nós, da atual geração, simplesmente NASCEU católico. Não foi propriamente uma opção. Num país com maioria católica, é praticamente uma condição “congênita”, algo de certa forma “naturalizado” e que não era objeto de discussão. A resposta pronta para o questionário do CENSO, ainda que o sujeito tenha ido à missa uma vez na vida.

Em tempos de “liberdade religiosa”, nos foi permitido, à medida que crescemos e nos tornamos mais autônomos, ESCOLHER um caminho para nos conectarmos a Deus. Isso gerou fenômenos de lares, famílias e comunidades “ecumênicas”, com católicos, evangélicos, espíritas, adventistas, convivendo de forma “possível”, se assim podemos dizer, embora os casos de preconceito e repressão religiosa sejam comuns, sobretudo dentro de casa.

Eu também passei pela fase “congênita” e, depois, pela experiência adquirida. Até a pré-adolescência era a menina católica que ia à missa de vez em quando com a desculpa de poder passear na pracinha logo depois. Primeiro a obrigação, depois a diversão! Era mais fácil convencer os pais, assim.

Mas nunca me senti “conectada”, confortável ou satisfeita com a liturgia apostólica-romana. Faltava alguma coisa! E entre leituras e experiências, escolhi o Espiritismo.

Lógico que essa escolha gerou inconvenientes. Não na minha relação comigo mesma, já que a Doutrina respondeu muitas questões e sanou inquietações particulares. Mas declarar-se Espírita, especialmente há cerca de 20 anos atrás, era estar sujeita à reprovação e à discriminação de pessoas que se apegavam a conceitos um tanto deturpados. Hoje, felizmente, não é algo tão traumático, já que há uma aceitação bem maior do Espiritismo em nosso país. O que alguns filósofos do Apocalipse classificam como mais um indício da dominação satânica na Terra, embora o próprio Cristo tenha afirmado que uma boa árvore seria reconhecida por seus bons frutos, e tudo que tenha visto e ouvido na Doutrina Espírita seja, em suma, a pregação sobre a necessidade da reforma íntima do ser humano. Um processo “particular e intransferível” no sentido de combater os próprios defeitos, estimular a tolerância, exercitar as virtudes e aprender a amar, perdoar e respeitar incondicionalmente os seus irmãos, todos filhos do mesmo Deus. Um discurso que parece sair da boca do próprio Lúcifer, não é mesmo? Me dá até arrepios toda essa maldade!

Mas, enfim, não é a minha religião que está em questão. Mas a “escolha” de cada um de nós. Mais precisamente, a forma com que VIVEMOS essa escolha.

Tenho amigos que são ateus. E conheço muitos outros. Claro que cada qual tem seu motivo, mas no geral, a maioria ESCOLHEU não crer em Deus porque não consegue acreditar no “deus” irascível, vingativo, cruel e castigador que nos foi empurrado goela abaixo durante séculos! Sua racionalidade não permitia crer em uma entidade suprema que nos criou e pôs num mundo cheio de defeitos para aprender na base do castigo e do chicote! Talvez colocados diante de outro “modelo” de divindade, esses ateus não teriam uma visão tão traumática sobre o Senhor.

Assim ocorre com a religião. Todo mundo conhece alguém, um amigo, um conhecido ou um familiar com uma péssima opinião sobre uma doutrina A ou B. São pessoas geralmente traumatizadas por alguma (ou várias) experiência de vida envolvendo a forma EQUIVOCADA de algumas pessoas VIVEREM a sua escolha.

Em tese, a religião deveria nos tornar pessoas melhores. Deveria nos ensinar a viver em coletividade. Deveria nos conferir princípios mais éticos, mais justos, mais HUMANOS. E a verdade é que a grande maioria ensina isso, sim! Nem dentre as crenças onde enxergamos um maior “fanatismo”, pode-se ler em seus códigos e escritos, conselhos que incitem diretamente ao ódio e à maldade. O que ocorre é um desvirtuamento de princípios feitos pelas PESSOAS. E não por ordem ou indicação divina!

