Esquerda ou direita?

Eu queria escrever um poema sobre o tema “direita e esquerda”, já que estamos em um contexto no qual acirrou-se o embate entre as ideias e interesses políticos desses dois grupos. Muitas vezes, sendo considerado como um conflito entre o bem e o mal. Inclusive, frequentemente, usa-se o termo “esquerdista” como um xingamento por associar-se a esquerda ao PT e, consequentemente, ao mal. O termo também já virou sinônimo de comunista, o que também é usado de forma pejorativa e equivocada pelas pessoas, por conta dos péssimos exemplos que temos dos países que deturparam essa doutrina. O certo é que tivemos maus-exemplos, tanto da “direita” quanto da “esquerda”, de pessoas que, ao chegaram ao poder, cometeram muitos crimes contra os direitos humanos em prol do interesse próprio.

Havia pensado em começar o poema assim: “nem direita, nem esquerda”, apesar de ser simpatizante das ideias humanitárias, de liberdade, igualdade e solidariedade, as quais, inclusive, são pilares de nossa Constituição Federal de 1988, mas que são associadas à esquerda, como se fossem sentimentos e ideias negativos. Ouvi muito, durante as últimas campanhas presidenciais, pessoas fazendo campanhas contrárias aos direitos humanos.

No entanto, antes de iniciar o poema resolvi fazer uma pequena pesquisa, pois acredito que devamos sempre pesquisar antes de escrever sobre qualquer tema para não cometermos equívocos e evitarmos problemas futuros. Então, o objetivo de minha pesquisa foram dois: observar se não estaria cometendo plágio; e conhecer um pouco mais sobre a origem desses termos.

Para minha decepção, encontrei várias frases de efeito iniciadas com “nem direita, nem esquerda”. Assim como encontrei vários artigos criticando esse tipo de frase por ser falaciosa. Um deles, foi o artigo intitulado “Três motivos para não dizer ‘nem direita, nem esquerda’” (2013), do Doutor em filosofia Rodrigo Guimarães Nunes, o qual foi um soco certeiro no meu estômago. Sua tese é a de que a frase é “um engano tático”, pois nega a existência de divisões dentro da sociedade, ao afirmar que não se tem alternativa. Tal frase, acaba por eximir as pessoas de quererem lutar por mudanças sociais, por acreditarem que a mudança resultará fatalmente em desastre. O pessimismo dessa frase faz com que nos prendamos aos horrores causados por grupos de pessoas que distorceram ideais nobres de justiça em favor de interesses próprios, os ditadores (direitistas e esquerdistas) são exemplos claros disso.

Ao ler o artigo, lembrei de um professor da universidade, o qual nos disse uma vez que não há neutralidade, sempre estamos de um lado. E citou o exemplo de uma briga de casal em que um homem bate na mulher e, por considerarmos que isso não nos diz respeito (pois “em briga de marido e mulher não se mete a colher”), não nos metemos. Nesse momento, de “neutralidade”, estaríamos, na verdade, assumindo um lado: o do homem. Assim, quando nos eximimos de escolher, estamos assumindo o lado do mais forte, do que está no poder, que quase sempre não está do lado das minorias.

Assim como a crença na neutralidade é prejudicial, a crença em verdades absolutas (o extremismo) também o é, seja ela de direita ou de esquerda. Esse tipo de crença extremista fere direitos de muitos em prol de privilégios de poucos. Além disso, Faz com que não se meçam esforços para que prevaleçam a vontade de quem está no poder, levando-o até as atitudes mais extremas de violência, como o assassinato. Não preciso nem citar o Nazismo, pois todos conhecemos essa triste história da humanidade.

Atualmente, vemos um pequeno grupo de pessoas que usam as redes sociais para mentir e disseminar o ódio, em defesa da família, da religião e da nação. No entanto, vão de encontro a dois dos principais preceitos bíblicos: a abominação à mentira (Pv 12: 22) e aos que promovem a contenda (Pv 6: 16-19). E o que dizer de um dos principais mandamentos: amor ao próximo? Acreditam que o pai das fake news é, na verdade, o “Messias” e que são o povo escolhido. Os mesmos que se dizem contra a corrupção, os “dois pesos” e as “duas medidas” (Dt 25: 13-16), são os que são a favor dos privilégios, do armamento, da pena de morte. E o que aconteceu com o “não matarás”? Esqueceram o que acontece com um reino dividido contra si mesmo? (Mt 12: 25) Não estão preocupados nem com a preservação da família tradicional (muitos deles, não foram fieis às respectivas companheiras e companheiros da mocidade, conforme diz Malaquias 2: 10-16; Já estão nos segundos, terceiros ou quartos casamentos; têm filhos bastardos; etc.), nem com a preservação do cristianismo (até porque, segundo dados do IBGE 2010, mais de 80% dos brasileiros são cristãos, inclusive esquerdistas e comunistas), tampouco com a nação, pois estão loucos por uma guerra civil.

Não são fanáticos religiosos, são, na verdade, fanáticos por dinheiro, por Mamom (Mateus 6: 24). Estão desesperados achando que seus bens materiais serão despojados e distribuídos ao povo pelos comunistas, pois entendem que o termo “justiça social” significa perda de privilégios e de seus bens. Não sabem o que é comunismo, nem nunca leram a Bíblia. Nunca leram Lucas (3: 10-12), Ezequiel (18: 7), Efésios (4: 28), entre outras passagens que falam sobre justiça e solidariedade. Se lessem ao menos o Novo Testamento, chamariam Jesus de comunista e rasgariam a própria Bíblia.

