O Talibã do Brasil
Nesta última semana, após a retirada das forças ocidentais do Afeganistão e da retomada do país pelo Talibã, viralizaram na web charges compelindo os antidemocratas do Brasil a se mudarem para o país asiático. Em geral, as charges dizem assim: “Você não quer um país misógino, homofóbico, sem urnas eletrônicas, sem direitos humanos, sem STF, sem congresso, armado até os dentes e tudo em nome de Deus? Então vá para o Afeganistão do Talibã.”
Como fazem as boas charges, estas dizem com humor e picardia o que é do domínio popular. O Afeganistão dominado pelo Talibã retrata bem o que seria o Brasil dominado pelos apoiadores do desgoverno que atordoa o país com bravatas diárias sobre impedimento de ministros do STF, calúnias sobre urnas e eleições, armamento dos mais ensandecidos, desqualificação das mulheres, dos jornais, dos adversários políticos, da democracia, apologia a torturadores e à chacina de opositores, negação da gravidade da pandemia e dos protocolos de como enfrentá-la... Tudo isso em nome de Deus e da pátria.
Mas há uma despercebida diferença entre o Talibã e os radicais brasileiros. Com toda sua injustificável barbárie, os extremistas afegãos são patriotas; acreditam que lutam pela liberdade e emancipação de seu país. Nem isso temos no Brasil. Aqui, nosso dirigente máximo bateu continência para a listrada e estrelada Old Glory, lambeu as botas do ensandecido estadunidense Trump, que incitou à invasão do Capitólio e quase iniciou uma guerra civil nos EUA. E tudo que se faz hoje no Brasil de política econômica e social é voltado para perpetuar nosso país como servil colônia, exportadora de matérias primas baratas e importadora de produtos industrializados valorizados. E sempre mantendo um vasto contingente de desempregados; para desencorajar as lutas, dos que ainda têm emprego, por melhores salários e condições de trabalho.
Ou seja, nossos ultrarradicais de direita têm todos os defeitos do Talibã, mas não têm o que talvez seja sua única virtude: o sonho de liberdade, de autonomia, de pátria emancipada dos grilhões dos impérios que não hesitam em fazer a guerra, corromper governos, eleger e armar tiranos, invadir, destruir e desorganizar países e depois abandoná-los à sua própria sorte. Foi assim na Líbia, no Iraque, no Afeganistão. Foi assim na Coréia, que acabou dividida. Não foi assim no Vietnã, que escorraçou os invasores. Tem se tentado assim contra o Irã, Cuba, Venezuela, que resistem, a duras penas. Com o Brasil tem sido fácil, não foi necessário um contingente militar nem bloqueio econômico. Bastou um juiz ímprobo e um governo marionete, eleito graças às fake news e a uma duvidosa facada.
Que acerto das charges que convidam os ultrarradicais brasileiros a se mudarem para o Afeganistão do Talibã! Lá encontrariam campo fértil para extravasar seu insano fanatismo. Mas talvez tivessem que aprender algo que lhes falta: o verdadeiro apreço pela pátria, soberana, livre das garras dos impérios que nos exploram desde que viemos a ser denominados Brasil.