As Promessas de Jesus
AS PROMESSAS DE JESUS
Prof. Dr. Antônio Mesquita Galvão
Quem crer e for batizado será salvo (Mc 16,16)
Este texto não estava previsto. Acontece que, minha mulher Carmen, estu-dando os evangelhos resolveu me desafiar: “Por que não fazes um levantamento sobre ‘as promessas de Jesus’?” Confesso o desafio me entusiasmou e decidi fazer uma pesquisa a respeito do assunto. Como idealizadora da pesquisa ela teve par-cela decisiva no trabalho. O texto será distribuído aos amigos e internautas e fica-rá guardado com carinho para, quem sabe futuramente, servir de iluminação para alguma pregação ou retiro espiritual.
O fato é que quem lê os evangelhos se depara com uma série de promessas que Jesus fez àqueles que o amam, seguem seus passos e se tornam missionários da boa notícia da salvação. Crer nas promessas de Cristo insere os membros da sua Igreja no caminho da felicidade e da vida da graça. O tema da nossa reflexão de hoje é, justamente, as promessas de Jesus, que são como uma luz capaz de iluminar e orientar nossa caminhada na direção da casa do Pai.
A palavra promessa, no grego, yposchésis, aparece, explícita ou implicita-mente, algumas dezenas de vezes nos evangelhos, como uma incontestável boa notícia que aponta para todas aquelas coisas boas que Deus reservou para nós e se tornam realidade na ação de Jesus Cristo em favor da humanidade. Sintomati-camente, em muitos textos, ela aparece junto com o verbete dórima, com o sentido de uma recompensa. Os cristãos crêem, sem duvidar, da veracidade das promes-sas de Jesus, que sempre resultam em magníficas recompensas. A fé induz a essa certeza. Nele cremos, com confiança na fidelidade que não engana e jamais de-frauda a nossa esperança.
Nas bem-aventuranças
Jesus começou a ensinar seus discípulos: “Felizes os pobres em espírito, porque deles é o Reino dos céus. Felizes os aflitos, porque serão consolados. Felizes os mansos, porque possuirão a terra. Felizes os que têm fome e sede de justiça, por-que serão saciados. Felizes os que são misericordiosos, porque encontrarão miseri-córdia. Felizes os puros de coração, porque verão a Deus. Felizes os que promovem a paz, porque serão chamados filhos de Deus. Felizes os que são perseguidos por causa da justiça, porque deles é o Reino do Céu. Felizes vocês, se forem insultados e perseguidos, e se disserem todo tipo de calúnia contra vocês, por causa de mim. Fiquem alegres e contentes, porque será grande para vocês a recompensa no céu. Do mesmo modo perseguiram os profetas que vieram antes de vocês” (Mt 5,2-12).
Nas chamadas “bem-aventuranças”, que aparecem nos evangelhos de Ma-teus e Lucas, Jesus promete bens espirituais aos simples e humildes (os “pobres em espírito”), aos aflitos, mansos, sedentos e famintos de justiça, aos misericordi-osos, aos puros e aos perseguidos por causa da justiça. Igualmente obterão a feli-cidade eterna os que forem insultados com as mesmas injúrias assacadas contra os antigos profetas. A todos esses rejeitados e excluídos Jesus promete graças sem limite, como a posse do Reino dos céus, a consolação divina e a posse da ter-ra. Igualmente aos famintos é prometida a saciedade, a misericórdia aos que fo-rem misericordiosos, e a visão de Deus aos que forem irredutivelmente puros de coração.
É salutar observar nessas promessas de Jesus a incidência de graças e dons ocorrentes nesta vida e também na outra. Sendo um dom de Deus, a paz promovida pelo ser humano é vista por Jesus como uma atitude de apostolado, de serviço ao outro e à causa do Reino. Por este motivo, os pacíficos e pacificadores serão chamados privilegiadamente de “filhos de Deus”. A missão deles se asseme-lha à evangelização. Neste mesmo lote de promessas divinas, encontramos os per-seguidos, injustiçados e caluniados, que serão felizes. Ora, não se trata de uma felicidade temporária ou superficial, como acontece às alegrias humanas, mas de algo cujo valor supera os contextos humanos. A promessa de felicidade vinda de Cristo é algo substancial e que excede as mais otimistas expectativas humanas. Essa bem-aventurança final traz como dórima (recompensa) uma bênção sem pre-cedentes, a ser gozada no céu, junto de Deus.
