Tunísia / Marrocos: motivo de uma crise diplomática

A Tunísia, ao abrigar no final do mês passado de Agosto, a cimeira internacional, TICAD, cuja maioria dos países participantes são africanos, o Marrocos, na última hora anulou a sua participação neste evento, motivo a recepção, oficialmente do líder da Frente Polisario, Ibrahim Ghali, em Túnis, pelo presidente da Tunísia,

Isso provocou uma crise inédita entre as partes, a ira e a desaprovação da diplomacia marroquina, envolvendo uma questão candente do Saara Ocidental, opondo Marrocos e Argélia há 60 anos.

O boicote do Marrocos à TICAD, além da retirada imediata do embaixador marroquino em Túnis. Aumentou ainda mais a crise diplomática entre a Tunísia e o Reino de Marrocos, cujas relações de amizade e fraternidade são históricas.

A pressão midiática do lado marroquino e incompreensão do lado dos tunisianos, continuam a levantar interrogações sobre uma série de posições e interesses comuns.

Quais são os verdadeiros motivos desta crse a? O que levou a diplomacia tunisina a mudar de posição da neutralidade em relação ao Saara Ocidental?

Contexto de neutralidade histórica

Com vista a rivalidade existente entre Marrocos e Argélia na questão do Sahara Ocidental, qual continuando até hoje a surtir seus efeitos sobre as relações da vizinhança, tornando-se uma questão cada vez mais delicada que nunca na paisagem geopolítica do Magrebe tem sido assim, e amplamente em todo o mundo.

Um conflito de 60 anos, pelo qual ainda não se encontrou uma saída consensual, pontuado por fases de tensão e apaziguamento. Esta região do Saara ocidental ainda não tem, até hoje, um estatuto jurídico definitivo, cabendo aos dois países reclamar esta parte do Saara, localizada na costa atlântica, no cruzamento de três Estados. ( Marrocos, Argélia, Mauritânia)

Por seu lado, a Tunísia historicamente sempre tentou manter uma posição de neutralidade, desempenhando o papel de locomotiva na construção da União do Magrebe Unido, cujos poderes e decisões são quase inexistentes devido às tensões entre Marrocos e Argélia.

A Tunísia não pode desempenhar o papel de mediador. Uma vez que este dossier do Sahara Ocidental foi sempre supervisionado pelas Nações Unidas, e vai além das capacidades diplomáticas da Tunísia e suas ambições, mesmo se ela visa a desempenhar qualquer papel de mediação.

A Tunísia sempre chamou em prol da unidade, da construção do grande Magrebe Árabe, da fraternidade e do diálogo. Uma situação que é difícil de manter, sem que nunca tenha sido posta em causa. A posição da diplomacia tunisiana nunca mudou neste dossier do Saara marroquino.

Argélia e Tunísia

É importante lembrar que a Argélia é extremamente importante para a Tunísia do ponto de vista da segurança, da economia e energia, bem como o Marrocos é considerado como um vizinho importante, com que detém boas relações, de longa história baseada na amizade e fraternidade.

Historicamente, o Marrocos esteve sempre ao lado da Tunísia, a exemplo da posição do rei Hassan II em 1980, na altura do ataque a Gafsa, quando ofereceu a sua ajuda a Bourguiba. Hassan II havia dito esta frase altamente simbólica: "A Tunísia nunca vai ser outra, porque ela é acima de tudo um povo", revelando o vínculo fraterno entre as duas nações.

Outro destaque são os motins anticolonização que ocorreram em Casablanca após o assassinato de Farhat Hached , que mais tarde deu nome a uma importante avenida de Casablanca, importante cidade do país.

Não tem as mesmas relações econômicas, comparado com a Argélia. Apesar da concorrência com Marrocos em muitos setores de atividades comerciais, bem como na questão do turismo, cujas relações humanas transcendem no sentido de afastar qualquer perigo de ameaças ou terrorismo.

Hoje se conta com muitos estudantes tunisianos no Marrocos, além de muitos negócios entre as partes, bancos marroquinos na Tunísia, telecomunicação, seguro,,,etc.

Mudanças no horizonte?

Diante dos elementos expostos, é inegável pensar que a atitude da Tunísia em relação à recepção de Ibrahim Ghali em Túnis durante a TICAD ( Africa-Japão), constitui um descompasso para com a sua posição histórica.

