O CANDOMBLÉ CRISTÃO
INTRODUÇÃO
UMA MAGIA?
Hoje acordei com vontade de fazer uma magia mista, metade cristã, metade africana, quem sabe assim conseguiria unificar duas das principais religiões do Brasil: o Candomblé e o Cristianismo. Acendi três velas brancas, juntei dois santinhos evangélicos com uma pintura de Jesus, prendi ao chão sob duas pedras negras, e fiz uma oração de branco e outra de preto: pedi o fim do religioso preconceito! Depois gritei ao ar: SARAVÁ! Despachei para Jesus e ofereci a Oxalá... Aguardo Deus me ajudar!
Imagine se este parágrafo acima fosse realmente uma magia para unificar o Candomblé e o Cristianismo, duas religiões tidas como completamente diferentes, seria perfeito, não seria? Mas infelizmente ainda não descobri nenhuma fórmula do astral superior para unir as duas crenças acima, mas penso que não são necessárias atitudes mágicas, pois existe um grande engano em torno dessa tal estória de que o Candomblé e o Cristianismo são totalmente diferentes, na verdade estas duas religiões são praticamente irmãs gêmeas, nascidas do ventre da mesma espiritualidade, em épocas e contextos diferentes, é verdade, mas contendo semelhanças inegáveis. Embora isto soe como uma “blasfêmia” para os cristãos mais fanáticos ficará claro o que afirmo nesta hora nos tons de minha uma vanguarda mágica. E digo mais, mesmo havendo algumas pequenas diferenças ritualísticas entre estas relegiões, houve, por certo, uma troca cultural entre as duas, uma relação de influência, por mais difícil que seja estabelecer como que esse processo se deu e qual religião influciou a outra. Por ordem de antiguidade, poderíamos afirmar que o Candomblé influenciou o Cristianismo, por ser bem anterior a este.
DAS DEFINIÇÕES
O Cristianismo é crença em Jesus, considerado o Cristo, o filho de Deus, que viveu há cerca de dois mil anos atrás. Afirmam Joisten Garder, Henry Notaker e Victor Hellern no Livro das Religiões que “o cristianismo é a filosofia que mais fortemente caracteriza a sociedade ocidental.” O cristianismo influenciou a formação da sociedade moderna e estabeleceu parâmetros culturais para a construção do Brasil: na literatura, filosofia, artes, arquitetura, na política, etc.
De outro lado, o Candomblé é uma religião de raízes africanas, trazida para o Brasil pelos negros que foram transportados como escravos para o nosso país. João José Reis e Flávio dos Santos Gomes (1996) relatam que “a escravidão de africanos na América consumiu cerca de 15 milhões ou mais de homens e mulheres arrancados de suas terras”. O transporte de negros escravos para América era tida pelos colonizadores, dentre eles os portugueses, como um empreendimento comercial, porém, não podemos esquecer que foi também um empreendimento cultural, pois os negros escravos trouxeram consigo as suas crenças, costumes, hábitos e demais características de sua civilização, dentre elas a sua fé, demonstrada na Religião dos Orixás. Os aspectos culturais trazidos pelos negros africanos para o Brasil também marcou, tal qual o Cristianismo, a formação do Mundo Moderno e a arregimentação do Brasil. A cultura dos negros escravos influenciou fortemente o Pais: na religião, língua, música, artes, arquitetura, etc.
Mas aonde pretendo chegar com um artigo que possui o título de o Candomblé Cristão? Seria algum escárnio da minha parte? É óbvio que não. Embora ironize o preconceito existente entre as duas religiões (e isso faço bem mesmo), pois o preconceito é desnecessário, não tenho o objetivo de escarnecer de nenhuma religião, pois mantenho o respeito a todas as crenças, ainda mais como teólogo que sou. Porém, pretendo chegar a algum lugar com esta explanação sim! Pretendo chegar onde a alienação sociocultural não nos domine, num ponto seguro o suficiente que nos permita refletir por nós mesmos, sem a influência das ideias preconceituosas que nos venderam gratuitamente ao longo dos séculos com o intuito de nos tornar membros de uma sociedade que não pensa, de um grupo gigantesco de escravos mentais, é neste porto que pretendo chegar.
