As repecussões da Guerra Russa-Ucrânia, um foco multipolar
O ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergei Lavrov desloca-se desta vez, numa turnê africana visando os quatro países, Egito, República Democrática do Congo, Uganda e Etiópia, com o objetivo de mobilizar o apoio de seu país, fortalecendo a sua posição à luz das sanções ocidentais sem precedentes impostas, devido à guerra contra a Ucrânia.
Paralelamente com a turnê do presidente francês Emmanuel Macron, visando os Camarões, Benin e Guiné-Bissau, isso veio num momento em que a influência da França, antiga potência colonial, conheceu um certo declínio, sobretudo nos setores econômicos e comerciais.
Enquanto isso, o enviado especial dos EUA realizou uma visita ao Chifre da África, além do Egito, Emirados Árabes Unidos e Etiópia, a razão disso foi buscar meios face às repercussões da guerra russa na Ucrânia.
Considerando que a União Africana tem preservado uma posição neutra em relação a esta crise desde o início da guerra no final de fevereiro.
Em março, foram 17 países africanos que se abstiveram de votar a resolução da ONU, condenando a Rússia nesta guerra.
Sabe-se que vários países do continente africano dependem das exportações de trigo da Rússia e Ucrânia.
Lembrando, também que o jornal britânico “The Guardian” considerou a turnê de Lavrov para África veio no sentido de cortejar este continente diante da guerra na Ucrânia que já entra no seu sexto mês, resultado assistir a recusa de muitos dirigentes africanos em condenar a “invasão” russa, acusando os Estados Unidos Estados e OTAN iniciar ou prolongar este conflito armado.
O sofrimento de centenas de milhões de pessoas no continente africano foi devido aos altos preços dos alimentos, além de enfrentamento da severa escassez de alguns bens provenientes da Rússia e Ucrânia, diante da presença de dezenas de milhões de toneladas de grãos retidos nos portos ucranianos, agravando a situação dos povos africanos sem outros meios ou cadeias de suprimentos.
Para o Jornal Guardian, Sr Lavrov foi para a África com o objetivo de persuadir seus líderes, sustentando a opinião que Moscou não pode ser culpada pelo conflito ou pela crise alimentar.
Lavrov considerou que o "caminho independente" dos países africanos é de recusar a se juntar às sanções ocidentais contra a Rússia, denunciando "as tentativas ocultas dos Estados Unidos e seus seguidores europeus de impor uma ordem mundial unipolar".
Por sua vez, o jornal americano “The Wall Street Journal” sublinhou que os alimentos “tornaram-se a nova arma estratégica de Putin”, “à luz da capacidade de suas forças controlar as exportações de grãos ucranianos, cujo líder russo tem encontrado esta nova estratégia para exercer sua influência sobre todo mundo".
Embora a invasão tenha unido o Ocidente para apoiar a Ucrânia, a Rússia usou sua influência nas exportações de alimentos para dividir a comunidade internacional, expandindo sua influência sobre as economias do Oriente Médio, África e Ásia, dividindo assim o mundo de maneiras impressionantes, nunca tendo sido desde a Guerra Fria . .
As autoridades ocidentais consideram que "os objetivos do Kremlin não se limitam portanto aos alimentos, mas as preocupações de como aliviar sanções, obter concessões, cessar-fogo e construir alavancagem comercial".
“Durante anos, o presidente russo tem utilizado a energia como arma, o petróleo e gás natural como meio para recuperar a influência perdida, com o colapso da União Soviética.
As autoridades russas não hesitaram em exibir seu crescente poder nesse campo, indo até contrariar os acordos para com a missão na Ucrânia.
As preocupações dos diplomatas americanos sobre a eficácia da “estratégia geopolítica russa”, levou os presidentes africanos e do Oriente Médio a enfatizar as relações estreitas com a Rússia nas últimas semanas, “uma mudança de comportamento, em razão do motivo da invasão”.
Para Caitlin Welch, ex-funcionária de alimentos do Departamento de Estado dos EUA, considera que “é possível que os países do norte da África e do Oriente Médio mantenham-se dependentes da Rússia, apesar de algumas importações da Ucrânia, por motivo da estabilidade política e social”.
Esta luta pela influência na África não se limitou à Rússia e ao Ocidente, uma vez que a China tem tentado a algum tempo estabelecer sua presença neste continente.
Para o jornal americano “New York Times”: “À medida que as suas relações com os Estados Unidos e a Europa se deterioram, a China mantém seus esforços diplomáticos em toda a África, financiando projetos e incentivando os governos face ao crescente modelo chines”,
A China já domina o comércio com países ricos em recursos no continente africano, cuja presença de sua primeira base naval no exterior em Djibuti. “além de exercer esforços financeiros e diplomáticos, mediando os conflitos civis, aqueles que causam a fome devastadora, propondo novas estratégias em como liquidar bilhões de dólares a título de empréstimos vencidos”.
Tal abordagem chinesa faz parte de uma grande concorrência geopolítica entre Pequim e Washington, intensificada no início da guerra na Ucrânia.
O volume de comércio entre a China e a África ultrapassou 250 bilhões de dólares em 2021, comparado a 64,33 bilhões de US$ entre os Estados Unidos e a África.
Finalmente, trata-se deste paradoxo na África, pobreza e riqueza, o continente mantido entre os dois fardos, considerado o mais afetado pela guerra russo-ucraniana, cujas repercussões afetam o povo carente em termos do perigos de sobrevivência, cujas fome e miséria, transformadas em foco de atenção internacional multipolar.
Lahcen EL MOUTAQI
Pesquisador universitário-Marrocos