Pessoas que desvirtuam todo o processo doutrinário: leem errado, entendem errado, divulgam errado e vivem a crença do modo errado. E o “erro” está no Ser, em sua forma PARTICULAR de exercitar a sua preferência. Que na desculpa de advogar em nome do Todo-Poderoso (quanta pretensão!) se acham no direito de empreender Cruzadas nos tempos modernos, enaltecendo e pregando suas qualidades, amenizando suas falhas e, é claro, troçando do “adversário”, ou seja, daquele que não compartilha de sua convicção. Tal qual com o futebol! Releia o 3º parágrafo desse texto, pra confirmar!

O prejuízo que essas pessoas trazem para as suas religiões, e para qualquer ato coletivo de adoração em geral, é tremendo! Porque ao contrário do que uma minoria defende, a religião em si não deveria ser algo ruim. Não deveria ser o ópio do povo. Quem fez isso foram alguns líderes e adeptos religiosos em sua forma corrupta de transformar uma coisa boa, num veneno que corrói os laços entre os seres humanos, afastando A TODOS, algozes e vítimas, dos verdadeiros preceitos cristãos que sempre pregaram o amor e a tolerância entre todas as pessoas.

É como times que depois de uma partida, que deveria ser um evento desportivo sadio, enfrentam-se numa arena de gladiadores, se matando a troco de nada, já que nem os próprios jogadores tem todo esse “apego” pelo clube. Algumas pessoas defendem que o problema é a competição. Mas a vida É um PERDE E GANHA, e deveríamos NA PRÁTICA (e não da boca pra fora) aprender que isso faz parte! Conviver com isso de forma madura e equilibrada! Eliminar esse aspecto da vida social seria o mesmo que admitir que não passamos de homens e mulheres das cavernas, isolados em suas tocas, impossível de conviver com as diferenças. É assumir que só poderíamos partilhar a vida com clones, idênticos físico e espiritualmente, para evitar que a centelha do ódio se inflamasse. E será que Deus, em sua sabedoria, criou etnias, línguas, povos, civilizações tão diferentes umas das outras a troco de nada? Não teria isso algum propósito?

Eu vivi num lar “ecumênico” e hoje, vivo um casamento religiosamente discordante. Não é fácil. Existem rusgas diárias. Mas essas rusgas existiriam AINDA QUE FREQUENTASSEMOS O MESMO TEMPLO, ainda que por outros motivos. Porque rusgas e discordâncias fazem parte da nossa natureza, que ainda precisa comer muita saca de sal para aprender a lidar com as diferenças.

Portanto, meus amigos, para quê permitirmos que a religião nos afaste ainda mais? Será que só posso ser amiga de um confrade Espírita? Será que as pessoas, no universo que elas são, não teriam nada mais a oferecer além de tópicos religiosos? Quantas experiências, quantas histórias, quantas coisas interessantes deixaria de partilhar se me limitasse a um círculo doutrinário? Que coisa mais absurda e sem sentido! Já parou pra pensar na possibilidade do próprio Senhor vir a Terra e “eleger” como “certa” uma religião que não é a sua? Ou ainda, que NENHUMA delas está com a razão? Que decepção, que desperdício não teria sido a vida daqueles que dedicaram sua existência para evidenciar seu ORGULHO RELIGIOSO e perseguir companheiros adeptos de outras crenças? Quem te garante a certeza de que VOCÊ está certo? Sim, porque como diria Dr. House, se alguém conversa com Deus, esse alguém é religioso; mas se Deus conversa com ele, então, o sujeito é paranoico. Deus não anda dando audiência particular nem repassando informação privilegiada pra ninguém. Então, tá na hora de baixar a bola e aceitar a condição humana do eterno aprendizado, marcado SEMPRE pelo processo de TENTATIVA-ERRO-ACERTO. É assim que crescemos, é assim que amadurecemos. E é quando admitirmos essa condição falível e ainda carente de AUTOCONHECIMENTO, que, enfim, será possível convivermos com todas as nossas diferenças. Jamais seremos iguais, mas um dia finalmente aprenderemos que essa é a MARAVILHA da vida!

Feminista de Arake
Enviado por Feminista de Arake em 25/04/2013
Reeditado em 26/04/2013
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