As promessas contidas nas bem-aventuranças apontam para a instauração do Reino e dos seus valores entre aqueles que são fiéis a Deus e ao seu Cristo. As palavras, as promessas e a ação de Jesus tornam presentes no mundo a justiça de Deus, capaz de transformar as viciadas estruturas do mundo, de pecado em graça; de trevas em luz.
A Palavra é eterna
Passarão os céus e a terra, mas as minhas palavras não passarão (Mc 13,31).
Ao contrário das palavras que os sacerdotes pagãos colocavam na boca dos seus deuses e ídolos, Jesus aqui enfatiza a perenidade de sua Palavra, que sai da sua boca divina para contemplar a realidade da vida humana. Essa atualidade vem desde a Antiguidade judaica, onde é dito que tudo (e o salmista se refere aos céus e à terra) desaparecerá, mas Deus haverá de permanecer. Nessa promessa Jesus está a nos afirmar que sua Palavra não é literatura, mas vida, e vida eterna. “A palavra de Deus se cumpre sempre” (Is 40,8).
Os seguidores de Jesus podem crer que aquilo que ele diz é veraz e fiel; não muda nunca. Hoje existem muitas palavras por aí, nos parlamentos, nas igrejas, nas reuniões dos homens e nas universidades. Nenhuma dessas vai nos libertar. Somos obrigados a escutar as palavras dos homens, mas seguir mesmo, só a Pa-lavra de Deus.
A porta das ovelhas
Eu sou a porta. Quem entra por mim, será salvo. Entrará, e sairá, e encontrará pastagem (Jo 10,9).
A comparação do pastor e das ovelhas é, desde o Antigo Testamento, um tema recorrente que está a indicar os cuidados do primeiro por seu rebanho. E não se trata apenas da visão simplificada da realidade pastoril da Palestina. Aqui tudo se encaixa na metáfora do Reino, onde Jesus se auto-denomina a porta do curral (a porta do céu), por onde todo o que entrar estará a salvo e encontrará a felicidade.
Dando prosseguimento à idéia do bom-pastor levantada pela metáfora do salmista (Sl 23), Jesus assegura às ovelhas que se colocarem sob sua proteção, a alimentação, a proteção e a liberdade. Trata-se de uma porta que realiza um aco-lhimento privilegiado, de graça e amor, disponível a quem quiser por ela passar. A união dos juízos, porta e proteção está presente em muitos escritos das culturas da Palestina, como um sinônimo de segurança e defesa. Deus é nosso escudo e proteção.
A vida em abundância
Eu vim para que todos tenham vida, e a tenham em abundancia (Jo 10,10)
Na continuação da idéia anterior, Jesus se refere à vida que ele vem trazer, não a simples animais-ovelhas, mas às pessoas, seus filhos, seu rebanho predile-to. Essa “vida abundante” aponta para uma participação na vida divina, coisa que o ser humano sozinho não pode atingir. Assim como a ovelha, sem o pastor não sabe encontrar os pastos, as fontes de água nem se defender dos predadores, as-sim o homem, sem Jesus não é capaz de atingir a meta da salvação sobrenatural. A vida que Jesus disponibiliza aos que o seguem é uma vida plena, alegre e feliz a partir desta vida. Na continuidade, surge a vida eterna, com a abundância de to-das as graças de Deus. Jesus dá sua vida para que todos tenham mais vida.
A “água viva”
Aquele que beber a água que eu vou dar, esse nunca mais terá sede. E a água que eu lhe darei, vai se tornar dentro dele uma fonte de água que jorra para a vida e-terna (Jo 4,14).
Aqui, mais uma vez a promessa de Jesus aponta para a vida da graça. A chamada “água viva” é uma bênção que mata todo o tipo de sede do ser humano. A “fonte de água” é um bem sobrenatural, rico, abundante, que dura para a eter-nidade.
A água do poço é capaz de matar a sede das pessoas a cada vez que é inge-rida. Com a “água viva” é diferente: ela sacia definitivamente, pois se converte em uma fonte dentro da pessoa, a partir de seu coração. Seus efeitos duram para sempre, pois revelam a irrupção de uma vida sobrenatural e imortal. Há biblistas que enxergam na “água viva” os dons do Espírito Santo. Outros, vêem-na na en-carnação de Jesus e em sua missão redentora e libertadora.
