Fazer o bem sem ostentação

Tende cuidado em não praticar as boas obras diante dos homens, para serem vistas, pois, do contrário, não recebereis recompensa de vosso Pai que está nos céus. -Assim, quando derdes esmola, não trombeteeis, como fazem os hipócritas nas sinagogas e nas ruas, para serem louvados pelos homens. Digo-vos, em verdade, que eles já receberam sua recompensa. - Quando derdes esmola, não saiba a vossa mão esquerda o que faz a vossa mão direita; - a fim de que a esmola fique em segredo, e vosso Pai, que vê o que se passa em segredo, vos recompensará. - (S. MATEUS, cap. VI, vv. 1 a 4.)

Em fazer o bem sem ostentação há grande mérito; ainda mais meritório é ocultar a mão que dá; constitui marca incontestável de grande superioridade moral, porquanto, para encarar as coisas de mais alto do que o faz o vulgo, mister se torna abstrair da vida presente e identificar-se com a vida futura; numa palavra, colocar-se acima da Humanidade, para renunciar à satisfação que advém do testemunho dos homens e esperar a aprovação de Deus. Aquele que prefere ao de Deus o sufrágio dos homens prova que mais fé deposita nestes do que na Divindade e que mais valor dá à vida presente do que à futura. Se diz o contrário, procede como se não cresse no que diz.

Quantos há que só dão na esperança de que o que recebe irá bradar por toda a parte o benefício recebido! Quantos os que, de público, dão grandes somas e que, entretanto, às ocultas, não dariam uma só moeda! Foi por isso que Jesus declarou: "Os que fazem o bem ostentosamente já receberam sua recompensa." Com efeito, aquele que procura a sua própria glorificação na Terra, pelo bem que pratica, já se pagou a si mesmo; Deus nada mais lhe deve; só lhe resta receber a punição do seu orgulho.

Não saber a mão esquerda o que dá a mão direita é uma imagem que caracteriza admiravelmente a beneficência modesta. Mas, se há a modéstia real, também há a falsa modéstia, o simulacro da modéstia. Há pessoas que ocultam a mão que dá, tendo, porém, o cuidado de deixar aparecer um pedacinho, olhando em volta para verificar se alguém não o terá visto ocultá-la. Indigna paródia das máximas do Cristo! Se os benfeitores orgulhosos são depreciados entre os homens, que não será perante Deus? Também esses já receberam na Terra sua recompensa. Foram vistos; estão satisfeitos por terem sido vistos. E tudo o que terão.

E qual poderá ser a recompensa do que faz pesar os seus benefícios sobre aquele que os recebe, que lhe impõe, de certo modo, testemunhos de reconhecimento, que lhe faz sentir a sua posição, exaltando o preço dos sacrifícios a que se vota para beneficiá-lo? Oh! para esse, nem mesmo a recompensa terrestre existe, porquanto ele se vê privado da grata satisfação de ouvir bendizer-lhe do nome e é esse o primeiro castigo do seu orgulho. As lágrimas que seca por vaidade, em vez de subirem ao Céu, recaíram sobre o coração do aflito e o ulceraram. Do bem que praticou nenhum proveito lhe resulta, pois que ele o deplora, e todo benefício deplorado é moeda falsa e sem valor.

A beneficência praticada sem ostentação tem duplo mérito. Além de ser caridade material, é caridade moral, visto que resguarda a suscetibilidade do beneficiado, faz-lhe aceitar o benefício, sem que seu amor-próprio se ressinta e salvaguardando-lhe a dignidade de homem, porquanto aceitar um serviço é coisa bem diversa de receber uma esmola. Ora, converter em esmola o serviço, pela maneira de prestá-lo, é humilhar o que o recebe, e, em humilhar a outrem, há sempre orgulho e maldade. A verdadeira caridade, ao contrário, é delicada e engenhosa no dissimular o benefício, no evitar até as simples aparências capazes de melindrar, dado que todo atrito moral aumenta o sofrimento que se origina da necessidade. Ela sabe encontrar palavras brandas e afáveis que colocam o beneficiado à vontade em presença do benfeitor, ao passo que a caridade orgulhosa o esmaga. A verdadeira generosidade adquire toda a sublimidade, quando o benfeitor, invertendo os papéis, acha meios de figurar como beneficiado diante daquele a quem presta serviço. Eis o que significam estas palavras: "Não saiba a mão esquerda o que dá a direita."

"Amemo-nos uns aos outros e façamos aos outros o que quereríamos nos fizessem eles." Toda a religião, toda a moral se acham encerradas nestes dois preceitos. Se fossem observados nesse mundo, todos seríeis felizes: não mais aí ódios, nem ressentimentos. Direi ainda: não mais pobreza, porquanto, do supérfluo da mesa de cada rico, muitos pobres se alimentariam e não mais veríeis, nos quarteirões sombrios onde habitei durante a minha última encarnação, pobres mulheres arrastando consigo miseráveis crianças a quem tudo faltava.

Amai, portanto, o vosso próximo; amai-o como a vós mesmos, pois já sabeis, agora, que, repelindo um desgraçado, estareis, quiçá, afastando de vós um irmão, um pai, um amigo vosso de outrora. Se assim for, de que desespero não vos sentireis presa, ao reconhecê-lo no mundo dos Espíritos!

O mandamento: "Honrai a vosso pai e a vossa mãe" é um corolário da lei geral de caridade e de amor ao próximo, visto que não pode amar o seu próximo aquele que não ama a seu pai e a sua mãe; mas, o termo honrai encerra um dever a mais para com eles: o da piedade filial. Quis Deus mostrar por essa forma que ao amor se devem juntar o respeito, as atenções, a submissão e a condescendência, o que envolve a obrigação de cumprir-se para com eles, de modo ainda mais rigoroso, tudo o que a caridade ordena relativamente ao próximo em geral. Esse dever se estende naturalmente às pessoas que fazem as vezes de pai e de mãe, as quais tanto maior mérito têm, quanto menos obrigatório é para elas o devotamento. Deus pune sempre com rigor toda violação desse mandamento.

Honrar a seu pai e a sua mãe, não consiste apenas em respeitá-los; é também assisti-los na necessidade; é proporcionar-lhes repouso na velhice; é cercá-los de cuidados como eles fizeram conosco, na infância.

Possuído do sentimento de caridade e de amor ao próximo, faz o bem pelo bem, sem esperar paga alguma; retribui o mal com o bem, toma a defesa do fraco contra o forte, e sacrifica sempre seus interesses à justiça.

Encontra satisfação nos benefícios que espalha, nos serviços que presta, no fazer ditosos os outros, nas lágrimas que enxuga, nas consolações que prodigaliza aos aflitos. Seu primeiro impulso é para pensar nos outros, antes de pensar em si, é para cuidar dos interesses dos outros antes do seu próprio interesse. O egoísta, ao contrário, calcula os proventos e as perdas decorrentes de toda ação generosa.

O homem de bem é bom, humano e benevolente para com todos, sem distinção de raças, nem de crenças, porque em todos os homens vê irmãos seus.

Respeita nos outros todas as convicções sinceras e não lança anátema aos que como ele não pensam.

Que Deus nos ampare a todos.

http://www.espirito.org.br/

Roberto F Storti
Enviado por Roberto F Storti em 04/08/2011
Código do texto: T3138556
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2011. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.