Ao devolver joias, Bolsonaro aprende que não pode ficar com o que não é seu

 

Chico Alves 
Colunista do UOL

Geralmente, a noção de propriedade é ensinada bem cedo às crianças. Quando um menino ou uma menina quer se apossar do brinquedo do coleguinha, os pais explicam que ninguém pode ficar com o que não é seu.

Com o tempo, quem vira adulto aprende que quebrar essa regra é cometer crime.

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Jair Bolsonaro, ex-presidente do Brasil, parece ter recebido a lição somente agora. Depois de se apossar ilegalmente de joias que foram enviadas pelo governo da Arábia Saudita (avaliadas em mais de R$ 800 mil) e de armas ofertadas pelo governo dos Emirados Árabes, foi obrigado pelo Tribunal de Contas da União (TCU) a devolver.

Os presentes, de alto valor, deveriam ter sido declarados à Receita Federal e encaminhados para o acervo da Presidência da República. Nada disso foi feito. Bolsonaro continuaria de posse de bens que pertencem à União se matéria do Estadão não tivesse revelado que, em novembro de 2021, um auxiliar do ex-ministro Bento Albuquerque tentou passar na alfândega do aeroporto de Guarulhos sem declarar joias oriundas da Arábia Saudita no valor de R$ 16 milhões.

Com o escândalo que se seguiu, veio a descoberta de que havia um outro kit precioso. Posteriormente foi revelado o envio de armas dos Emirados Árabes. Ambos ficaram com Bolsonaro.

A humilhante devolução ocorreu hoje.

O homem que em 2018 foi eleito para o principal cargo político do Brasil não deu muitas explicações, apenas disse que a devolução das armas o fez sentir "dor no coração".

Não expressou constrangimento, como faria, por exemplo, um político japonês em situação semelhante.

Mesmo que não tenha entendido completamente as limitações éticas do cargo - que impedem o ocupante da Presidência de receber presentes valiosos para evitar especulações sobre propina ou algo parecido —, Bolsonaro sabe desde hoje que não pode ficar com o que não é seu.

Para quem, como ele, é acusado juntamente com seus filhos Flávio e Carlos de montar esquema de rachadinha, em que parte dos salários dos funcionários do gabinete dos seus tempos de deputado era surrupiada, a lição poderia ter vindo bem mais cedo.

Mas, como diz o ditado, antes tarde do que nunca.

Chico Alves

Colunista da UOL