Na missão, a libertação e a cura
Abrindo o livro, Jesus encontrou a passagem onde está escrito: “O Espírito do Se-nhor está sobre mim, porque ele me consagrou com a unção, para anunciar a Boa Notícia aos pobres; enviou-me para proclamar a libertação aos presos e aos cegos a recuperação da vista; para libertar os oprimidos, e para proclamar um ano de gra-ça do Senhor” (Lc 4,17ss).
Este texto, e seu conjunto de promessas são emblemáticos, uma vez que fa-zem parte da proclamação que Jesus fez, na abertura de sua vida pública, na si-nagoga de Nazaré. Aqui temos cinco promessas messiânicas, a saber: a) a Boa no-ticia anunciada aos pobres; b) os presos são libertados; c) os cegos passam a en-xergar; d) a libertação dos oprimidos; e) a ocorrência do “ano da graça de Deus”.
Nesta perícope, um dos trechos mais importantes do Novo Testamento, se observa um duplo-sentido em todas as promessas de Jesus. Elas contemplam a carência material (pobreza, escravidão, doença/cegueira, opressão e necessidade de perdão das dívidas) e o desejo de progresso espiritual (o reconhecimento da “pobreza evangélica”, do cativeiro do pecado e da opressão das más inclinações, a falta de visão espiritual e a necessidade de remissão). Jesus não lê apenas um texto dos ketuwim (escritos) hebraicos, mas está anunciando a sua “plataforma” de atividades, em cima da qual vai organizar toda a sua caminhada, que vai se concluir na ressurreição, no domingo de páscoa.
A declaração posterior de Jesus, “Hoje se cumpriu esta passagem da escritu-ra” (v. 21) revela a instauração do tempo messiânico em que os pobres vão deixar de ser pobres, os doentes vão ficar curados e a libertação é atual e iminente. Esta é a síntese da boa notícia.
O “pão da vida”
Jesus disse: “Eu sou o pão da vida. Quem vem a mim não terá mais fome, e quem acredita em mim nunca mais terá sede” (Jo 6,35).
Eis aqui o pão que desceu do céu: quem dele comer nunca morrerá (v. 50).
Quem come deste pão viverá para sempre. E o pão que eu vou dar é a minha pró-pria carne, para que o mundo tenha a vida (v. 51).
No capítulo 6 do evangelho de João (vv. 22-66) encontramos um dos discur-sos mais reveladores do desejo de Jesus de estar sempre conosco. Neste conjunto de textos ele se refere à Eucaristia, o sacramento do amor e da presença. Se ob-servarmos atentamente os três versículos acima, vamos constatar ali promessas de saciedade, fartura, vida e imortalidade.
O uso do pão em sentido figurado é uma constante nas Escrituras desde o Antigo Testamento, quando os profetas o aplicavam à palavra de Deus. Ora, as promessas de Jesus aqui contidas vêm ao encontro das necessidades básicas e vitais do ser humano: comida e bebida. A partir do anúncio de Jesus, o “pão da vida” não se refere tão-somente à subsistência material, mas à sede de Infinito que sempre afligiu a humanidade. Nossa fé nos indica que só Jesus é capaz de satisfazer nosso desejo de uma vida sem fim. A síntese de comida/bebida aqui aludidos indica o mistério eucarístico. Quem vê Jesus e crê nele, assegura essa fartura e essa vida plena e eterna.
A hierarquia católica (os padres) ligam a expressão “pão da vida” exclusiva-mente ao sacramento da Eucaristia, numa ilação corporativista ao ministério or-denado que, segundo ela, é a única via de transubstanciação do pão/vinho em corpo e sangue do Senhor Jesus. Entretanto, há que se observar que o “pão da vida” é um dom de Deus disponível a todos os cristãos das várias denominações, sejam eles usuários da Eucaristia ou não.
Os não-católicos têm a “Santa Ceia” que funciona como um ágape de me-mória, sem a conotação sacramental empregada pela Igreja de Roma. Neste caso, é possível compreender o “pão da vida” como a Palavra de Deus (cf. Mt 4,4; 1Tm 4,6), já que este é o alimento por excelência. O discurso do pão da vida sintetiza toda a promessa redentora de Jesus, quando ele se oferece sob a espécie do pão (na Eucaristia ou na Palavra) que salva e liberta de todos os pecados.
A vida em Jesus
Quem come a minha carne e bebe o meu sangue vive em mim e eu vivo nele (Jo 6,56).
