Insatisfação
Se há uma coisa que vem no pacote masculino que eu não gosto é fazer a barba. Como isso me chateia. Deixar de fazer seria impensável. Já me indicaram algumas saídas, mas todas elas me apavoraram mais do que alegraram. Se eu pudesse mudar alguma coisa, escolheria que a barba não crescesse ao invés de cair os cabelos. Eu não precisaria fazer barba, e não ficaria careca.
Às vezes esta insatisfação nos leva a fazer coisas imprevisíveis. Lembro-me de uma cachorrinha que ganhamos há alguns anos que não latia, pois onde ela morava, os vizinhos do condomínio reclamavam e seus donos a proibiam de latir. Insatisfeito com aquela situação, ao chegar em casa comecei a correr atrás dela de quatro pés e imitando um latido (você pode imaginar isso?), até que ela voltou a latir, e não parou mais. Então, fiquei incomodado com os latidos dela.
Quando olho ao meu redor, vejo que não estou só, nesta “insatisfação” com o que tenho. Se não fosse assim, não existiriam mulheres arriscando suas vidas por uma turbinada no corpo, não existiriam as fábricas de colorações para cabelos, as academias fechariam suas portas por falta de marombeiros, os tatuadores nem existiriam, os fumantes nasceriam com o nariz virado para cima (tipo chaminé), as calçadas seriam em ziguezague para os bebuns andarem sem dificuldades... Mas não é assim. Estamos sempre insatisfeitos com alguma coisa e se fôssemos Deus... Se fôssemos Deus tudo seria muito diferente. Há sempre alguma coisa que nos deixa com a sensação que poderia ser diferente.
Este sentimento de querer ser igual a Deus é bem antigo. Segundo o relato bíblico o anjo de luz, Lúcifer, estava insatisfeito e imaginava: “Eu subirei ao céu; acima das estrelas de Deus exaltarei o meu trono; e no monte da congregação me assentarei, nas extremidades do norte; subirei acima das alturas das nuvens, e serei semelhante ao Altíssimo" (Is 14:13, 14). Agora, mais conhecido como Diabo, ele nos mostra todas as maravilhas que o mundo oferece para que tenhamos o mesmo desejo dele.
Então vivemos nesta eterna insatisfação, pois nada nos agrada. E acreditamos que se fôssemos iguais a Deus faríamos diferente. Tornaríamos nossos cônjuges melhores, só colocaríamos sol onde houvesse belas praias, não existiriam as celulites, as criancinhas e as mulheres teriam botões de volume (naquelas para abaixarmos um pouco quando chorassem, e nestas para abaixarmos totalmente quando quisessem “discutir a relação”), não haveria fome, pobres, violência e tantas outras coisas que certamente faríamos melhor. Vivemos tentando melhorar o que Deus fez, como se ele não soubesse o que faz.
Devemos aprender com Jesus que “subsistindo em forma de Deus, não considerou o ser igual a Deus” (Fl 2:6), e nos ensinou que “basta ao discípulo ser como seu mestre, e ao servo como seu senhor" (Mt 10:25).
Então, sejamos como o nosso mestre e vivamos com satisfação e alegria a vida que temos. Como ele mesmo nos ensinou, devemos buscar “primeiro o seu reino e a sua justiça” (Mt 6:33), porque todas as outras coisas nos serão acrescentadas. Afinal, como Deus disse ao Apóstolo Paulo, basta-nos “a sua graça” (II Co 12:9). O resto é sempre lucro.