REFORMA ADMINISTRATIVA


Que a estrutura do serviço público brasileiro é ineficiente, paquidérmica e contaminada por interesses políticos inconfessáveis, todo mundo sabe. O termo “servidor público” é uma ironia cruel que se pratica contra um povo que mal sabe dos seus direitos quando entra em uma repartição para reivindicar algum benefício, que por lei já deveria ser-lhe concedido automaticamente, sem precisar do carimbo de ninguém. Boa parte dos “servidores públicos” serve mais a quem o indicou para o cargo do que ao público que, de fato, lhes paga o salário.
A burocracia estatal, que justifica e sedimenta a ineficiência do serviço público no Brasil é um vício entranhado no estado brasileiro desde a colônia. Foi trazido por Tomé de Souza quando implantou as chamadas capitanias hereditárias.  Estas nada mais eram que feudos concedidos aos amigos e compadres do rei, ou concessões compradas por cidadãos abastados da metrópole, que se comprometiam a explorar as terras concedidas, pagando as talhas, corvéias e contribuições que o soberano exigia em troca. Os concessionários das capitanias, por sua vez, faziam seus acólitos, distribuindo suas próprias concessões, em troca de uma parcela dos lucros de exploração. Assim se criou uma casta de exploradores do serviço público, que sobrevive até hoje, malgrado todas as mudanças que o estado brasileiro sofreu ao longo da sua história.
Essa exploração se dá principalmente por conta da influência política que ainda hoje é o principal norteador da distribuição dos cargos no serviço público brasileiro. Embora a maioria deles seja hoje provida através de concurso público, engana-se quem pensa que esses servidores estejam a salvo do pôquer político que é jogado nos bastidores das repartições. Muitas vezes, funcionários competentes e bem preparados, com currículos invejáveis, são colocados em ocupações subalternas apenas por não comungarem com as ideologias professadas por seus chefes (quase sempre indicados por um político), ou por não aceitarem imposições que contrariam seus valores.
Por tudo isso seria muito bem-vinda uma proposta de reforma administrativa. Uma reforma que mexesse no imenso cardápio de benefícios e privilégios de uma classe que se apoderou do estado seria fundamental para o conceito de justiça social que deveria estar na base da distribuição da renda do trabalho. Nada justifica o imenso fosso que existe entre a remuneração que se paga aos trabalhadores da iniciativa privada e os funcionários públicos, principalmente os de alto coturno, que tem amigos no poder.  Mas que seja uma verdadeira reforma e não apenas mais um engodo eleitoral. Tem que ser uma reforma que valorize o verdadeiro servidor público e não apenas o amigo de quem tem o poder.
Que não sejamos mais uma vez enganados. Nenhuma reforma desse tipo será verdadeiramente justa se não atingir os verdadeiros marajás do funcionalismo público que estão principalmente no judiciário, no legislativo e nos altos escalões do executivo. Protegidos pelo escudo que lhes dá a Constituição, ao que parece, esses nada sofrerão com a reforma proposta. Assim, se não houver coragem e espírito público por parte dos nossos legisladores para botar a mão nesse vespeiro, essa será apenas mais uma cantilena para acalmar a boiada.