Aqui ocorre uma sequência da proclamação do pão da vida. A reciprocidade de uma relação gratuita e eterna vem expressa no “vive em mim e eu nele”. É pre-ciso compreender esta promessa como inserta no discurso do “pão da vida”, que vimos no tópico acima. A “vida abundante” (10,10) já está presente naquele que crê e come/bebe, e prepara para a ressurreição futura. Para nós, católicos, a vida vem pelo corpo e pelo sangue de Jesus, contidos sob as espécies eucarísticas do pão e do vinho, respectivamente.
Quem tem a vida em Jesus, rejeita a vida do mundo, os caminhos do peca-do e as propostas da superficialidade e seduções medíocres que vêm do Maligno. É revelado por Deus à nossa fé que só a vida se que se fundamenta nas promes-sas de Jesus, dura para sempre, promove uma felicidade eterna e satisfaz. Com esta vida o ser humano não precisa de mais nada.
... e eu lhes darei descanso
Venham para mim todos vocês que estão cansados de carregar o peso do seu fardo, e eu lhes darei descanso (Mt 11,28).
Viver na virtude, fugir do pecado e rejeitar o erro é uma tarefa cansativa. Aqui Jesus se revela como aquele que acolhe e dá descanso. O mundo provoca em nós tantos “cansaços” ocasionados pelas angústias, decepções e ansiedades do cotidiano. Corremos atrás de tantas ilusões que não são capazes de dar a paz. Só Jesus pode nos dar o descanso que buscamos.
O fardo do bem a da virtude é por demais leve se comparado às exigências desse mundo de pecado. Os embates com as tentações e os pecados colocam o coração do cristão em permanente conflito e angústia. Só Jesus é capaz de dar repouso às almas aflitas. As pesadas cargas dos males humanos é que geram a ansiedade e a depressão. Jesus promete alívio a todos aqueles que o buscarem como caminho e solução.
A ressurreição no último dia
Esta é a vontade do meu Pai: que todo homem que vê o Filho e nele acredita, tenha a vida eterna, e eu o ressuscitarei no último dia (Jo 6,40).
Esta é uma das promessas mais ricas no terreno cristológico e espiritual que encontramos nos evangelhos: a felicidade eterna! Além desta vida, Jesus dis-ponibiliza a ressurreição àqueles que crêem nele. A ressurreição é o grande pre-sente de Deus à humanidade (cf. Jo 3,16). Aqui, fé, vida eterna e ressurreição se interpenetram no mistério do projeto amoroso do Pai, que se realiza na missão libertadora de Jesus. Jesus veio ao mundo para nos livrar do pecado. Ele morreu para que nós – morrendo com ele pelo batismo – possamos ressuscitar com ele para a vida eterna. A ressurreição no último dia é o ápice da realização de todo o ser humano que crê em Deus.
A morada do Pai e do Filho
Se alguém me ama, guarda a minha palavra, e meu Pai o amará. Eu e meu Pai vi-remos e faremos nele a nossa morada (Jo 14,23).
É interessante observar que no amor a Cristo e na observância da sua Pala-vra, a parusia (a vinda do Filho ao mundo) é antecipada. Ela ocorre, não só no fim dos tempos, mas diariamente, em cada momento em que o Cristo é reverenciado pelos cristãos.
Desde o nosso batismo o Espírito de Deus passa a morar em nós, orientan-do-nos, protegendo e consolando. Com a Trindade Santa preenchendo nosso co-ração, nos tornamos aptos à boa obra da salvação, irradiando para todos o amor de Deus que foi derramado em nossa vida.
Nós nos tornamos “morada” da Trindade toda vez em que vivemos a Palavra de Jesus, no amor e na solidariedade. Esse mistério acontece quando nos abrimos à graça de Jesus Cristo, ao amor do Pai e à comunhão do Espírito Santo (cf. 2Cor 13,13). Deus vem a nós quando o recebemos com amor.
A salvação é dom gratuito
Quem crer e for batizado será salvo (Mc 16,16).
Por causa do pecado original o ser humano ficou no limiar do pecado e na iminência da desgraça. Deus criou o homem para o bem e a felicidade e ele – por conta de suas escolhas equivocadas – fica sob o risco de se perder...
O batismo é o sacramento e o sinal da fé, instituído por Jesus, que nos res-gata dessa tendência de perdição. Nessa perspectiva, a fé, que dinamiza o batismo e nos conduz à salvação. Assim, como requisitos para a salvação, o batismo e a fé se interpenetram para a eficácia da missão de Jesus: salvar a humanidade. Crer é aceitar Jesus como nosso único salvador e mediador entre nossas necessidades e a misericórdia do Pai. Quem crê tem a vida em si.
