LIÇÕES DE UMA RENÚNCIA
A mídia enveredou pela interpretação de que a renúncia de Bento XVI foi surpreendente e inesperada, provocando perplexidade entre os cristãos católicos. Isto se deve ao fato de, nos últimos séculos, se ter criado ao redor do papa uma auréola de divindade. O papa como representante de Cristo na terra, o papa como infalível em questões morais e teológicas, o papa como mito, o papa um santo na terra...
Esta imagem falsificada do papa evitava falar das fraquezas humanas do papa como ser humano. Poucos sabiam que Bento XVI sofrera um acidente vascular, que possuía um marca passo, que no México tivera uma queda e machucara a cabeça, que seu humor psicológico podia se alterar com as intrigas no Vaticano. Há pessoas que até se escandalizam quando se menciona que o papa também continua submetido ao ritmo das necessidades fisiológicas.
Frente à sua renúncia, o que Bento XVI nos ensina? Bento XVI nunca deixou de ser o Prof. Dr. Joseph Ratzinger, catedrático de Teologia em Universidade alemã. E quem tem este status de docente em universidade da Alemanha, sem dúvida, é uma pessoa inteligente. Neste sentido, os livros publicados por Ratzinger comprovam a sua sabedoria. Com sua renúncia ao papado, Ratzinger simplesmente nos ensina: “continuo um ser humano; continuo submetido a todas as fragilidades dos seres humanos; não tenho mais forças para dar conta da administração de um Estado Político e Religioso, que é o Vaticano, com muitos hipócritas ao meu redor, oprimindo pessoas realmente buscando imitar a Jesus Cristo.”
A renúncia de Bento XVI foi um gesto de humildade e sabedoria racional e espiritual, de quem está consciente de que a Igreja de Cristo existiu antes dele, e continuará a existir depois dele. Portanto, um gesto natural já tomado por outros papas na história. Claro, os motivos das renúncias papais na história foram diferentes. Mas todas elas nos ensinam que os papas continuam seres plenamente humanos. E quando reconhecem, por renúncia, esta sua condição, devem ser louvados e admirados.
Segundo consta na história, foram os seguintes os Papas que renunciaram a seu cargo no decorrer dois 2000 anos de cristianismo: Ponciano, em 235; Silvério, em 537; João XVIII, em 1009; Bento IX, em 1045 (este Papa foi reempossado dois anos depois); Celestino V, em 1234; Gregório XII, em 1415; Bento XVI, em 2013.
Inácio Strieder é professor de filosofia- Recife- PE