Bandidolatria em dose dupla

Parece piada, mas não é. Se é piada, é de mal gosto, monstruosamente criminosa, um retrato, e retrato fiel, do abismo existencial, moral, que ora prevalece, não digo na sociedade brasileira, mas no jornalismo nacional.

Em uma reportagem de telejornal, ao narrar e comentar um episódio trágico, que se repete, num ritmo alucinante, cujos personagens são um policial e dois bandidos, a jornalista, para descrever a ação dos bandidos, afirmou que eles atiraram, para se defenderem, no policial, cinco vezes, alvejando-o, e matando-o.

Querido leitor, você entendeu, eu sei, o que leu no parágrafo anterior. E não! não escrevi asneiras, não escrevi bobagens. Não me equivoquei no uso das palavras, não. Não me confundi ao dizer o que a jornalista declarou, não. Não se esqueça, ou, se não sabe, saiba: vivemos num país em que não poucos professores de filosofia vêem lógica no assalto. A jornalista, a que apresentou a reportagem da qual trato aqui, nesta nota breve, disse, e com todas as letras, que os bandidos atiraram, para se defenderem, no policial, e aventou a hipótese de o policial haver, imprudente, e inconsequentemente,esboçado reação. Quanta sandice há em tal reportagem! Quanta miséria intelectual! Quanta demência moral! Converteu-se o policial num vilão, e os assassinos nas vítimas dele. Não se condenou os criminosos, assassinos, que usaram armas - e armas matam, não é mesmo?! - e condenou-se o policial porque ele talvez tenha reagido, inadvertidamente, o que faz dele culpado por sua morte, à ação dos criminosos, seus assassinos. Bandidolatria em dose dupla.

Ilustre Desconhecido
Enviado por Ilustre Desconhecido em 10/11/2022
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