A mulher do imperador

O dicionário define caráter como formação moral, honestidade, índole, entre outros sinônimos. No cotidiano, o termo é empregado para classificar o indivíduo que apresenta um conjunto coerente de atitudes, em geral positivas e que normalmente tem o poder de aglutinar pessoas. Nos tempos de outrora havia o costume de se mensurar o caráter de um indivíduo através do cumprimento integral de compromissos de toda ordem, em que a palavra empenhada era seguida à risca pelo promitente. Se antigamente o fio do bigode representava a honradez de um cidadão, atualmente a coisa mudou radicalmente, uma vez que palavra dada não significa necessariamente palavra empenhada, pelo menos quando o emitente é um político brasileiro. A modernidade e a conectividade geral e irrestrita parecem ter afetado consideravelmente o caráter de determinadas pessoas, notadamente aqueles ofuscados pelo brilho dos holofotes e flashes da imprensa, ultimamente assoberbados com a correria da campanha eleitoral.

E para quem imaginava ver seus candidatos apresentando proposituras factíveis com o debate fértil e civilizado, fornecendo subsídios para que o eleitor pudesse escolher com sapiência seu representante, restou apenas uma grande decepção. Lula e Bolsonaro utilizaram o tempo estabelecido para distribuir acusações equiparadas aos entreveros de adolescentes na saída dos colégios. O fato se repete nas excêntricas inserções no rádio e televisão, evidenciando as iniciativas dos candidatos em acusar, ofender, desmerecer, denegrir, difamar o adversário e por aí vai. Não convence a desculpa de que tudo isso são táticas para desestabilizar o adversário. O que não se compreende é como candidatos experientes e calejados em campanhas eleitorais, deliberadamente tentam ludibriar e confundir pessoas simples e honestas com o emprego da semântica, conferindo a si mesmo pressupostos da verdade e da razão, quando poderiam simplesmente apresentar planos e metas para o futuro do País.

Os presidenciáveis pisaram feio na bola, na forma e no conteúdo totalmente destoante das expectativas, mas se empenharam com esmero em mostrar uma habilidade inquestionável: a capacidade ilimitada de mentir descaradamente. Milhões de brasileiros viram os postulantes à cadeira estofada do Palácio do Planalto acusando-se mutuamente de faltar com a verdade. Para o cidadão de bem, não se admite um comportamento leniente ante acusações desse naipe. Se realmente são verdadeiras as assertivas, então nenhum dos candidatos possui condições morais para assumir o cargo e conduzir os destinos da nação. Se forem inverdades, há que se responsabilizar o adversário por falsas acusações. Mas em hipótese alguma, um cidadão honesto e de caráter aceitaria ser alvo daquele tipo de comentários sem esboçar uma reação democrática à altura de suas pretensões. Certamente assim diria o destemido imperador romano Júlio Cesar, se porventura viesse a presenciar esse triste e anacrônico espetáculo de baixarias: “A mulher de César não basta ser honesta, deve parecer honesta”. Porque é tudo uma questão de caráter. Ou da falta dele.