A vista do sr Ghali, líder dos separatistas da polisário, desembarcado do avião, recepcionado pelo presidente do estado tunisiano, lado a lado na pista do aeroporto, numa cerimónia oficial, a honra de um chefe de estado soberano, tal fato foi divulgado a grande escala pelas redes sociais e de grande escala, contrariamente se o caso for passado de forma despercebida ou se o presidente tunisiano não o tivesse recebido com grande alarde?

A divulgação nas páginas de Facebook estas cenas retomadas pelos jornais pelo mundo, além dos debates televisivos, sobretudo da presidência revelando algum embaraço na comitiva do Gali, referindo a recepção de Ibrahim Ghali, pelo Chefe de Estado da Tunísia, mas ao mesmo tempo sem mencionar a sua função de chefe da Frente Polisario.

A questão que ficou no ar foi quem convidou o líder da República Árabe Saharaui Democrática (RASD)?

Segundo o Ministério dos Negócios Estrangeiros da Tunísia, o convite foi enviado pela União Africana. No entanto, Macky Sall , Presidente do Senegal e da UA lamentou a ausência de Marrocos em Túnis durante a conferência. Então de quem é a culpa?

Marrocos faz da questão do Sahara Ocidental um elemento fundamental da sua política externa. Este é um assunto quente no Reino, então não se deve surpreender com esta reação inopinada.

Além disso, não se deve também ser enganado neste dossiê ao considerar que a questão do Sahara Ocidental é apenas um problema do regime. Existe realmente uma ligação do povo marroquino para com o Saara do mesmo com o território marroquino. Indo da legitimidade do regime ao do povo, por isso e que este dossier do Sahara Ocidental tem tanto impacto em Marrocos, mais do que na Argélia.

Concluindo que a Argélia faz entender, estar jogando com a legitimidade sobre outra coisa que não é a questão do Saara.

Com efeito, não é a primeira vez que o Marrocos interroga sobre as relações diplomáticas com outros países, chamando para aclarar sobre as posições ambíguas no Sahara Ocidental.

Recordando ultimamente a crise com a Espanha, sendo no final acaba sendo neutralizada in extremis, bem como da Alemanha, que durou mais de um ano.

Interesses econômicos com a Argélia

Lembrando que desde o início da guerra na Ucrânia, os países exportadores de gás aproveitaram a situação para mudar o equilíbrio de poder.

A Argélia, por sua vez, mostrou que ela tem um cartão do pode a usar vis à vis de seus vizinhos para exercer uma pressão real sobre sua posição quando tratar da questão do Saara Ocidental.

A pergunta que se segue é saber o que levou o governo tunisiano a mudar de neutralidade?

Vale entender que Argélia fornece gás a tunisia, além da ajuda sob a forma de um depósito no Banco Central da Tunísia. Deve-se saber que hoje o poder atua em um contexto econômico e energeticamente complicado para a Tunísia.

Seus predecessores tinham os mesmos interesses, mas não estavam em uma situação tão frágil. É essa fragilidade que, sem dúvida, o levou a se aproximar da posição argelina, mesmo que nenhum anúncio tenha sido feito sobre o apoio oficial da Tunísia à Argélia na questão do Saara Ocidental. Mas isso parece a razão que explica esta crise de poderes entre finalmente, Argel e Rabat.

Por enquanto, ainda não podemos dizer até onde esse conflito diplomático pode ir. Tem que esperar pelos canais diplomáticos vindos de Túnis.

Quem desenha a política externa da Tunísia?

Além disso, este caso leva -nos a questionar-nos sobre quem traça a política externa da Tunísia. Na maioria dos países do mundo, a política externa é fruto de compromissos, acordos, interesses estratégicos definidos pelas instituições que governam o país.

Nas grandes nações, existem altos conselhos dedicados à política externa que definem as orientações estratégicas.

Talvez ainda seja cedo para analisar as repercussões concretas dessa crise diplomática na relação entre os dois países.

Uma coisa é certa, é que o Marrocos já demonstrou no passado a importância do dossier do Sara Ocidental nas orientações da sua política externa.

Lahcen EL MOUTAQI

Prf Universitário-Marrocos

ELMOUTAQI
Enviado por ELMOUTAQI em 09/09/2022
Reeditado em 09/09/2022
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