Portanto, vale logo esclarecer aos mais desavisados que não existe (pelo menos ainda) uma religião denominada o “Candomblé Cristão”, e que a junção destes dois termos é apenas uma instigação que julgo oportuna para provocar um choque reflexivo naqueles que se sentirem encorajados a ler todo o artigo, naqueles que vencerem os seus preconceitos religiosos que já devem estar borbulhando dentro de muitos neste instante. Antes de prosseguir, devo afirmar a importância sociocultural das duas religiões (O Candomblé e o Cristianismo) no contexto histórico do Brasil.
O BRASIL DE TODOS OS DEUSES?
No Carnaval de 2010, a escola de samba do Rio de Janeiro, Imperatriz Leopoldinense, apresentou o enredo “O Brasil de Todos os Deuses”, exaltando a boa convivência entre todas as Religiões no território brasileiro, porém, quando analisamos de maneira mais pormenorizada essa suposta convivência harmoniosa, vemos que é apenas uma impressão errônea: há sim uma convivência entre as religiões, mas esta não é harmoniosa, pois o preconceito religioso existe e é propagado. Por quem? Veremos adiante. A sociedade carrega consigo a impressão que existe uma hierarquia entre as religiões, um grau de importância onde algumas religiões seriam mais importantes que outras, mas essa impressão é explicada pela própria história do Brasil. Além desta hierarquia, a sociedade ainda carrega em seus conceitos um “status” de qualidade que dividiria as religiões em dois lados: o lado do “bem” (que seria o de Deus em sua luz) e o lado do “mal” (que seria o lado do Diabo em suas trevas).
Considerando o Candomblé e o Cristianismo, uma é posta do lado do mal, do diabo, das trevas, que no caso é o Candomblé, e a outra, é colocada do lado do bem, da luz, de Deus, que no caso é a religião cristã. Quanto a suposta hierarquia, a sociedade também parece considerar a crença cristã como sendo “superior” e “mais apropriada” para se professar, afinal, seria o “verdadeiro caminho”. Mas de onde vem essa ideia religiosa de que há dois lados que existem independentes de qualquer coisa:o lado do bem e o lado do mal? De onde vem essa ideia de importância hierárquica entre as religiões, sendo uma considerada mais importante que a outra? Vem da ignorância, da alienação de uma sociedade que se permitiu (e ainda se permite) ser escravizada no seu mais alto grau: o intelectual.
A ideia religiosa de bem e de mal no mundo ocidental e o tal status hierárquico religioso foi construído ao longo dos tempos. No Brasil, os responsáveis por essa construção foram os jesuítas católicos que desembarcaram no território brasileiro no século XVI com o intuito de “converter” e “salvar” os povos locais, os indígenas, para a sua “santa fé”, e isto a história registra! Mas antes de os jesuítas chegarem a terras brasileiras, o escrivão da armada de Cabral, o senhor Pero Vaz de Caminha, em sua famosa Carta, já havia escrito ao rei de Portugal, Dom João III, as seguintes palavras a respeito dos índios:
“parece-me gente de tal inocência que, se nós entendêssemos a sua fala e eles a nossa, seriam logo cristãos...”.
“E imprimir-se-á facilmente neles todo e qualquer cunho que lhes quiserem dar, uma vez que nosso Senhor [Deus] lhes deu bons corpos e bons rostos, como a homens bons [como se os índios não fossem homens bons]. E o fato de Ele [Deus] haver até aqui nos trazido, creio que não foi sem causa. E Portanto, Vossa Alteza, que tanto deseja acrescentar à santa fé católica, deve cuidar da salvação deles. E aprazerá Deus que com pouco trabalho seja assim! [...]”.
A ideia do Rei de Portugal quando do descobrimento do Brasil, e posteriormente dos Jesuítas enviados por ele, era povoar a terra descoberta para converter as almas dos “perdidos” habitantes locais à fé católica, e não a exploração e o enriquecimento rápido, como pensavam a maioria dos demais portugueses que desembarcaram nestas terras naquela época, tendo em vista que estes últimos faziam parte, dentro da sociedade portuguesa, do chamado Terceiro Estado, ou seja, não eram nobres. Portanto, queriam enriquecer rapidamente e retornar para Portugal com o devido prestigio que julgavam merecer, mas este não era (a princípio) o pensamento do rei de Dom João III e da igreja católica. Esta verdade é tão forte que, no início do povoamento do Brasil, houve confrontos entre os Jesuítas e estes colonizadores portugueses. Luiz Koshiba (2004), Mestre e Doutor em História pela USP, cita uma das falas de Dom João III (1521-1557): “a principal coisa que me moveu a mandar povoar as ditas terras do Brasil foi para [que a] gente dela se converter à nossa santa fé”.