A vinda do Paráclito
Quando vier o Paráclito, ele dará testemunho de mim (Jo 15, 26)
Ao subir aos céus, Jesus acrescenta à missão de seus discípulos o ato de serem, por todos os tempos, suas testemunhas (cf. At 1,8). Esse testemunho, no entanto, por uma série de dificuldades, nem sempre é fácil de realizar.
A vinda do Espírito Santo propicia o discernimento, a coragem e a fortaleza para essa atitude. Ao morrer na cruz, Jesus entrega seu espírito na mão do Pai, para que de imediato ele retorne, na pessoa do paráclito (aquele que vem para a-judar) para auxiliar os crentes a discernir a importância do ser-cristão. O parácli-to (o Espírito Santo) prometido funciona como a memória da Igreja, que vem tes-temunhar a missão de Jesus e manter viva sua memória no coração da Igreja, por ele presidida.
A alegria completa
Até agora vocês não pediram nada em meu nome: peçam e receberão, para que a alegria de vocês seja completa (Jo 16,24).
Esta promessa inflete diretamente na fé da Igreja. O ato de pedir com fé, em nome de Jesus indica que a solicitação será prontamente atendida. Nesta passa-gem o Mestre nos indica que a fé é um fator de felicidade e alegria.
Quem pede com fé e discernimento recebe aquilo que pediu, pois as pro-messas de Cristo não falham. A alegria completa dos cristãos é quando o homem se reconcilia com Deus e com a natureza. Nesse espírito de paz e reconciliação, Deus nunca deixa de atender nossas preces. A nossa alegria está em nos sentir-mos amados e protegidos pelo Senhor, que fez o céu e a terra.
Quem perder vai ganhar
Pois, quem quiser salvar a sua vida, vai perdê-la; mas, quem perde a sua vida por causa de mim, esse a salvará (Lc 9,24).
Aqui temos algo parecido com a histórica “vitória de Pirro”. Ele ganhou uma batalha, mas teve tantas perdas que a vitória não compensou. Esta expressão é utilizada, por analogia, a muitas atividades humanas para descrever uma luta similar, prejudicial para o vencedor. Tem gente que ganha tudo de humano e material na vida e acaba perdendo sua vida espiritual com vistas à eternidade. Quem perder sua vida – pela renúncia, pelo martírio ou pelo sofrimento – por causa de Jesus e de sua Palavra, vai mantê-la para a eternidade. A vida futura deve ser vista de forma superveniente sobre a vida terrena, atual. Esta tem valor relativo; aquela, absoluto.
É salutar sabermos que nem tudo aquilo que a gente ganha ou usufrui nesta vida – especialmente no terreno material – vai servir para a construção da nossa vida fufura. No contrário, muitas perdas ocorridas, dependendo das circunstâncias em que acontecerem, podem resultar em ganhos e lucros para nós.
Quem despreza a vida deste mundo vai preservá-la para a vida eterna
Quem tem apego à sua vida, vai perdê-la; quem despreza a sua vida neste mundo, vai conservá-la para a vida eterna (Jo 12,25).
Neste texto, o ato de desprezar a vida mundana não se trata de relaxar os cuidados com nosso corpo, com a saúde e o bem-estar da nossa família. Não é isto! O desprezo incluso nesta promessa indica a desconsideração com os valores do mundo, como riqueza, bens, posições sociais, cultura, títulos sociais, etc. O apego a esses fatores, na maioria dos casos, produz soberba e egoísmo, gera uma idolatria capaz de afastar as pessoas do projeto de Deus. Quem adora esse tipo materialista de vida, põe a perder a verdadeira vida que conduz à eternidade.
A promessa de Jesus aqui indica a eterna bem-aventurança àqueles que desprezam a superficialidade da vida material, ansiando a verdadeira vida que ele veio nos trazer (cf. Jo 10,10).
As muitas moradas na casa do Pai
Existem muitas moradas na casa de meu Pai. Se não fosse assim, eu lhes teria di-to, porque vou preparar um lugar para vocês. E quando eu for e lhes tiver prepara-do um lugar, voltarei e levarei vocês comigo, para que onde eu estiver, estejam vo-cês também (Jo14, 2s).
