Vamos continuar apanhando?
Todo tipo de violência deve ser coibido, porém alguns aumentam a nova indignação, como nos casos de violência contra crianças, mulheres e idosos que, quando são divulgados, logo ganham repercussão e julgamentos diversos. Muitas pessoas costumam culpar as próprias vítimas e um exemplo clássico é o da esposa que sofre agressões constantes. De modo precipitado logo alguém questiona o motivo por não ter abandonado ou denunciado o agressor antes.
Estudando diversos casos, observamos que a vítima mantém laços afetivos ou está sob dependência econômica de tal sorte que não consegue romper a barreira e a dominação impostas. Também existem situações em que o agressor sempre promete que vai mudar ou acena com algum agrado ou presente, especialmente quando deseja algo em troca, induzindo a vítima a acreditar na promessa e na mudança, mantendo a relação tóxica.
Existe uma modalidade de violência, tão cruel quanto a violência física, que podemos chamar de violência político administrativa e não digo aquela do policial penal que cruelmente matou um cidadão na própria festa de aniversário em Foz do Iguaçu ou daqueles casos de troca de agressões em manifestações públicas, tão pouco da repressão das forças de segurança contra opositores aos governos ou regimes instalados. Esta outra forma violência é feita com a caneta, às vezes BIC, através de Leis e Decretos e outros instrumentos que definem as políticas públicas que serão disponibilizadas à população em geral, especialmente aos mais necessitados.
Na vida política brasileira, desde que surgiu o instituto da reeleição, criou-se uma triste tradição: a do governante que passa três anos sem fazer nada, esquecendo completamente da população mais necessitada e, no quarto ano, surge com obras, benesses, visitas e discursos apaixonados. Ocorre que esse modus operandi foi naturalizado, até criou-se a frase “este ano é político, então ele dará tudo o que necessitamos”. Assim, os servidores públicos sabem que após um triênio de arrocho, no último provavelmente terão uma recomposição salarial. Da mesma forma acontece com o recapeamento asfáltico, inaugurações das intermináveis obras ou atendimento de algumas demandas históricas. De olho nos votos os cofres públicos são abertos indistintamente e o discurso de austeridade e responsabilidade fiscal cede lugar à farra da gastança. Para mudar esse quadro a Lei Eleitoral passou a proibir o aumento do teto de gastos do governo em ano de eleições.
Nos últimos anos, o motorista brasileiro pagou os maiores preços pelo combustível, os programas sociais e de transferência de renda foram reduzidos drasticamente, a cesta básica disparou e a população mais carente foi praticamente esquecida. Durante o ápice da crise sanitária, o auxílio emergencial só foi concedido após grande mobilização do Congresso e da imprensa e até o Bolsa Família, rebatizado de Auxílio Brasil, deixou de ser pago a milhões de brasileiros, graças à morosidade nas análises dos pedidos do benefício. Até o INSS, que deveria acolher o trabalhador em momentos de necessidade, deixou mais de 1,7 milhão sem benefício e sem resposta. A insatisfação popular aumentou.
Para mudar o cenário, da mesma forma que o marido agressor, surgiu um “carinho” em forma de um pacotão, conhecido por PEC Kamikaze, depois PEC das Bondades, PEC dos Combustíveis, PEC dos Bilhões ou PEC do Estado de Emergência. A desfaçatez foi tamanha que previram as “bondades” apenas até o dia 31 de dezembro. Agora o discurso é de um governo que pensa nos pobres, quando na verdade sempre fez questão de excluí-los.
As vítimas de violência doméstica devem acionar imediatamente os canais competentes, incluindo o disque 160, a guarda civil, a polícia militar, a polícia civil, a assistência social, enfim, toda a rede protetiva e de apoio. Já os eleitores, vítimas da violência ou incompetência governamental, precisam esperar até o dia 2 de outubro para tomarem uma atitude transformadora e, por mais que amem os governantes de plantão, precisam decidir se promovem a mudança tão necessária ou continuam apanhando mais quatro anos.