Entre tapas e beijos
Durante sessão para promulgação da reforma tributária no plenário da Câmara dos Deputados, um parlamentar foi flagrado esbofeteando outro colega. Após a lamentável demonstração de incivilidade, o ofendido discursou da tribuna aos prantos, assegurando que se sentia “humilhado” e que “a briga deveria ser no campo das ideias, cada um fica nas trincheiras que defende”, entre outras frases de efeito. As copiosas lágrimas do estapeado foram o catalisador de seus minutos de fama, uma oportunidade de ouro para capitalizar o vexaminoso e pueril atrito. Não obstante o acirramento dos ânimos ter sido estimulado pela presença do chefe do executivo federal naquela reunião solene, a constatação é a de que fatos similares são recorrentes em um ambiente onde, a rigor, haveria de se imperar o respeito mútuo e o acatamento incondicional ao regramento daquela casa legislativa.
Os antigos recomendavam que os sentimentos distintos e antagônicos que movem as pessoas devem ser relevados e ainda, em determinadas ocasiões é imprescindível dispensar tratamento polido, respeitoso e cordial ao visitante indesejado. Esses são preceitos básicos que demonstram boa educação para com o semelhante. Porém, parece que os ilustres representantes do povo não conhecem esse conselho popular, uma vez que deixaram ridiculamente de lado o respeito ao zombar do presidente da República, estopim para o confronto físico entre os pares. Faltou urbanidade e sobrou baixaria. Alguns congressistas insistem em se portar como pirralhos peleadores na saída do colégio. È triste a constatação de que são esses criadores de casos contumazes e seus colegas de poltronas estofadas os responsáveis por delinear o destino de cada habitante dessa nação. Não obstante a maioria deles se dedicar exclusivamente a demandas específicas como a liberação das malfadadas “emendas parlamentares impositivas”, ou à aprovação dos ultrajantes cinco bilhões para campanhas eleitorais entre outras convenientes pautas, suas excelências, salvo raríssimas exceções, costumeiramente se bandeiam para o lado onde o vento sopra.
Por esses vexames e outros mais, nada de bom se pode esperar dessa privilegiada casta. O contribuinte deve preparar o lombo para receber chibatadas doloridas no ano vindouro, enquanto os briguentos terão à disposição uma montanha de recursos do Fundo Partidário. Ficamos cá, pois, a imaginar de que maneira a área econômica buscará a “meta do déficit zero” e outras falácias mais, se esse governo definitivamente não pretende cortar gastos, pelo contrário. Em suma, é tudo cortina de fumaça, porque logo a movimentação dos parlamentares se concentrará nas eleições municipais. E o impensado apoio de atuais adversários, até mesmo daquele do tabefe certeiro, poderá vir a calhar no palanque do choramingas, seja por quais motivos isso eventualmente acontecer. É necessário separar o joio do trigo, ainda que a tarefa seja cada vez mais improvável. Já vimos esse filme, porque o roteiro é sempre o mesmo. Com os interesses partidários acontecendo entre tapas, beijos, empurrões e blasfêmias, o povo continuará, desde sempre, pagando a conta. Como diria o saudoso Chico Anysio, magistralmente encarnado no impagável Professor Raimundo: “... e o salário, ó...”.