Ainda de Acordo com Koshiba, o Jesuíta Manoel da Nóbrega, o primeiro a chegar às terras brasileiras, em carta ao Governador Tomé de Souza, escreveu que a intenção de Dom João III “Não foi povoar tanto por esperar da terra ouro nem prata que não a tem, nem tanto pelo interesse de povoar e fazer engenhos, nem por agasalhar os portugueses que lá em Portugal sobejam e não cabem, quanto por exaltação da fé católica e salvação das Almas”.
A ideia inicial da Coroa portuguesa, através dos jesuítas católicos, era propagar a religião cristã católica como “absoluta”, como a única religião “verdadeira” e eficaz para a “salvação das almas” dos supostos “índios desgarrados”. José de Anchieta e os demais jesuítas que desembarcaram no Brasil ao longo dos séculos da ocupação portuguesa, que inclusive se espalharam historicamente por diversas localidades do Brasil, tinham o intuito de subjugar de todas as formas (dentre estas formas a ideológica religiosa) os indígenas, e posteriormente os negros escravos trazidos da África, à sua “Santa Fé”, como dito acima. É óbvio que essa ideia foi usada posteriormente por muitos jesuítas para enriquecimento próprio (inclusive na Amazônia), porém essa é outra história.
A Igreja Católica Romana, através dos Jesuítas, conservava esse ideário religioso, tentando transmitir a crença cristã como sendo a “única” e “verdadeira” o suficiente (repito) para “salvar” as almas dos demais habitantes desta Terra. Este era o pensamento religioso da Metrópole quando os negros africanos desembarcaram em solo brasileiro aos milhares, como escravos. Negros estes que foram vendidos, trocados como mercadoria, como peças, como objetos sem valor. Foram explorados nos engenhos dos tais senhores brancos, viveram à míngua nas senzalas, e de início foram considerados sem alma, e por isso não despertaram rapidamente o interesse religioso dos Jesuítas, pois se o negro não tinha alma, não havia o que salvar naqueles “pobres coitados”, pensava a Igreja. Porém, os negros africanos não eram miseráveis de espírito como imaginava a Igreja Católica Romana; eles também tinham sua fé: a confiança no seu Deus e nos seus Orixás. Com o passar do tempo os jesuítas católicos também tentaram subjugar a fé do negro, e assim, tal qual o indígena que devia passar por um processo de conversão cristã e aculturamento de acordo com as regras do homem branco, o “miserável” negro também devia reconhecer o “poder sublime” da religião dos brancos. Não bastasse a escravidão física, tentaram escravizar também a alma do negro, o espírito religioso daquela nação que seria tão importante para firmar o Brasil em alicerces seguros. O negro foi proibido de praticar a fé de sua Terra, ao contrário seriam perseguidos e mortos – e muitos verdadeiramente perderam a vida por conta disso. É fato que a história registra num momento posterior que alguns senhores de engenhos passaram a permitir a expressão de fé dos negros em suas senzalas, mas isso era uma exceção que os brancos abriam devido ao desconhecimento, pois muitos daqueles senhores que permitiam as festas de negros não faziam ideia de que aquelas festas com seus batuques e danças eram, na verdade, a forma dos negros cultuarem aos seus Orixás. Outros permitiram, mais tarde, a expressão de fé dos negros, mas nos moldes católicos.
Reintero: a Igreja Católica Romana e as missões jesuítas tentaram de todas as formas subjugar os índios e negros a crença cristã. Os índios deviam esquecer suas tradições, fé e rituais próprios, considerados inapropriados para as suas vidas, e professar, agora, a fé do branco, que era pregada como a fé certa, da luz, do bem, de deus. Da mesma maneira, o negro africano não podia adorar seu Deus e clamar pelos seus orixás, mas deviam professar e seguir a fé do homem branco: vendida como sendo da luz, do bem, de deus. Toda fé restante passou a ser considerada inapropriada.
