Compromisso com o pacto. Hoje?
1Reis – 8:1-6
“Então congregou Salomão diante de si em Jerusalém os anciãos de Israel, e todos os cabeças das tribos, os chefes das casas paternas, dentre os filhos de Israel, para fazerem subir da cidade de Davi, que é Sião, a arca do pacto do Senhor.
De maneira que todos os homens de Israel se congregaram ao rei Salomão, na ocasião da festa, no mês de etanim, que é o sétimo mês.
E tendo chegado todos os anciãos de Israel, os sacerdotes alçaram a arca;
e trouxeram para cima a arca do Senhor, e a tenda da revelação, juntamente com todos os utensílios sagrados que havia na tenda; foram os sacerdotes e os levitas que os trouxeram para cima.
E o rei Salomão, e toda a congregação de Israel, que se ajuntara diante dele, estavam diante da arca, imolando ovelhas e bois, os quais não se podiam contar nem numerar, pela sua multidão.
E os sacerdotes introduziram a arca do pacto do Senhor no seu lugar, no oráculo da casa, no lugar santíssimo, debaixo das asas dos querubins.” [1]
O texto sagrado se refere ao momento máximo da construção do grande Templo de Salomão, quando o rei, herdeiro da promessa de seu pai Davi ao Deus Altíssimo, faz com que a Arca da Aliança, símbolo maior do pacto e da presença de Yahveh em Israel, seja conduzida ao lugar de destaque no templo, o “sancto sanctorum”.
Ali se pode notar o quanto isso foi importante para todo o povo, pois que todos os homens, todos os anciãos, os cabeças das tribos, os chefes das casas paternas, se reuniram ali e apresentaram sacrifícios incontáveis, bem como se dispuseram ao culto e à adoração ao Altíssimo.
Ora, que nos faria pensar tal referência nos dias de hoje, mormente na vida do homem que se reconhece como herdeiro e mordomo da Criação?
Talvez a certeza de que ainda é possível a reunião dos anciãos de hoje, dos homens de boa vontade de hoje, os sábios, os filósofos, para “erguer a arca” da liberdade, da igualdade e da fraternidade, colocando-a no lugar mais destacado do templo-corpo-vida de cada um e de todos, na entrega de sacrifício agradável ao Eterno, não obviamente, de bois ou ovelhas, mas de luta e dedicação por uma humanidade mais justa e perfeita, de entrega da própria vida pela causa na qual alegamos estar envolvidos.
Este momento que vivemos, de crise de conceitos e falta de ideais, pode ser de fundamental importância na consolidação do caráter daquele que se volta para dentro de si mesmo, em busca da serenidade dos sábios, demonstrada pela prática a Caridade, pela exaltação das Virtudes e pelo estudo constante, exigências impostas ao homem sensato pela sua própria consciência.
Para se preparar para a batalha contra a ignorância e a tirania, o obreiro da libertação precisa se orientar pela Verdade, pela Ciência e pela Tolerância. O silêncio e a meditação fazem o homem prudente, menos exposto ao erro e à repreensão, apto ao desenvolvimento de suas potencialidades, como a polir mais ainda a pedra em que molda seu caráter, com assiduidade e tenacidade, em detrimento dos caprichos do ego.
É a isso que Paul Tillich[2] chama de “coragem de ser”, ou seja, é a decisão que se toma de ir em direção a um ideal, sem se importar com a possibilidade de não ter um retorno satisfatório ou qualquer reconhecimento. É fazer algo que se acredita ser adequado. Escolhe-se ser um defensor da liberdade, da justiça e da verdade. O eu fica em segundo plano.
Então, algum mistério move o sujeito a buscar se unir com outras pessoas e tratá-las como se fossem seus irmãos. Algum mistério divino incomoda o homem, ao ponto de fazê-lo sair do seu ostracismo quase que natural dos dias atuais e buscar se encontrar com outros, que incomodados da mesma forma, se propõem a serem como irmãos e a buscar o bem mútuo.
Assim, o silêncio e a meditação serão ferramentas de suma importância, pois, o homem loquaz não pode ouvir a voz da prudência, nem dar espaço à especulação científica, que conduz à Verdade.
Aquele que tem coragem para se calar e se colocar na posição de ouvinte, este sim, está preparado para ouvir, escutar e entender. Porque se ouve com os ouvidos, mas se escuta com o coração e se entende ao meditar longamente.
Isso nos esclarece ainda mais sobre a nobreza da opção do homem que busca na prática do bem a possibilidade de servir ao propósito do crescimento da humanidade. Na verdade ele está atendendo ao chamado do próprio Deus, conforme diz Vanhoye[3], ao afirmar que "o sacerdócio não é uma posição à qual o homem possa elevar-se para colocar-se acima dos seus semelhantes. É um dom de Deus, que coloca o sacerdote a serviço de seus irmãos".
E com o dom vem o Dever, inevitável necessidade que tem o homem social, ou seja, aquele que vive em comunidade com outros homens, de servir ao outro, a quem convencionamos chamar de “o próximo”.
Diante de tal compromisso, se impõe a necessidade de preparo constante, de busca incessante de capacitação, de conhecimento de si mesmo, do mundo ao seu redor e da Vontade Divina, a qual é necessariamente, o motivo da busca do Homem, que pode ser traduzida pela busca da libertação de si mesmo e de todos os homens das garras da ignorância e do fanatismo, das trevas da idolatria e da loucura do egoísmo.
A chave para alcançar tal fim é o silêncio contemplativo, emblema do domínio da razão sobre as palavras, que indica mais uma vez a necessidade de uma busca silenciosa, cuidadosa e bem administrada, pelo cumprimento do ideal estabelecido, qual seja, encontrar o elo de reconciliação com o Criador.
Assim devemos viver, conviver e coexistir, nós, os seres humanos, herdeiros e mordomos da criação. Nesse ambiente de autopromoção e cuidado mútuo é que é possível se manifestarem as bênçãos do Senhor, sejam elas no campo material ou no espiritual. Nesse ambiente é que pode haver vida para sempre, como nos lembra o Salmo 133.
Referências:
A BÍBLIA SAGRADA. Traduzida em português por João Ferreira de Almeida. Revista e Atualizada no Brasil. 2 ed. Barueri – SP: Sociedade Bíblica do Brasil, 1999.
TILLICH, Paul. A Coragem de ser. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1976.
VANHOYE, Albert. Sacerdotes Antigos e Sacerdote Novo. São Paulo: Academia Cristã.2006
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[1] Bíblia - Almeida Revista e Atualizada, 1999. p318.
[2] Tillich, 1976. p 122.
[3] Vanhoye, 2006. p 197.