MARCÃO DO POVO E A IRRESPONSABILIDADE SEM LIMITES
Nos últimos anos, as redes sociais têm sido um vasto campo para a proliferação das mais absurdas ideias e opiniões, passando por preconceito, racismo, homofobia, desobediência civil e outros crimes. Quando, porém, estas ideias passam a ser emitidas em programas de televisão, as coisas podem tomar rumos imprevisíveis. Emissoras de televisão, assim como as de rádio, são concessões públicas e devem, no mínimo, ter um código de ética, respeitando as pessoas que estão do outro lado da telinha. O "apresentador" Marcão do Povo, em seu programa do SBT propôs o que, na sua opinião, poderia ser a solução para os problemas decorrentes da pandemia do coronavírus, em nosso país. Para ele, "os pacientes poderiam ser colocados em campos de concentração, sob cuidados médicos, liberando o restante da população para trabalhar". Isso também evitaria "espalhar dinheiro para os estados". O agravante da fala de Marcão é que ele apresenta sua "ideia" dirigindo-se diretamente ao Presidente da República. Como num bate-papo informal, ele pede a interferência do exército, marinha e aeronáutica para a execução da proposta, que ele chama de "dica". Em seguida, prega a desobediência civil, ao dizer, sem constrangimento, "dá (???) um decreto aí, presidente, põe o exército na rua e prende o governador que descumprir a ordem (de segregar as pessoas nos campos de concentração)". E termina a conversa, talvez influenciado pela intimidade que o dono da emissora tem com o mandatário da nação, com a frase "é uma ideia que o presidente pode acatar ou não". Talvez, dentro de sua ignorância, Marcão não saiba exatamente o significado de "campos de concentração" e não tenha tido a noção do que estava falando. Mais do que propor uma solução, suas palavras visavam mostrar que ele concordava com a opinião de Bolsonaro, com relação a segregar o chamado "grupo de risco" e desobedecer às ordens de governadores e prefeitos. Infelizmente, na guerra pela audiência, certas emissoras têm investido, cada vez mais, em apresentadores que "falam a língua do povo", o que, muitas vezes significa falar asneiras em rede nacional. O SBT já emitiu uma nota dizendo que não concorda com a fala do apresentador e que vai suspendê-lo. É pouco. Deveria demiti-lo por justa causa e repensar sua estratégia de tentar agradar ao governo, com pareceres e opiniões de apresentadores "chapa branca". Silvio Santos já afirmou que, na sua emissora, jornalista não tem liberdade para emitir opinião própria, apenas para dar notícias. Não é bem assim. Ao aceitar um convite para assistir ao desfile da Independência no palanque presidencial, o dono da segunda maior rede de televisão do país já disse de que lado está. Não são proibidas opiniões próprias, desde que favoráveis ao governo. Resta saber o que fará o ministério público. A suspensão da emissora por algumas horas e uma multa seriam boas alternativas. A liberdade de imprensa não deve superar o bom senso e o respeito. Da Procuradoria Geral da República e do ministro Pontes, porém, não devemos esperar nenhuma atitude, afinal Marcão trabalha no SBT e não "naquela emissora".