Silêncio e tortura: vozes silenciadas na ditadura militar /ᐠ。‿。ᐟ\
João já não sabia mais o que era o tempo. A cela não tinha passado nem futuro. O cheiro de mofo e suor se misturava com a humilhação. A dor não vinha apenas dos golpes, mas da perda de si mesmo. Antes, ele caminhava pelas salas de aula, rodeado de jovens. Falava sobre história, liberdade. Às vezes, ainda ouvia os risos, os debates, o som das cadeiras. Agora, suas mãos, que seguravam livros, estavam feridas e sujas. Quem ele era? Ele se perguntava, sem respostas.
Os passos no corredor eram previsíveis. Mas às vezes mudavam, mais pesados, mais lentos. João sabia o que aquilo significava. As portas se abriam e fechavam. Cada uma delas tirava mais uma esperança. Os gritos dos outros prisioneiros eram constantes, mas ele já não tinha forças para reagir. Seu corpo, marcado, era um reflexo de seu sofrimento. E sua alma? Estaria perdida para sempre?
Eles queriam confissões. O que ele poderia confessar? Que falava sobre a Revolução Francesa? Que discutia liberdade e direitos humanos? João sabia que não importava o que dissesse. Ele já estava perdido. Cada palavra era uma ferida. A dor física era apenas o reflexo do que acontecia dentro dele. As sessões de interrogatório eram intermináveis. Chicotes, bastões, baldes de água gelada. Sua pele estava coberta de hematomas, inchada, difícil de se mover. Mas o pior não eram as marcas visíveis. Era o peso invisível. Ele sentia sua identidade sendo apagada.
No silêncio da cela, João cedeu às lágrimas. Elas escorriam lentamente, misturando-se com a sujeira e o sangue seco. Era um choro silencioso, quase imperceptível. Ele temia que até suas emoções pudessem ser usadas contra ele. Mas, aos poucos, o pranto se intensificou, transformando-se em soluços que sacudiam seu corpo frágil. Chorava pela dor física? Ou pela vida que havia perdido? Chorava pelos alunos que nunca mais veria, pelos livros que nunca mais tocaria. E pela liberdade que nunca mais teria. A tristeza o esmagava, como se quisesse afundá-lo no chão frio da cela.
Por que ele ainda lutava? Por que resistia? Cada tentativa de resistir às lágrimas era inútil. As marcas do sofrimento não se limitavam ao corpo. Sua mente estava sendo quebrada. Ele começou a duvidar de tudo. Será que acreditava no que ensinava? Será que suas palavras tinham valor? Ou o que restava eram apenas ecos vazios de um mundo que ele não podia mais entender? A tortura não era só física. Ela o corroía por dentro. Eles queriam transformá-lo em nada. Queriam apagar até sua essência.
No silêncio, uma frase apareceu em sua mente: "A ignorância é o maior aliado da tirania." Talvez tivesse sido de uma aula antiga, ou de um aluno. A lembrança o atingiu como um golpe. O conhecimento era a chave para resistir à opressão. Mas será que ele ainda acreditava nisso? Na escuridão da cela, aquela frase parecia mais real do que nunca. A ignorância era o que os mantinha no poder. E ele? Será que estava ignorante sobre si mesmo?
Ele tentou focar no som do próprio respirar, mas o ranger da porta interrompeu seus pensamentos. Era um som cruel, lembrando-o de sua impotência. João cerrou os punhos, sentindo as unhas cravarem nas palmas das mãos. Pequenos gestos, quase imperceptíveis. Mas ele precisava disso. Ele precisava manter sua mente ancorada. Escrevia palavras invisíveis no chão com os dedos feridos. Talvez a palavra fosse “liberdade”. Mas o mundo ao seu redor não parecia ouvir. E isso o sufocava.
Ele fechou os olhos. Mas jurou a si mesmo: enquanto houvesse um pensamento livre, ele resistiria. Talvez fosse isso o que restava a ele: a liberdade de pensar. Mesmo que em silêncio. Mesmo que suas lágrimas caíssem. Elas eram uma prova de que ele ainda estava vivo. Mas o que significa estar vivo, se não se é mais quem se era?
Em conclusão, a verdade é clara: a ditadura militar no Brasil (1964-1985) foi um período de repressão brutal. Violência, tortura e censura eram usadas para controlar a sociedade. O medo dominava. O mais chocante? Ainda há quem acredite que foi uma época maravilhosa. Que havia segurança para todos e distribuição igual das riquezas produzidas. Mas, à luz da história, isso não se sustenta. Em nome da ordem, muitos ignoram os direitos humanos, avilta a cidadania e a democracia. Lembro que esses valores são inegociáveis. Respeito quem pensa diferente. Mesmo que aprove todos os horrores da época.