A verdade 50 anos atrasada
O Le Monde Diplomatique de 11 de setembro de 2007 traz uma reportagem perturbadora (https://diplomatique.org.br/o-golpe-da-cia-contra-o-ira/). Ela analisa matéria do New York Times de junho de 2000, revelando relatório secreto da CIA sobre a participação dessa Agência no golpe que derrubou o primeiro-ministro iraniano Mohammed Mossadeg em 1953, quase cinquenta anos antes.
Mossadegh apoiava a nacionalização da indústria petrolífera, então dominada pelos britânicos, e a democratização do sistema político. Os EUA alegaram temer que esses fossem sinais de que o Irã estaria prestes a passar para trás da Cortina de Ferro, e decidiram derrubar Mossadegh.
O relatório teria sido propositalmente vazado no ano de 2000, supostamente como estratégia de reaproximação entre EUA e Irã, iniciativa apoiada pela então secretária de Estado Madeleine Albright. Isso foi antes do atentado de 11 de setembro de 2001, que mudaria tudo. O que o relatório revela sobre como a CIA agiu para derrubar Mossadeg em 1953 é surpreendente: propaganda e atividades políticas clandestinas; cooptação de rede de oficiais do exército para um golpe; suborno de parlamentares iranianos; pressões para persuadir o xá Reza Pahlevi a apoiar o golpe; manipulação de manifestações de protesto pela renúncia de Mossadegh.
Foram milhões de dólares gastos pelo ramo iraniano da CIA, comandado por Kermit Roosevelt, para a consecução do golpe. Ele falhou num primeiro momento, mas acabou sendo bem-sucedido graças a subsequentes grandes manifestações de rua e atentados simulados contra religiosos, ambos organizados por infiltrados a serviço da CIA, que se faziam passar por membros do Tudeh, o “Partido das Massas”, o mais importante partido de esquerda no Irã à época.
Em seu livro “Novas confissões de um assassino econômico” (Cultrix, 2018), John Perkins mostra que o golpe no Irã em 1953 foi um aprendizado para a CIA. O fracasso inicial revelou o envolvimento da Agência, e obrigou os EUA a chamar Kermit Roosevelt de volta ao país. Desde então, golpes semelhantes perpetrados em outros países do mundo passaram a ser cometidos pelos assassinos econômicos, ou, no insucesso destes, os chacais, os assassinos de fato. Podemos supor que estes tenham sido os responsáveis pelas mortes “acidentais”, no Brasil, de Juscelino Kubitschek, Ulysses Guimarães, Eduardo Campos e Teori Zavascki. Mais recentemente, os chacais humanos foram substituídos pelos drones, como o que assassinou o general iraniano Qassem Soleimani no início de 2020, no Iraque.
O golpe no Irã em 1953, a revelação do relatório secreto em 2000, a demonização dos partidos de esquerda no Brasil, as manifestações iniciadas no país em 2013, o golpe em 2016 e a ascensão de governos antidemocráticos empenhados na perpetuação do país como colônia reserva de mão de obra barata e exportadora de matérias-primas sem valor agregado nos revelam que os aprendizados da política externa dos EUA têm resultado em sucesso para a ambição hegemônica do Tio Sam.
Enquanto espalham corrupção, ditaduras, guerras e miséria pelo mundo.