Foi nessa ótica que surgiu o Sincretismo Religioso que de um lado tinha a Igreja Católica Romana tentando explicar a religião dos negros africanos nos moldes do Cristianismo, associando o Deus Africano e seus Orixás a imagem do deus católico e a imagem dos santos católicos, de acordo com as semelhanças de características de suas vidas. Do outro lado, os negros africanos, ao verem que não haveria saída para a expressão de sua fé, pois podiam ser mortos fingiram aceitar a “equiparação” de fé que a Igreja Católica propunha, no caso, o Sincretismo, pois era a única maneira de cultuarem o seu Deus e seus Orixás. Porém, quando os negros se dobravam diante de uma imagem de um santo católico, na verdade, se concentravam no seu Orixá, na energia de fé que do seu Senhor emanava. Em resumo, o Sincretismo Religioso, do lado católico foi mais uma tentativa de roubar de um povo sofrido o direito à expressão e a vivência de sua fé, no caso, o Candomblé. Do lado dos negros africanos, o Sincretismo foi uma forma de escape, uma saída para tentar viver, de alguma forma, a sua crença, pois originalmente a sua religião era considerada como parte do mal, como expressão das trevas, como algo satânico.
Essa ideia de que a religião cristã é mais importante que as demais religiões, dentre elas as de raízes africanas, como no caso em tela o Candomblé, foi construída sobre o alicerce do medo, da ameaça e da agonia que sofreriam os que desse fato discordassem.
O CRISTIANISMO E O CANDOMBLÉ: A COIRMANDADE DA FÉ.
Como vimos acima, há um preconceito religioso construído ao longo dos tempos sobre o modo de ver religiões que não são cristãs, pois estas acabam sendo classificadas como sendo de “segunda linha”, religiões “erradas”, “do mal”, “demoníacas”, “satânicas”, que invocam as “trevas”, etc. No caso do Candomblé, o preconceito é bem acentuado por parte de muitos cristãos. Quando pergunto a alguns cristãos se eles consideram o Candomblé como sendo uma religião de Deus, alguns tentam disfarçar o preconceito e desconversar, outros franzem a testa e tentam expressar uma suposta piedade e desejo que os adeptos do Candomblé também se “convertam” ao Cristianismo, para “salvação” de suas almas, outros afirmam asperamente que esta religião, e tantas outras, são “macumbas”, são religiões “perdidas”, dominadas pelo “demônio”, dentre outras explicações que nada lembram a suposta boa convivência entre as religiões no Brasil.
Porém, a classificação de alguns cristãos que apontam o Candomblé como sendo uma religião “demoníaca” é preocupante para os próprios cristãos, pois analisando mais profundamente os fundamentos destas duas religiões ouso falar (como já afirmado acima) que são irmãs, trazem em si crenças e rituais litúrgicos praticamente idênticos, recebendo apenas nomenclaturas diferentes, mas com o mesmo objetivo, como disse, é a mesma fé, embora (repito) isso soe como escândalo para muitos cristãos. A verdade é quando um cristão critica e põe na “moldura demoníaca” o Candomblé, pode estar, na verdade, colocando a sua própria crença nesta mesma “moldura”, pois, como disse, há mais semelhanças do que diferenças entre estas duas religiões, e até mesmo as diferenças afirmam as semelhanças. Ao que me parece, as disparidades são bem mais culturais do que espirituais, doutrinárias e ritualísticas, embora se permita réplica do que mostrarei a seguir.
DEZ SEMELHANÇAS DOUTRINÁRIAS E/OU RITUALISTICAS ENTRE O CANDOMBLÉ E O CRISTIANISMO
PRIMEIRA: Crença num Deus Soberano: No Candomblé Olorum, no Cristianismo Jeová.
SEGUNDA: Crença que este Deus soberano governa outros espíritos numa hierarquia, em favor dos seus filhos: No Candomblé os Orixás Planetários e Ancestrais e demais falanges, no Cristianismo os Arcanjos, Anjos, os Serafins, os Querubins, etc.
TERCEIRA: Crença que podemos nos aproximar deste Deus e falar com Ele através de Preces e Orações: No Candomblé as rezas, as preces e as firmezas, no Cristianismo as orações, a invocações, os clamores.