Percebi o porquê dessas pessoas temerem o comunismo no último dia 29 de março. Nesse dia, assisti pasma a três cenas de manifestantes anti-isolamento em uma tentativa de manifestação em Belém do Pará, a qual foi proibida por decreto do governo estadual, a fim de evitar o contágio pela doença mais temida da atualidade, a Covid 19. Os manifestantes frustrados em seus intentos ficaram indignados, porque, segundo eles, estavam sendo impedidos de exercer o direito de ir e vir e estavam sendo tratados como criminosos. Eles estavam descumprindo uma medida sanitária preventiva, prevista pelo Código Penal, arriscando, assim, a saúde pública e ferindo um dos principais direitos de todos, em favor dos próprios interesses. E, ainda assim, sentiram-se ofendidos por terem sido proibidos, sendo barrados por viaturas da Polícia Militar, Polícia Civil, do Corpo de Bombeiros, da Superintendência Executiva de Mobilidade Urbana de Belém (Semob) e do Departamento de Trânsito do Pará (Detran), que estavam cumprindo o decreto e seu papel social de defesa da população. Os próprios manifestantes se encarregaram de fazer vídeos para publicar em suas redes sociais “comunistas”.

A primeira cena, foi a de um rapaz revoltado por estar sendo tratado pela polícia militar como um bandido, o rapaz estava com o rosto coberto por uma máscara preta e dizia que o que estava acontecendo era “ditadura militar”. Lembro das campanhas presidenciais, momento em que se dizia que não houve Ditadura Militar no Brasil. E, agora, estamos vivendo em uma, porque um bando de riquinhos não foi atendido em seus desejos e vontades, como estão mal-acostumados. Nem imaginam o que é uma ditadura. Não observam a sua volta, a quantidade de venezuelanos espalhados pelas ruas de Belém, fugindo de perseguições e da fome, preferem estar nas ruas de outro país, do que ficar em seu país de origem.

A segunda cena foi a de um lunático gritando “Selva” de dentro de seu carro. Nunca lutou em uma guerra, nunca esteve em uma selva, nunca passou fome, nunca deu um tiro (seu maior sonho!). É apenas um frustrado, pois achava que a vida no exército seria uma aventura. Mas não foi. Por isso, está disposto a lutar até mesmo contra os próprios patrícios.

A terceira cena, foi a de uma dondoca que gravou um vídeo em seu Iphone, de dentro de seu carro, muito emocionada e revoltada, porque o “comunismo chegou”. Percebemos a ideia que essas pessoas fazem de comunismo. Comunismo seria uma mesma lei valendo para todos, o que é um absurdo para elas. A polícia tem que servir somente aos ricos, proteger apenas aos ricos. Ao sair às ruas para “lutar por seus direitos”, descobriu o que muitos professores já sabem: o que é sentir-se agredido. Porém, não levou bala de borracha, nem spray de pimenta nos olhos, como estamos habituados a ver. E os professores lutam, realmente, pelo bem comum, da categoria, dos alunos e da sociedade. Mas são considerados “vagabundos esquerdistas” (embora, muitos sejam de direita!). Então, merecem ser tratados como bandidos.

Ainda tem uma quarta cena, que saiu nos jornais: a do líder da carreata. Isso, claro, ele não fez questão de gravar para postar nas redes sociais, pois estava, desde 2015, com o licenciamento vencido e acumulava mais de R$22 mil reais em multa. Não querem ser tratados como infratores??? Patriotas que não pagam impostos??? Que não contribuem com o país???

O que descobri com minha pesquisa foi além do que buscava. Descobri que não quero fechar os olhos para isso tudo. Não quero fechar os olhos para as diferenças sociais. Não quero ser hipócrita. Não quero ser mentirosa. Não quero disseminar o ódio. Não quero nada disso. Descobri que entre seguir pela direita ou pela esquerda, prefiro a justiça social e os direitos humanos. Se isso é ser esquerdista, então prefiro ser esquerdista.

REFERÊNCIAS

NUNES, Rodrigo Guimarães. Três motivos para não dizer “nem direita, nem esquerda”: esse texto se dirige a quem diz essa frase de boa fé, na tentativa de convencê-los de que se trata de um engano tático. Revista Fórum, 2013. Disponível em: <https://revistaforum.com.br/noticias/tres-motivos-para-nao-dizer-nem-esquerda-nem-direita/> Acesso em: 30.03.2020.

BÍBLIA. In: Bíblia Sagrada Online. Disponível em <https://www.bibliaon.com/> Acesso em: 05.04.2020.

AZEVEDO, Reinaldo. O IBGE e a religião - cristãos são 86,8% do Brasil; católicos caem para 64,6%; evangélicos já são 22,2%. Veja: São Paulo, 18 de fevereiro de 2017. Disponível em: <https://veja.abril.com.br/blog/reinaldo/o-ibge-e-a-religiao-cristaos-sao-86-8-do-brasil-catolicos-caem-para-64-6-evangelicos-ja-sao-22-2/> Acesso em: 05.04.2020.

Adriane dos Santos
Enviado por Adriane dos Santos em 06/04/2020
Reeditado em 12/09/2022
Código do texto: T6908565
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