O rei está nú: A vergonha do governo Bolsonaro.
Era uma vez um rei extremamente vaidoso. Sua vaidade era tanta, que ele utilizava uma roupa diferente para cada ocasião do dia. Ninguém poderia dizer que o rei estava a trabalhar, pois ele passava a maior parte do dia em frente ao espelho. Um dia foram contratados - pela Fundação Cultural do Reino - vários curadores e artistas, e entre eles dois que apresentavam-se como estilistas-tecelões e que se gabavam de costurar os mais belos trajes com os mais belos tecidos que existiam. Estes homens propunham algo tentador: uma vestimenta tão bela, tão bela, que somente os verdadeiros, puros e virtuosos, poderiam enxergá-la. O rei - convencido de que poderia adquirir discernimento sobre os verdadeiros e falsos, assim como decidir quem não teria condições de ocupar cargos, e então, substituí-los - aceitou a proposta. O rei fez um adiantamento em moedas de ouro para os estilistas-tecelões. Eles receberam, além das moedas de ouro, rolos de linha de ouro, seda e outros materiais extremamente raros, exigidos por eles para a confecção das roupas. Contudo, eles guardaram todos os tesouros e ficaram em seu tear, fingindo tecer "fios invisíveis", que todas as pessoas alegavam ver, com o objetivo de não parecerem "estúpidas". Um dia o rei, que já estava cansado de esperar pela produção de sua vestimenta, decidiu ver o progresso dos "estilistas-tecelões".
- Que linda vestimenta! Vós fizestes um trabalho magnífico - disse o rei (mesmo não enxergando nada além da mesa).
Os nobres - assim como o rei fizera - demonstraram espanto pelo trabalho dos "estilistas-tecelões", mesmo sem enxergar nada - também não queriam parecer estúpidos. O rei marcou uma data específica para a exibição de sua vestimenta especial. Quando chegou o grande dia, o rei saiu todo pomposo desfilando pela rua, e todos à sua volta notaram que ele estava nu, mas ninguém ousou mencionar esse fato. De repente, um menino grita:
-"O rei está nu"
Todos concluíram que, se uma criança, com toda sua pureza, inocência e demais qualidades que só uma criança poderia ter, não contemplava o vestido do monarca, ele realmente estava exposto em suas vergonhas, portanto, em alto e bom som, todos repetiram:
- O Rei está nu! O Rei está nu
Depois de todo esse vexame que passou o rei, ele voltou ao Castelo Real de onde nunca mais saiu. Contudo , como ocorre na maioria das vezes, uma semana depois o povo já havia esquecido o escândalo, enquanto os funcionários do reino seguiam como se nada houvesse acontecido: Os cargos continuavam a ser distribuídos às mesmas famílias; os impostos sonegados; o desvio de verbas não parou, por fim, tudo voltou à normalidade.
Bolsonaro está nú
O conto de Kejserens nye klæder não poderia ser mais atual. Não estamos falando de um monarca, é claro, mas falamos de um presidente igualmente vaidoso, no sentido de acreditar ser adorado por todo o "povo". Diferente do rei, Bolsonaro não usa uma roupa diferente para cada ocasião do dia, mas ele arruma uma forma diferente de aparecer nas manifestações: um dia de helicóptero, andando a cavalo ou simplesmente desfilando para sua pequena parcela de adoradores que ainda lhe restam. Ocorre que esse presidente - assim como o rei - não poderia estar mais enganado sobre sua popularidade, assim como apontam pesquisas recentes. Segundo o data folha, uma pesquisa feita nos dias 25 e 26 mostrou que 43% dos brasileiros consideravam o governo ruim ou péssimo, 33% ótimo ou bom, 22%, regular e 2% não sabiam. Além disso, movimentos como "somos 70%" - uma clara alusão à quantidade de pessoas que não apoiam o governo - que mensura de forma mais ampla o número de insatisfeitos, vêm crescendo cada vez mais, principalmente nesse período de pandemia. Parece ter fugido da memória do presidente suas negociações com o centrão, coisa que repudiou durante toda sua campanha eleitoral, inclusive mencionando que tal ato interferia no livre exercício do poder legislativo. Contudo, o medo de perder o poder lhe deixou apavorado, o presidente segue consolidando uma base de apoio com o centrão, inclusive com alguns condenados pela operação lava jato, com é o caso do famoso Arthur Lira. A imoralidade bateu à porta, e o presidente não se furtou em abrir, prossegue pisando em suas promessas de campanha. Entretanto, os seus apoiadores continuam ali: fiéis ao seu rei tolo, eles precisam adorá-lo aos domingos, eles temem dizer ao ser rei que ele está "nú". É incrível a semelhança entre o petismo e o bolsonarismo; todos temem ser taxados de estúpidos, por isso fingem enxergar uma vestimenta no presidente, a vestimenta da virtude. Como se o presidente, assim como havia prometido na campanha, seguisse com seu compromisso em nomear ministros técnicos. Não era o que o rei desejava: saber quem está apto às cadeiras governamentais? Não foi o que o presidente prometeu? Qual o critério ele utilizou para nomear o genro do Silvio Santos para o ministério que acabou criar? O presidente, que repudiou o PT durante toda campanha, nomeou um indivíduo que declarou, publicamente, seu voto à Dilma. Ademais, o presidente não diminuiu o número de ministérios, ele aumentou e, se já não fosse o bastante, está leiloando cargos entre o centrão. Por enquanto, todos os contemplados com os novos cargos estão defendendo o governo; condecorando o presidente, confeccionando sua vestimenta especial. O presidente, assim como o rei, está pagando adiantado, mas quando chegar o momento certo, como sempre fez, o centrão lhe trairá - assim como já traiu outros presidentes. Mas é provável que essa base mais fanática continue como está agora, fingindo espanto, dizendo: "Que vestimenta maravilhosa"!
Não sabe o presidente o quão vergonhoso tem sido sua postura perante essa crise pandêmica? Chegou até mesmo a omitir dados relacionados à covid-19. Os idólatras e os nobres, é claro, permaneceram admirando suas atitudes. Se Bolsonaro pudesse olhar para o espelho que reflete o seu governo, não sua parcela adoradora, mas todo o povo que ele deveria governar - mesmo os que não o apoiam-, mas sua vaidade é tamanha, que é preferível fingir que o Brasil é composto apenas pelo seu eleitorado. O rei está nú, e o governo é extremamente vergonhoso, sua cegueira e desejo de seguir no poder é maior. Enquanto isso, no meio dessa parcela de "virtuosos", existe um grupo de "crianças" que está gritando: Vejam, Vejam, o rei está nú. Contudo, diferente do conto de Kejserens nye klæder, eles fingem não ouvir, eles acreditam, de fato, que existe uma vestimenta especial, algo diferente, virtuoso, admirável nesse governo - os estilistas-tecelões trabalharam muito bem. Apesar disso, a queda do governo parece realmente inevitável - se não for agora, será daqui a quatro anos. Resta saber se o rei ficará trancado ao reconhecer toda sua vergonha, ou será ainda arriscará uma reeleição - isso se ele não cair antes. É certo que boa parte do conto de Kejserens nye klæder, já está em curso, especialmente o final: a velha política não foi embora, continua ai, o toma lá, da cá foi revigorado, os cargos distribuídos às mesmas pessoas, por fim, tudo voltou à normalidade. Rei tolo: está nú, e não é capaz de enxergar