Esta sentença tem início no v. 1, quando Jesus afirma: “Não se perturbe o coração de vocês! Creiam em Deus e creiam também em mim. A partir daqui exis-te uma promessa dupla, diante do mal e, quem sabe, do desconhecido da morte. Para livrar-se das aflições da vida é preciso ter fé em Deus-Pai e no seu Cristo. Na história antiga vemos que o homem sempre ambicionou uma casa onde pudesse viver com tranqüilidade (cf. Rt 3,1).
Com o passar do tempo surge a preocupação escatológica: onde vou viver depois da morte? Aqui Jesus diz que na casa do seu Pai tem lugar para todos, não há razão para preocupações. Quem for de Cristo, depois da morte será levado pa-ra junto dele, na tranqüilidade da glória eterna.
Ao contrário das afirmações dos espíritas, que vêem nas “muitas moradas” outros planetas habitados onde ficam os espíritos esperando reencarnação, aqui a promessa de Jesus indica que no céu tem lugar para todos, muito espaço, para quem quiser ir para lá e se dispuser a segui-lo.
O valor do testemunho
Eu digo a vocês: todo aquele que der testemunho de mim diante dos homens, o Fi-lho do Homem também dará testemunho dele diante dos anjos de Deus (Lc 12,8).
Monsenhor Juan Hervás († 1982), o bispo espanhol que em 1949 fundou o movimento mundial de Cursilhos de Cristandade afirmou, em uma de suas obras, que “nós sempre somos uma testemunha de Cristo: a favor ou contra”. Ao subir aos céus, Jesus convoca todos os seus seguidores para se tornarem suas testemu-nhas em toda a terra (cf. At 1,8).
O testemunho cristão é quando este prioriza em sua vida o atendimento às verdades do evangelho e dos mandamentos de Deus. Se agirmos bem, pelo amor, pelo perdão, pela disponibilidade à obra do Reino, nos tornamos testemunhas a favor de Jesus. Se não somos bons, se deixarmos o egoísmo conduzir nossa vida, levando-nos a excluir os outros, sem partilhar e sem exercer o perdão, assumimos a posição, igual ao povo em Jerusalém que gritava “crucifica-o, crucifica-o!”, de tes-temunhas da acusação. Jesus sairá em defesa, na porta do céu, em favor daque-les que o defenderam na terra, junto aos homens.
Estar a serviço dos fracos e excluídos
Quando você der um almoço ou jantar, não convide amigos, nem irmãos, nem pa-rentes, nem vizinhos ricos. Porque esses irão, em troca, convidar você. E isso será para você recompensa. Pelo contrário, quando você der uma festa, convide pobres, aleijados, mancos e cegos. Então você será feliz! Porque eles não lhe podem retri-buir. E você receberá a recompensa na ressurreição dos justos (Lc 14,12ss).
Uma das virtudes mais notáveis dos seguidores de Jesus é o serviço. O Mes-tre veio para servir e não ser servido. A noção de serviço que nos é passada pelo conjunto dos evangelhos aponta para o exemplo de Jesus que chegou a dar sua vida pelos seus amigos, num serviço desinteressado de amor e entrega.
Ao discípulo de Jesus é pedido que preste o serviço sem nada pedir em tro-ca. Nossa sociedade moderna, pragmática e funcionalista, só faz alguma coisa vi-sando algum interesse ou retribuição. O verdadeiro serviço, como o lava-pés de Jesus consiste nisto: dar e servir sem esperar nada em troca.
Receber o Reino com espírito de criança
Eu garanto a vocês: quem não receber como criança o Reino de Deus, nunca en-trará nele (Lc 18,17).
Coisa que nos emociona é a pureza das crianças. É com esse espírito que Jesus alerta seus amigos a respeito das exigências do Reino de Deus. Lá só vai conseguir entrar a pessoa que se dispõe a acolher os dons de Deus (e o Reino é privilegiadamente o dom maior) com simplicidade, humildade e alegria. Não são essas as virtudes que mais admiramos nas crianças? Deste modo, Jesus promete à sua Igreja (que somos todos nós, os batizados) os favores do Reino, desde que haja a disposição de nos tornarmos simples e pequenino, sem orgulho, vaidade nem outros sentimentos menores. As crianças são preferidas de Jesus porque não abrigam em seus corações o ódio, o desejo de vingança nem tendência de superio-ridade e competição.
