Uma arquidiocese desmerecida
Uma arquidiocese desmerecida.
(publicado em O Globo em dezembro de 2012)
Está causando muita estranheza e desconforto crescente ao fieis da Igreja Católica, àqueles que se interessam pelo que se passa na sua Igreja, a não nomeação, como Cardeal, na ultima relação de nomes apresentada pela santa Sé, (dia 25 de outubro de 2012), do Arcebispo da Arquidiocese do Rio de Janeiro. O tempo passa e nada acontece.
Certamente é uma indiscutível prerrogativa do Santo Padre escolher e nomear quem quiser. Pela terceira vez o Vaticano, nas listas propostas, não se lembra do Rio de Janeiro. É pelo menos estranho, muito estranho.
A Arquidiocese da cidade do Rio de Janeiro tem, tradicionalmente, um cardeal à sua frente. Foi a primeira sede cardinalícia das Américas e agora, há mais de dois anos está à espera que Roma se lembre deste fato.
O Pontífice Romano tem muito que fazer e se preocupar, mas seus inúmeros assessores existem para lembrá-lo, principalmente do óbvio, indicando alternativas para as suas decisões. O mesmo deveria fazer a Nunciatura. Parece que todo esse aparato está de braços cruzados ou se dedicando a uma política dúbia de afastar os não desejados, esquecerem os que não fazem parte do grupo que, nos bastidores, comanda a vida administrativa e política da Igreja. Ou, então, há uma intenção de sinalizar uma censura à Arquidiocese toda, seus Bispos auxiliares, clero, religiosas e religiosos e os fieis, ou se está pretendendo deixar de lado, deliberadamente, um prelado de alta estirpe pastoral e intelectual.
Foi assim com Dom Helder Câmara e com Dom Luciano Mendes de Almeida, ambos lideres religiosos e santos, reconhecidos internacionalmente, que nunca foram lembrados pela Cúria Romana para se tornarem, merecidamente, Príncipes da Igreja, auxiliares diretos do Papa como Cardeais. Talvez incomodassem demais com suas palavras e seus testemunhos de religiosidade evangélica, a mais pura e adequada para o Brasil e o 3º mundo. Outro admirável Bispo, o gaúcho Dom Ivo Lorscheiter, nem a Arcebispo chegou e foi Presidente da CNBB.
Há muitos anos vários comentários são feitos, por autores leigos e religiosos, sobre o poder que detêm e as maquinações a que se dedicam os Monsenhores que cuidam da burocracia do Vaticano. São eles que cometem injustiças, irritam o Povo de Deus e fazem o que querem, com qualquer Papa, em termos administrativos, pois criaram, ao longo de décadas, uma poderosa e quase impenetrável burocracia. Desde o Concílio Vaticano II que o Povo de Deus procura encontrar uma fórmula de diminuir suas influências e estruturar uma Cúria realmente plural, representativa das Igrejas Particulares espalhadas pelo planeta, com pessoas competentes, piedosas e intelectualmente competentes.
É de se perguntar, depois do que estão fazendo com a Arquidiocese do Rio de Janeiro, se existe alguma tradicional sede cardinalícia da Polônia, da Alemanha, da Itália, da Europa, que esteja vaga – será que essas Igrejas particulares são mais importantes que as nossas?
Por não serem tradicionais e históricas sedes cardinalícias, apesar de já o terem sido até recentemente, também lembro o tratamento discriminatório que estão dando à Brasília, à Porto Alegre, à Belo Horizonte e à Fortaleza. Não é só o aspecto do prestigio que incomoda, trata-se, principalmente, das movimentações iniciais para a eleição do próximo Pontífice, onde o Espírito Santo, valendo-se da experiência e da espiritualidade dos cardeais eleitores, elegerá um novo Papa.
É importante que nós leigos saiamos desta atitude passiva de só aceitar o que vem de Roma, em termos de administração da nossa Igreja, e comecemos a protestar – queremos ser ouvidos, como nos primórdios da história da Igreja, para que absurdos como este, que está acontecendo na Arquidiocese do Rio de Janeiro e na administração do Vaticano não mais se repitam.
Eurico de Andrade Neves Borba, 72, aposentado, escritor, ex professor, Diretor de Departamento e Vice Reitor da PUC RIO, ex Presidente do IBGE, ex Diretor Geral da Escola de Administração Fazendária, ex Secretario Geral Adjunto do MEC, ex Secretario Executivo da Associação de Mantenedores da Escolas Católicas do Brasil, mora em Ana Rech, Caxias do Sul, RS.