É Hora de Virar a Página
A inelegibilidade de Bolsonaro pode ser um ponto de mudança para o Brasil
Temos certa dificuldade em lidar com fatos. Se são os que nos agradam, como quando nosso time ganha, exageramos como se houvesse sido uma conquista inédita e insuperável. Se perde, pomos a culpa no juiz ou VAR ou criamos uma história fictícia de doping que o resultado será revertido. Assim foi com as últimas eleições, como já havia ocorrido em 2018. A vitória apertada de um candidato levou a teorias da conspiração e negativas dos fatos. E o final foi que deveria ter sido, o vencedor tomou posse e a vida seguiu. Alguns gostaram do resultado, outros não, mas os fatos se impuseram às fantasias e a vida seguiu.
A condenação do ex-presidente é um fato e vai se impor. Seu bloco político vai protestar e criar teorias, haverá recursos na justiça, mas em quatro anos novos candidatos surgirão para ocupar seu lugar. Quanto antes aceitarem o fato e melhor se prepararem, maiores as chances de chegarem fortes no próximo pleito. A saída do adversário enfraquece foco do atual governo, de diminuir o anterior e vai obrigá-lo a se concentrar em governar. É preciso virar a página da eleição passada e focar na realidade.
É muito difícil fazer isso. Quando o partido que apoiava, o finado PSDB, perdeu o poder e depois sumiu, por muito tempo fiquei no negacionismo, naquela coisa de só ver defeitos nos governos seguintes e esquecer do que me interessava, que eram as decisões que eram tomadas e seu impacto na minha vida. Verdadeira perda de tempo e de energia.
Depois de sucessivos governos de candidatos que eu não gostava, tornei-me pragmático, aprendi a focar nos fatos. Deixei de me preocupar com quem estava no poder e focar mais no que fazia. E percebi que todos os governos que houve de lá para cá fizeram coisas boas e ruins. Analisando criticamente o passado, percebi foi o mesmo quando os que eu apoiava estavam no poder. Por fim, percebi que discutir se o que o governo faz me interessa ou não é melhor para minha vida do que bater boca com quem gosta de partidos ou políticos diferentes dos meus.
Provavelmente é otimismo demais esperar que o mesmo ocorra com as outras pessoas, entretanto, desejar isso é livre. Eu espero que ao menos alguns bolsonaristas entendam que outros políticos podem representar suas ideias e que temos tal equilíbrio no Congresso que nada impede que projetos interessantes aos conservadores sejam aprovados. Também espero que alguns petistas tenham evoluído para entender que nem todas ideias do partido são boas e que soluções negociadas implementadas valem mais do que posturas ideológicas que não saem dos sonhos.
Não será a maioria dos brasileiros que vai virar a página. Muitos vivem no passado, acreditam numa ameaça comunista que simplesmente não existe. A União Soviética que tentava implementá-lo no mundo desapareceu há mais de 30 anos e a Rússia atual não consegue impor comunismo a ninguém. A China nunca fez isso, prefere comerciar e enriquecer do que interferir no governo dos demais países. O Brasil tem maioria de direita, Lula hoje é de centro esquerda, não tentou impor comunismo quando tinha 80% de aprovação, não pode fazê-lo agora. No resto do mundo, com exceção dos trumpistas americanos, ninguém acredita nesta ameaça.
Nós vivemos um momento histórico. Muitos anos após a Constituição de 1988 finalmente vamos rediscutir o que importa, a Reforma Tributária que pode mudar o quanto as pessoas ganham, sejam trabalhadores ou empresários. Muitos vão continuar discutindo Bolsonaro x Lula, capitalismo x comunismo, direita x esquerda. Alguns vão conseguir sair do passado que não podemos mudar e discutir o presente e futuro que é onde podemos influir. É hora de virar a página.