Seis em 2020: efervescência democrática

Nesse pleito, o décimo da história de Charqueadas, apresentaram-se seis candidaturas à prefeitura de Charqueadas. São elas, por ordem alfabética, de acordo com o nome registrado na Justiça Eleitoral: Davi Gilmar (PL 22), Doutor Antônio (PV 43), Dra Rosângela Dornelles (PT 13), Prof. Mano Nick (PSol 50), Ricardo Vargas (REPUBLICANOS 10) e Simon Heberle (PDT 12). Só em 1982, na primeira eleição após a emancipação do município, tivemos um número maior de candidatos, nove. Isso, ao meu ver, indica um momento positivo para a democracia local.

A eleição de 1982 teve um sistema diferente do atual, visto que havia voto de legenda na majoritária, com cada partido podendo apresentar mais do que uma candidatura. O vencedor seria o candidato nominalmente mais votado da legenda que somasse mais votos, ou seja, no caso específico, foi o PMDB, onde as três candidaturas somadas fizeram votação superior as outras - 3.457 -, elegendo Anápio Ferreira prefeito com 1.631 votos, mesmo com Aldo Moreira (PDS) sendo o candidato nominalmente mais votado naquela eleição, com 2.408 votos - a ledenda pedessista somou 2.828. Os nove candidatos, pela ordem de colocação na disputa, foram: PMDB - Anápio Ferreira, Mareu Soares (1.394) e Afonsina Lague (432); PDS - Aldo Moreira e Waldemar Gauss (420); PDT - Sérgio Peres (876), Jairo Dornelles (639) e Sadi Lacerda (124); e PT - Sabino Garcia (58).

Em 1988 o sistema passou a ser o atual, com cada partido apresentando apenas uma candidatura e vencendo a mais votada. Foram quatro candidatos: Aldo Moreira PDT (4.981), José Manoel PMDB (4.274), Geraldo Theisen PFL (1.289) e Paulo Augusto Costa PT (235). Na disputa seguinte, em 1992, foram três: José Manoel PMDB (6.873), Anápio Ferreira PTB (5.479) e Luis Paim PT (1.003). Em 1996, novamente três: Jaime Guedes PT (5.553), Anápio Ferreira PTB (5.285) e Aldo Moreira PMDB (3.989). Em 2000, quatro: Anápio Ferreira PTB (8.328), Jaime Guedes PT (7.605), José Abrahão PSB (438) e Fausto Elias PPB (390). Em 2004, apenas duas: Jaime Guedes PT (9.638) e Anápio Ferreira PTB (8.670). Na eleição de 2008, três: Davi Gilmar PDT (9.150), Anápio Ferreira PTB (7.508) e Dega Tassoni PT (2.555). Na penúltima eleição, em 2012, somente duas: Davi Gilmar PDT (13.784) e Anápio Ferreira PTB (6.366). No último pleito, em 2016, foram três postulantes ao cargo de prefeito de Charqueadas: Simon Souza PDT (8.494), Ricardo Vargas REDE (8.295) e José Abrahão PSB (2.825).

Mas não é apenas a quantidade de candidaturas ao Executivo o que torna únicas as eleições de 1982 e 2020 em Charqueadas. Em termos gerais, a primeira aconteceu durante a abertura política posterior ao regime militar, que desembocaria na Constituição Cidadã de 1988 e nas eleições presidenciais de 1989. Hoje, parece que o Brasil deu um passo atrás, pois vivemos um governo de extrema-direita notoriamente oriundo e apreciador do regime de 1964, por um lado, e uma revisão de matiz neoliberal tanto da Era Vargas (reformas trabalhista e previdenciária) quanto dos valores espressos pela Constituição de 88, tidos por alguns como obsoletos e ultrapassados. É um momento completamente diferente, quase antagônico, vê-se.

E some-se a isso a pandemia, uma característica inédita em quase um século na política nacional, tensionando os brasileiros, gaúchos e charqueadenses ante a ruína da economia e, principalmente e sobretudo, ante a ruína da vida, para a qual não há possibilidade recuperação após a perda. A última vez que isso ocorreu no Brasil e no mundo foi em 1918, ao fim da Iª Guerra, com a Gripe Espanhola, iniciada nos Estados Unidos no último ano daquele conflito. E isso, óbivamente, influencia o pleito local. O modo de fazer política em Charqueadss se caracteriza por uma intensa participação popular, onde um grande número de pessoas assiste às atividades de campanha de rua, principalmente os comícios. Pois esse foi exatamente o ponto mais afetado pela pandemia, devido ao risco de espalhamento viral decorrente da aglomeração de pessoas. O palanque virtual, está-se vendo, não substitui satisfatoriamente o palanque real na mobilização da comunidade durante o período eleitoral. Todavia, temos iniciativas como as entrevistas dos candidatos realizados pelo CDL/Portal de Notícias/Aconteceu em Charqueadas, onde pudemos vê-los discorrer sobre suas propostas e concepções frente às questões locais: Como enfrentar a pandemia e evitar mortes? Como dinamizar a economia e atrair investimentos? O que fazer pela Saúde? Pela Educação? Pela Segurança? Pela Cultura? Pelo rio? E é aqui, nessa esfervescência democrática que o número de candidaturas indica (1), mesmo ante a supressão da tradicional mobilização político-eleitoral urbana, que vejo o lado positivo de termos seis postulantes ao comando do Executivo Municipal esse ano.

Isso revela que as pessoas estão interessadas pelas questões da cidade como há muito não se via, é isso é sintoma de vitalidade democrática que se manifesta em nossa classe política, pela qual reverbera perceptivelmente tal disposição. Assim como em 1982 e agora em 2020, vemos que conjunturas nacionais diferenciadas geram uma mobilização social e política maior, mais ampla, devido ao interesse desperto pelas questões nacionais que repercutem nas demandas municipais. No caso particular charqueadense, o município, que há 38 anos nascia sob o signo daquela conjuntura de final dos anos 1970 e início dos 1980, agora é desafiado a encontrar o seu caminho num momento ideologicamente diverso e demonstra vitalidade política para tal.

Com isso ganha a cidade, ganham os cidadãos e ganha o exercício da cidadania e da democracia. Aguardemos o resultados das urnas, daqui a menos de duas semanas.



Nota:
(1) - O crescimento do número de candidaturas para a Câmara de Vereadores pode não possuir relação com essa efervescência democrática, visto que é ocasionada, a princípio, pela vigência da Emenda Constitucional 97/2017, que proíbe a celebração de coligações partidárias para as eleições legislativas.



Texto Publicado na seção de colunistas no site do jornal Portal de Notícias: https://www.portaldenoticias.com.br/colunista/53/cronicas-artigos-joao-adolfo-guerreiro/