MILEI, O COLLOR ARGENTINO

 

 

Gabriel Garcia Marques tinha razão. A América Latina parece mesmo um continente onde tudo é surreal.  E se Nietzsche tivesse bolado seus delírios sobre o eterno retorno pensando no que acontece por aqui, ele não teria errado. Porque na América Latina tudo se repete com irritante precisão. Faz pouco mais de quarenta anos que Collor de Mello se elegeu presidente do Brasil prometendo acabar com uma inflação que beirava ao 500 % ao ano. E também prometeu ( e cumpriu) criar uma nova moeda para substituir o combalido cruzado que governo Sarney havia criado. O resultado, quem tem mais quarenta anos, sabe. Collor, o “saco roxo” das Alagoas, julgava suficiente ter ganho as eleições e contar com o apoio popular para mudar toda a estrutura econômica de um país que nunca teve uma moeda forte justamente porque nunca conseguiu desenvolver um sistema econômico que pudesse sustentá-la.

Esse é o grande engano que os políticos que se encantam com o canto de sereia monetarista cometem. Não é a moeda que sustenta a economia de um país, mas sim a economia que sustenta a moeda. Winston Churchil descobriu isso quando, como Primeiro Ministro da Inglaterra, tentou recuperar a combalida economia inglesa destroçada pela guerra, mexendo no padrão monetário da libra. Collor também pensou que bastava trocar a moeda “contaminada” (como a ela se referia Zélia Cardoso de Mello, a sua inefável ministra da Economia), para que o Brasil, da noite para o dia, se tornasse uma potência econômica mundial.  Bolou um ambicioso e rocambolesco programa de mudanças no sistema econômico do país,  trocou de moeda e promoveu uma nova abertura dos portos. Deu no que deu.

Ele logo viu que os problemas econômicos do Brasil não tinham nada a ver com a moeda, mas com a sua base de sustentação, que é a própria atividade econômica e a eficiência com que a gestão do seu produto é feita, pois é isso que sustenta a fidúcia da moeda e não o contrário. Mas aí já era tarde.

Esse é o problema que nossa vizinha Argentina está vivendo. Uma mistura de Collor de Mello com Jair Bolsonaro parece ser a preferência dos “hermanos” para governar a pátria de Maradona e Evita Peron pelos próximos quatro anos. E a sua principal plataforma de governo é a troca da moeda, o desidratado peso argentino, pelo dólar americano.

Não sei de onde esse aloprado candidato tirou a ideia que a Argentina poderia se tornar uma espécie de quinquagésimo terceiro estado americano, com a tradição política caudilhista que tem e a estrutura corporativista que Peron impôs ao país e nenhum sistema político (inclusive a ditadura militar) até hoje conseguiu modificar. Mas de uma coisa eu tenho certeza. Se o povo argentino comprar essa ideia maluca será melhor mudar o nome para Macondo, o país surreal imaginado por Garcia Marques, onde as crianças já nascem com rabo de porco.