O céu é de quem se liberta
Ouvindo isso, Jesus disse: "Falta ainda uma coisa para você fazer: venda tudo o que você possui, distribua o dinheiro aos pobres, e terá um tesouro no céu. Depois venha, e siga-me (Lc 18,22).
Não resta a menor dúvida que as riquezas e a posse dos bens materiais são o grande obstáculo para muitas pessoas se elevarem na direção do projeto de Deus. O dinheiro atua geralmente como uma divindade a quem alguns celebram cultos pagãos e de idolatria, tornando-se, desta forma, pedra de tropeço para mui-ta gente.
Na perícope acima, conhecida como “história do ‘jovem rico’”, Jesus coloca como exigência para quem quer segui-lo a atitude de libertar-se das riquezas (ven-da tudo o que você possui, distribua o dinheiro aos pobres). A narrativa termina informando que o jovem se retirou entristecido (concluiu que não poderia seguir a Jesus), porque possuía muitos bens. Aqui a promessa de Jesus aponta para uma necessidade de libertação. Quem se livrar do peso do dinheiro, das riquezas, da injustiça e dos títulos honoríficos de sua vida, este está apto a ingressar no céu, no coração de Jesus e nos braços do Pai.
Pescador de homens
Jesus disse para eles: “Sigam-me, e eu farei vocês se tornarem pescadores de ho-mens (Mc 1,7).
Ser pescador de homens, do jeito que Jesus propõe é dedicar-se à obra da evangelização. Evangelizar é anunciar o primado do amor, é revelar o mistério da ressurreição de Cristo e, sobretudo, dar testemunho do amor de Deus por nós (cf. Jo 3,16). Evangelizadora como é seu propósito, a Igreja deveria começar por se evangelizar a si mesma. Comunidade de crentes, comunidade de esperança vivida e comunicada, comunidade de amor fraterno movida pelo Espírito Santo, ela tem necessidade de ouvir sem cessar aquilo que ela deve acreditar, as razões da sua esperança e o mandamento novo do amor.
O trabalho da evangelização dá a conhecer o Jesus histórico e o Cristo da fé como o kyrios que nos revela o Pai e nos comunica seu Espírito. A evangelização nos chama à conversão que implica em reconciliação e vida nova, capaz de nos levar à comunhão com o Pai, que nos torna filhos e irmãos. Faz brotar, pela cari-dade derramada em nossos corações, frutos de justiça, respeito, dignidade e paz no mundo. É da evangelização que brota a ação cristã no mundo. Ela deve ser transformadora ou deixa de ser cristã.
Despojar-se para ganhar mais
Todo aquele que tiver deixado casas, irmãos, irmãs, pai, mãe, filhos, campos, por causa do meu nome, receberá muitas vezes mais, e terá como herança a vida eter-na (Mt 19,19).
Aqui volta o tema da renúncia, como o homem que encontrou um tesouro no campo, e vendeu tudo o que tinha para adquirir esse tesouro. Trata-se da troca de coisas pequenas por outras de maior valor. É o que em linguagem evangélica chamamos de esvaziamento ou um quase aniquilamento, dito, no grego como ké-nossis. Para obter todos os bens da vida eterna, o homem deve relativizar as coi-sas deste mundo, ter como se não tivesse. Esta é a proposta de Jesus. Quem dei-xa bens e afetos desta vida por causa dele, ganhará muito mais na vida futura. Embora difícil de aceitar, esta é uma realidade que se apresenta como um vestibu-lar do Reino.
A rocha espiritual
Vou mostrar a vocês com quem se parece todo aquele que ouve as minhas palavras e as põe em prática. É semelhante a um homem que construiu uma casa: cavou fundo e colocou o alicerce sobre a rocha. Veio a enchente, a enxurrada bateu con-tra a casa, mas não conseguiu derrubá-la, porque estava bem construída. (Lc 6,47s).
Aqui Jesus compara o ato de escutar e colocar sua palavra em prática, com a construção de um edifício sólido, incapaz de ser derrubado. Sua promessa se fundamenta nessa observância: ouvir e colocar em prática. Afinal, não somos me-ros ouvintes, mas praticantes da Palavra de Deus. É isto que o Mestre promete: a sólida construção de nosso edifício moral e espiritual, a partir das verdades de seu evangelho.
O que derruba as casas são os ventos, as tempestades, as enchentes e os tsunamis da vida. O que destrói nossa construção espiritual são os vícios, o ego-ísmo, a intolerância, a inveja, as fofocas e tantas coisas que abalam as relações pessoais e a unidade das famílias. Escutar (e praticar) a palavra de Deus é o antí-doto e a vacina contra todos esses males; promessa de Jesus.
