Minha vocação: Ser pastor

Perguntaram-me se eu gosto do que faço. De imediato respondi que sim, sem, no entanto, me dar conta que aquela fora uma resposta quase que automática, como se tivesse sido programada. Mas por um lado a tal pergunta foi boa, pois, me fez atentar para o fato de que muitas vezes quando indagado sobre o que faço, minha resposta era um tanto quanto orgulhosa. Depois de ouvir de amigos: “teologia não dá dinheiro”. Depois de largar um emprego no aeroporto de Guarulhos para ir pro seminário e ser chamado de louco, claro que não poderia dar o braço a torcer e ouvi-los dizer que me avisaram.

Entretanto, percebo que muitos deles estavam certos sim. Eu poderia ter ido para outro ramo. Poderia muito bem estar trabalhando com informática ou em qualquer outra área que me garantisse um excelente salário. Na verdade, eu já tentei. Já me imaginei (e até prestei vestibular) estudando publicidade, psicologia, sociologia, história ou até mesmo direito. Passei boa parte da minha vida sem saber o que queria ser, mas no final das contas, sempre era levado para os braços da teologia. Talvez por que fui forjado no seio da comunidade. Minha infância se passou toda no convívio de uma comunidade cristã evangélica. Desde cedo fui carregado para fazer visitas a pessoas carentes que viviam em casas e barreiros carentes. Fui criado ouvindo minha mãe cantar “O rosto de Cristo”, “Jesus Nazareno”, “Quando Jesus estendeu sua mãe” e a participar de reuniões de oração. Ao invés de ouvir histórias encantadas eu ouvia sobre como Deus criará todas as coisas em seis dias, descansando no sétimo. Fascinava-me ouvir repetidamente as histórias de Abraão, Isaque, Jacó, José, Moisés, Josué e de todos os heróis da fé. E principalmente como Deus se inseriu na realidade humana através de Jesus Cristo.

Lembro-me que em minha infância brincávamos de igreja. Hoje descubro que realmente gosto do que faço, porque o que faço na verdade é uma expressão do que sou. Descubro na realidade da igreja a possibilidade de ser curado de minhas dores e angustias. Foi na comunidade que vi ir embora o fantasma da solidão. Após um final de semana na igreja consigo dizer “venha” para mais uma semana. Na comunidade encontro força para enfrentar o que tiver que enfrentar por saber que não o enfrentarei sozinho.

Mas acredito primordialmente que cheguei aonde cheguei, não somente por minha educação cristã, pois muita gente teve a mesma criação e não se tornaram pastores. Acredito que minha trajetória se deve a uma vocação. Assisti um episódio de uma série inglesa, que retrata a vida de um reverendo anglicano, onde numa crise diante da situação da igreja e da secularização das pessoas, lhe sugerem que deixe de ser reverendo (ou vigário), ao passo que ele responde que não poderia porque era um chamado e que não poderia recusar um chamado. Da mesma maneira acredito que tive um chamado, embora por muito tempo não tenha entendido isso. Só que ele sempre esteve lá. Entendo sua presença quando penso que onde me sinto completo é na igreja. Sinto algo inexplicável quando estou no púlpito, em uma visita, sentado a mesa com os irmãos, quando um adolescente me diz que me admira e que se espelha em mim (mesmo eu achando que não tenha nada para inspirar alguém) e ao ouvir os gritos da criançada ao me verem chegando à igreja ou em suas casas. Percebo que minhas conversas sempre deságuam na igreja. Que meus textos como diz meu amigo Marcelo Supra Sumo são do gênero cristão. E foi ele também quem me disse que estou pegando o "jeitão de pastor" (assim espero).

Até mesmo as pessoas que mais admiro foram e são pastores. Escrevendo este texto olho para o quadro do Martin Luther King Jr, figura que mais admiro na história da humanidade, e que também foi, antes de tudo, pastor. Dessa maneira percebo que “não ser pastor é uma coisa simplesmente impossível de imaginar. Fui pastor muito tempo antes de saber que era pastor, só não tinha descoberto ainda o nome para isso” (Eugene Peterson).

Ismael Braz
Enviado por Ismael Braz em 20/12/2011
Código do texto: T3398761