QUARTA: Crença de que os louvores e cânticos, utilizando inclusive instrumentos musicais e de percussão, atrai o seu Deus para mais próximo, tornando mais fácil a sua intervenção nos cultos quando há um tipo de adoração sincera: No Candomblé os pontos e cantigas com atabaques que invocam os Orixás, no Cristianismo os louvores e adorações das mais variadas espécies e para os diversos fins que invocam Jeová.
QUINTA: Crença de que os sacrifícios de animais e oferendas de produtos vegetais em seus rituais ajudam na manifestação da benevolência do seu Deus: no Candomblé essa é uma prática litúrgica ancestral, no Cristianismo foi utilizada milhares de milhares de vezes pelo povo Hebreu, hoje o sacrifício cristão ainda existe, mais não mais de animais e vegetais.
No livro de Gênesis há o conhecido sacrifício de Caim e Abel, onde o de Abel foi aceito e o de Caim foi rejeitado (Gn 4:4,5). Ainda em Genesis, o Deus cristão provou Abraão para ver se o mesmo era fiel o suficiente a ponto de oferecer em sacrifício o seu próprio filho. Abraão provou sua fidelidade e estava pronto para matar seu próprio filho em sacrifício ao seu Deus, porém, na última hora, o Deus de Abraão livrou-o da incumbência e proveu um animal para que fosse morto no lugar de seu filho Isaque. (Gn 22:1-13). No livro de Êxodo, vemos que o povo Hebreu criou, sob as ordens de Deus, o Altar dos Holocaustos com medidas especificas para sacrificarem animais e oferecerem vegetais nos rituais de seu culto (EX 27:1-8). Para se consagrar Sacerdotes, o povo Hebreu também sacrificava animais (muitos eram degolados) e utilizava o sangue dos mesmos para outros fins ritualísticos (Ex 29). O livro de Levítico também cita sacrifícios de animais (Lv 1), salientando, inclusive, que os animais deviam ser partidos em pedaços, que deviam oferecer o sangue dos mesmos, queimá-los ao seu Deus e que tudo isso seria como “cheiro suave” ao Soberano cristão ( 1:9). Em Levítico também se registra sacrifícios pelos pecados dos sacerdotes (Lv 4), sacrifícios por pecados ocultos (Lv 5), sacrifícios por pecados voluntários (LV 6), dentre outros contidos naquele livro. Os sacrifícios de animais não são poucos na Bíblia, profetas sacrificavam (I Rs 18), reis Sacrificavam (2 Cr 29), o próprio Jesus foi um grande sacrifício: teve que ser morto e ter o seu sangue derramado como símbolo de que era necessário essa prática na relação entre os homens e Deus. Deus esperava sacrifício de animais e de produtos vegetais. O Deus cristão esperava dos seus filhos “o melhor desta terra”. Hoje em dia, nessa ótica do sacrifico, não se pede mais animais e produtos vegetais, mais se pede dinheiro, bens, cheques, carros importados, apartamentos de luxo e tudo o que os fiéis possam dar, afinal de contas, essa é uma “expressão de fé” para muitos líderes cristãos. A Bíblia mostra que o Deus cristão bebia sangue de animais e aspirava o cheiro de suas carnes queimadas achando ótimo o “cheiro suave” dos sacrifícios, embora alguns cristãos achem essa prática antiga imoral, não tem o mesmo senso de imoralidade quando veem atualmente o povo sendo explorado dentro das igrejas evangélicas em nome do tal “sacrifício”, do mesmo sacrifício. Sem querer criticar, mas apenas fazendo uma leitura contextual, penso que seria melhor a religião cristã ter continuado a cobrar dos fiéis sacrifícios de animais e produtos da terra, pelo menos assim não teríamos essa exploração deslavada que temos visto em algumas igrejas cristãs pela mídia. Isso é lamentável!
SEXTA: Existência de determinados símbolos da presença espiritual e energética do seu Deus: no Candomblé os assentamentos de Orixás, no Cristianismo a Arca da Aliança no Antigo Testamento, ou atualmente, nas igrejas católicas, as imagens dos santos católicos e das divindades cristãs.
