AS OBRAS DO AMOR - KIERKEGAARD
Kierkegaard, filósofo cristão do século XIX, desde os seus 21 anos dedicou-se em escrever principalmente contra a igreja oficial da Dinamarca. Escreveu contra a institucionalização da igreja e em seus escritos traçou o Cristianismo como de fato ele é: prática de vida. Assim podemos ler: “Religião e não sistema filosófico, o Cristianismo é mais comunicação de vida do que de doutrina teórica com dogmas a serem decorados, ou quiçá compreendidos. É para ser vivido na obediência aos mandamentos e, em primeiro lugar, o do amor ao próximo”. (pág. 10).
O livro As Obras do Amor tem 15 capítulos divididos em duas séries. No primeiro capítulo, da primeira série, Kierkegaard aponta para a necessidade da expressão do amor tomando por base o texto do Evangelho de Lucas que diz: “Cada árvore se conhece pelo fruto que lhe é próprio; não se colhem figos de um espinheiro, nem se colhem uvas de sarças” (6:44), como podemos ler:
“Assim também ocorre com a cognoscibilidade do amor pelos frutos: se a relação é correta, diz-se justamente, que eles tem necessidade de aparecer, com o que por sua vez se designa a riqueza. Aliás, teria de ser também a maior das torturas se efetivamente a situação fosse tal que no próprio amor residisse a autocontradição de que o amor exigisse manter ocultos os frutos, que exigisse torná-los irreconhecíveis. Seria a mesma coisa, como se a planta, percebendo em si a vida e a bênção de um copioso crescimento não fosse permitido poder tornar isso manifesto, mas sim precisasse, como se a bênção fosse uma maldição, guardá-lo para si, aí, como um segredo em seu inexplicável murchar” (pág. 25).
Nesse caso, entenda necessidade como consequência natural daquele que participa do amor de Deus. Por esse motivo ele explica “que de maneira nenhuma acontece assim mas.....se uma única determinada expressão de amor, ainda que permanecesse um botão, ficasse, por amor, reprimida em doloroso ocultamento: a mesma vida do amor haveria de inventar uma outra expressão, e assim fazer-se conhecer em seus frutos” (pág. 25).
Uma característica primordial destacada pelo autor nesse livro é que “podem se fazer obras de amor de maneira desamorosa, sim, até mesmo egoísta, mas neste caso a obra de caridade não é uma obra do amor” (pág. 28).
No segundo capítulo: "Tu 'deves' amar", Kierkegaard destaca o amor como mandamento e não como opção e a vigilância que devemos ter em relação a nós mesmos: “o traidor mais perigoso de todos é aquele que cada homem tem dentro de si” (pág. 39).
No terceiro capítulo (último que eu destaco da primeira série) o autor trata do conceito de próximo. Afinal quem é o próximo?: “Aquele que verdadeiramente ama o próximo, ama portanto também, o seu inimigo....o próximo é a distinção completamente irreconhecível entre um homem e outro, ou é a eterna igualdade diante de Deus” (pág. 89).
A segunda parte (série) do livro, além de ensino é também um verdadeiro devocional. São 10 capítulos dos quais eu destaco: O amor edifica; O amor tudo crê – e no entanto jamais é iludido; O amor espera tudo e no entanto jamais é confundido e O amor não procura o que é seu.
As obras do Amor era um livro de cabeceira entre os escandinavos que migraram para o norte dos Estados Unidos, pois muitos o levaram consigo e o liam todas as noites como se fosse uma Imitação de Cristo (Kempis).
Segundo Álvaro Valls, tradutor da obra e um dos maiores estudiosos em Kierkegaard da atualidade, "As Obras do Amor tornou-se um livro clássico, um dos melhores da literatura dinamarquesa. . . É um livro sobre o dever de amar, sobre algo, portanto que não deve ser apenas estudado, mas vivido na prática".
KIERKEGAARD, Soren A. - As Obras do Amor
Tradução: VALLS, Álvaro L. M.
Bragança Paulista: Editora São Francisco; Petrópoles: Vozes, 2005.
431 p.