IRRESPONSABILIDADE INTELECTUAL
Pawels e Bergier, em seu duvidoso tratado sobre a influência do ocultismo nas ciências positivas e na política (O Despertar dos Mágicos, 1956) referem-se à um dilema enfrentado por Hitler. O dilema se referia à tese que afirmava que a terra era oca. Essa tese foi proposta por um sujeito chamado John Cleves Symmes em 1818, e alcançou bastante repercussão, servindo inclusive de inspiração para o famoso clássico de Júlio Verne, Viagem ao Centro da Terra (1864). Os místicos amigos de Hitler aceitavam a possibilidade de que a terra fosse oca, mas os cientistas alemães simplesmente deploravam a idéia. Foi então que solicitaram sua arbitragem, pois com sua autoridade de Fuhrer, o que ele dissesse se afirmaria como verdade científica.
Hitler,ele mesmo, sujeito a místicas intuições, no entanto era também um político. E sua resposta foi que esse era um falso problema e que ambos podiam ter razão. Quando os inquisidores objetaram que seria incoerência não optar por uma ou outra tese, ele simplesmente respondeu: “Não temos qualquer necessidade de ser coerentes. “A coerência é um vício mortal”.
Lembrei-me desse bizarro episódio ao ver as discussões que se travam no governo e no Congresso sobre a reforma tributária e a volta da CPMF. Os políticos que ontem eram contra hoje são a favor. Quem era a favor agora é contra. E como são mestres em encontrar justificativas para qualquer absurdo que eles defendem, os discursos contra e a favor são absolutamente hilários.
O parâmetro que baliza as opiniões dos nossos deputados é senadores é um só: estar do lado do governo ou da oposição. Se estão com o governo tudo aquilo que eles condenaram quando estavam na oposição é certo; se estão na oposição, o que defenderam quando apoiavam o governo está errado.
Pessoalmente não vejo esse imposto como um mal em si. Na moderna estrutura que a nossa economia assumiu – movimentada essencialmente por transações digitais – ele seria bem mais eficiente em termos fiscais e econômicos do que a miríade de imposições tributárias que hoje incide sobre as relações de produção. Se for, como se propõe, um tributo para substituir todas as obrigações trabalhistas e previdenciárias que hoje as empresas têm que suportar para contratar um funcionário, então a proposta merece séria reflexão. Está mais que na hora de por alguma racionalidade neste nosso manicômio tributário.Especialmente a tributação sobre o fator trabalho, que é hoje o item que mais comprime o mercado do trabalho e encarece o produto final que todos nós consumimos.
Talvez Hitler tivesse razão ao dizer que coerência é vício. Isso, pelo menos em política parece ser uma verdade que se afirma mais do qualquer outra. O problema é que, quando um debate dessa magnitude e importância é feito sem nenhuma responsabilidade intelectual dos debatedores, tudo vira uma pendenga sem sentido. E com esse tipo de irresponsabilidade o país já sofreu demais.