SÉTIMA: A existência de uma hierarquia dentro dos templos de culto. Esta hierarquia determina a função de cada um, tendo, inclusive, um responsável espiritual maior: No Candomblé o Babalorixá é o líder maior, no Cristianismo o Apostolo, o Bispo, o Pastor, o Padre (depende da denominação cristã).
OITAVA: A utilização de roupas apropriadas nos cultos e celebrações de cada religião: no Candomblé as roupas de santo, no Cristianismo as roupas dos sacerdotes do povo hebreu que seguem padrões específicos, sendo de linho fino (Ex 28), até mesmo as vestes sacerdotais dos padres e bispos do cristianismo católico e também as roupas que devem denotar pureza e santidade, sendo adequadas socialmente no cristianismo protestante contemporâneo.
NONA: Oferenda de comidas prontas ao seu Deus: No Candomblé as comidas cozidas e preparadas aos Orixás (as comidas de santo). No Cristianismo as comidas cozidas e preparadas para o Deus cristão pelo povo Hebreu (Lv 2.)
DÉCIMA: O uso das danças como instrumentos de invocação do seu Deus durante os cultos: a palavra Candomblé quer dizer dança, e esta é parte fundamental nos ritos do Candomblé. No Cristianismo as danças são utilizadas por ministérios (grupos) específicos, que afirmam ser a dança um ato profético: crença de que a dança em si pode trazer a manifestação espiritual de Deus nas cerimônias religiosa.
CONCLUSÃO
Embora outro teólogo cristão queira dar conotações diferentes para os fatos por mim expostos, fatos inegáveis no principal livro dos Cristãos (A Bíblia), é notório que as semelhanças aproximam veementemente a religião Cristã do Candomblé, mostrando que as diferenças são basicamente culturais: línguas diferentes, termos diferentes, classificações diferentes, etc. para doutrinas, crenças e liturgias iguais, senão na execução, mas no sentido, que é o que mais importa. Essa pequena demonstração de paridade entre o Candomblé e o Cristianismo é o suficiente para trazer por terra a teoria preconceituosa que foi construída ao longo dos tempos pela manipulação dos jesuítas, via Igreja Católica Romana.
Concluo que não há dois lados religiosos, um bom e outro mal, nem tampouco uma hierarquia entre as religiões onde o Candomblé é menos importante: toda religião, seja ela qual for, é importante, na medida em que cumpre o seu papel fundamental: oferecer a mente humana alguma espécie de espiritualidade que lhe proporcione crescimento e aprendizado. Religião do mal é uma religião preconceituosa. Religião das trevas é uma religião discriminadora. Religião do diabo é aquela cujos fiéis abrem a sua boca para julgar, criticar e maldizer aqueles que pensam diferentes de si. Particularmente, considero uma insensatez haver contentas e disputas entre as religiões, pois penso que a espiritualidade é uma só, embora possa ser conduzida de maneira diferente, com foco diferente, em lugares e culturas diferentes.
Assim, deixo sem medo a afirmação de que é preciso aprender a tolerância, o respeito às escolhas diversas, de que é preciso ser humilde o suficiente para deixarmos de defender cegamente aquilo que pensamos ser o melhor para a nós e para aqueles que nos rodeiam (não somos “donos da verdade”), ao contrário, corremos o risco de cair num fanatismo burro, cego e nocivo, que provocará naqueles que nos cercam a mesma repugnância que supostamente o diabo tem da cruz.
OGUM IÊ! ODÔ IYÁ! OBÁ XIRÊ! SALVE MINHA ELEDÁ!
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
KOSHIBA, Luiz. História Geral e do Brasil. Trabalho. Cultura. Poder. São Paulo, 2004, Editora Atual, 2ª Reimpressão, Cap. 20-23.
REIS, João José. GOMES, Flávio dos Santos. Liberdade por um fio: história dos quilombos no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1996. P.9.
CORTESÃO, Jaime. A Carta de Pero Vaz de Caminha. Lisboa: Portugália, 1967. P. 84, 87, 94, 97-8.
GAARDER, Jostein. HELLERN, Victor. NOTAKER, Henry. O Livro das Religiões. São Paulo, Companhia das Letras, 2000.
Bíblia Sagrada.
VERGER, Pierre. Os Orixás. Rio de Janeiro, União Umbandista dos Cultos Afro-brasileiros.