O Reino é prêmio aos que se convertem
O tempo já se cumpriu, e o Reino de Deus está próximo. Convertam-se e acreditem na Boa Notícia (Mc 1,15).
Aqui a questão volta a se envolver com a perspectiva do Reino de Deus. Je-sus alerta para o kairós de Deus, alertando que os tempos da colheita estão ma-duros e quem crer na boa notícia do evangelho e fizer metánoia (se converter) po-de ambicionar e tomar posse desse Reino preparado para os filhos do Pai desde o início dos tempos. A vinda de Cristo veio abrir para nós as portas do céu. o Reino é uma realidade espiritual que está disponível a todos. Basta querer... basta ten-tar... saber procurar.
Quem se libertar será salvo
Jesus lhe disse: "Hoje a salvação entrou nesta casa, porque também este homem é um filho de Abraão. De fato, o Filho do Homem veio procurar e salvar o que estava perdido (Lc 19,9s).
Zaqueu, embora fosse um homem rico e profissionalmente bem conceitua-do, era, como muitos que conhecemos hoje, um prisioneiro. Alguém poderá obje-tar: mas um homem rico e poderoso, prisioneiro de quê? Era prisioneiro do di-nheiro, da riqueza, do desejo de acumular. Ao que tudo indica, como certos fun-cionários do governo, era desonesto e corrupto. Isso se evidencia pelo fato de, a-pós ser tocado por Jesus, se dispor a devolver e restituir valores e bens.
Isso fazia parte da lei dos judeus. Quem roubasse ou defraudasse alguém tinha que devolver o dobro. Na narrativa, Zaqueu se dispõe a restituir o quádru-plo. Vejam o grau de sua corrupção. Ao se livrar de seus pecados, ele assume a causa dos pobres – possivelmente empobrecidos por suas más ações – e com isto consegue se libertar. A libertação é tão grande significativamente sincera que Je-sus chega a dizer “hoje a salvação entrou nesta casa...” no sentido de “hoje a sal-vação entrou na tua vida”. Nos dias de hoje, é pena que tantos corruptos, deso-nestos e omissos não se deixam tocar pela luz de Cristo e não se dispõe a mudar de vida a repor o que foi roubado. A promessa aponta para a salvação para quem se libertar, assim como aconteceu a Zaqueu, o chefe da “receita”, na cidade de Je-ricó
Todos os dias ao nosso lado
Portanto, vão e façam com que todos os povos se tornem meus discípulos, batizan-do-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo, e ensinando-os a observar tudo o que ordenei a vocês. Eis que eu estarei com vocês todos os dias, até o fim do mundo (Mt 28, 19s).
Evangelizar, ensinar, formar discípulos e batizar é um vigoroso mandamen-to de Jesus, exarado pouco antes de sua subida aos céus. Ele subiu ao Pai mas deixou conosco suas palavras, sua lei e a missão de sermos suas testemunhas. No texto ora em questão aparece a vigorosa promessa de sua presença. Ele vai estar conosco todos os dias, sempre, até o fim dos tempos, os tempos de nossa vida terrena. Depois, nós é que vamos estar com ele... Essa união, entre o Mestre e os discípulos fiéis perdura de uma forma eterna e irreversível.
Nossa vida, aqui e depois, no plano humano e sobrenatural, carece da pre-sença amorosa de Jesus, a nos guiar e dar consolo. Foi o Filho de Deus que disse que sem ele nós não podemos fazer nada (cf. Jo 15,4). Com ele, porém, tudo po-demos, pois é ele que nos fortalece (cf. Fl 4,13) e quando nos reunimos em nome dele (em comunidade) ele se manifesta no meio de nós (cf. Mt 18,29). Esta é a nossa certeza.
Quando terminamos de refletir sobre as promessas de Jesus é bom que se saiba que não somos seres humanos passando por experiências espirituais, mas seres espirituais passando por uma experiência humana. É salutar termos a dig-nidade de filhos de Deus para merecer o que Jesus prometeu. Fomos criados para a imortalidade, e nosso coração só se aquieta quando está em Deus. Na “Salve Rainha”, entre outras preces, a Igreja ora: “rogai por nós, Santa Mãe de Deus, para que sejamos dignos das promessas de Cristo”.