Alguns Motivos para não ler Olavo de Carvalho

Primeiro, conheça seus vídeos. Se o que ela fala for uma pequena amostra do que ele escreve e ela já apresenta problemas com falácias e falta de dados empíricos, o que imaginar de livros em que estas ideias são desenvolvidas?

Se seus livros permitem entender melhor estas ideias a ponto de percebermos bons argumento onde vemos falácia, talvez seus vídeos sejam pouco claros a respeito do que ele realmente pensa. Se estamos enganados, ao agir com boa-fé, é a pesquisa e a metodologia científica que estão enganadas! Mas por qual motivo? Simples, não há como acreditar ao mesmo tempo em pesquisa empírica e na escolástica de Olavo de Carvalho.

Tal conferencista, como ele gosta de se intitular, preza por um tipo de pensamento pré-científico, onde por meio do pensamento puro e idealização descobrimos as verdades sobre o mundo. "Conhece a ti mesmo e conhecerás o universo de Deus", me volto pra mim mesmo e ali encontro as ideias e formas de pensar que me revelarão o mundo...

A ciência moderna, lembrando de Galileu Galilei, tem como fundamento o experimento, o teste e a análise depurada de dados e informações sobre aquilo que se observa. Não que tais coisas nos resguardem de interpretações e valores na pesquisa, mas que tais interpretações e valores não são relevantes se não corresponderem a uma base empírica.

Quando Olavo crítica Einstein e Newton sem analisar os pressupostos e os dados com estes se debruçaram ou sem testar com alguma observação empírica suas teorias, ele simplesmente se utiliza de idealizações tomando o que estes cientistas defendiam como meras idealizações. O que qualquer um que conhece Física sabe que não é.

>>Por isto não recomendo Olavo a quem pretende carreira acadêmica em áreas científicas e de estudos empíricos.

É típico das inúmeras falas de Olavo de Carvalho chamar os graduados e professores universitários de analfabetos funcionais, além de desprezar o que produzimos hoje em termos de arte e ciência. Vou explicar o motivo.

Dificilmente um livro, baseado em uma pesquisa acadêmica, será tão "interessante" quanto as opiniões de Olavo de Carvalho que vão de medicina à Teoria da Relatividade. Isto pelo fato de que as palavras não podem ser manejadas para atrair público ou atacar adversários com tanta liberdade como a que tem aquele que não se sujeita a escrutínio de pares e metodologias de pesquisa.

Pesquisa acadêmica não é feita para atrair público e nem consiste em teorizações descompromissadas com fatos e dados empíricos. Não é show de retórica e nem consolo espiritual ou existencial. Pesquisadores sérios sabem que tratar de um assunto sem o devido referencial teórico e sem que o tema seja alvo de sua pesquisa, somente com amigos ou em situações informais - nunca a título de especialistas e autoridades no assunto.

A razão é simples: quando se defende uma tese ou se apresenta um estudo acadêmico, as conclusões e argumentos não tem por finalidade arrebanhar público, fazer frente a algum partido político ou produzir marketing. O objetivo é fazer com a pesquisa se sujeite a escrutínios metodológicos e teóricos, o que pode ser chato e sem sentido para aqueles não familiarizados com a dinâmica de pesquisa - isto acontece em qualquer universidade.

Ainda que possa ter linhas teóricas específicas e refratárias umas as outras, é preciso antes de disputar espaços com estes campos o trabalho empírico ou discussão com teses de outros pesquisadores - coisa que não vemos no trabalho de Olavo ou de seus seguidores. Vemos escracho e ridicularizarão, mas não discussão de teses.

Um trabalho acadêmico não sujeita suas conclusões a vontades e preferências de quem pesquisa. O que significa que os resultados só importam se o processo onde foram obtidos se submeter a metodologias claras e os dados com que se argumenta serem confiáveis. Coisas que não vejo em Olavo ou seus seguidores.

Um exemplo de um livro que leio sobre a Inconfidência Mineira, o autor apresenta diversas fontes documentais quando se trata de dados pouco conhecidos no meio acadêmico e apresenta tantos outros que corroboram com a tese que desenvolve. O que ele fala não desperta grandes paixões, não se modela a estes propósitos, mas a responder uma questão simples: a Inconfidência Mineira foi um evento isolado ou refletia uma insatisfação mais generalizada com a relação da elite local com a metrópole portuguesa?

Ele não vai responder conforme agrade, tenha "likes" ou seguidores em canais de vídeo, ele responde conforme os documentos permitem e as análises possíveis sejam feitas. E ainda assim, não pretende dar nada em definitivo e que vá além dos dados apresentados. Nada glamoroso né? Mas é muito mais confiável do que discursos inflamados e espetáculos de retórica. Os dados estão lá, as fontes, origens, quem quiser rebate-lo ou contestar sua interpretação, bom trabalho!

>> Também por isto não recomendo Olavo de Carvalho, a não ser a título de informação para quem tiver tempo, para aqueles que pretendem vida acadêmica.

Tenho visto em debates como da Gabriela Priori e direitistas diversos as seguintes diferenças: enquanto esta se resguarda para falar somente no que tem base jurídica e na apuração completa dos fatos, seus adversários se dão a liberdade de falar a partir de dados parciais e sem nenhuma referência conceitual clara - senso comum. Ainda assim, para a audiência pouco crítica há a impressão de que eles tem razão, para quem analisa um pouco melhor, é perceptível como ela procura o tempo todo falar com base no que conhece e não no que acha ou sente que é.

Para quem tem algum apreço pela pesquisa e investigação empírica, mesmo a jornalística e histórica, não recomendo Olavo de Carvalho.

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Se você se interessa em compreender no que constitui e perpetua as desigualdades sociais e injustiças do mundo, também não recomendo Olavo de Carvalho. A razão é simples, estas desigualdades se fundamentam hoje no sistema capitalista, qualquer tentativa de tornar o sistema mais igualitário é visto por ele e seus seguidores como comunismo. Se importar com este tipo de coisa para além da caridade de sinal de trânsito será visto, se forem bondosos, como socialista Fabiano.

E não se iludam, mesmo formas mais tímidas de socialismo são vistas por sua gente como potenciais comunistas ou "idiotas úteis" a serviço dos verdadeiros comunistas. Tomar o petismo e mesmo o PSDB como comunistas e colaboradores dos mesmos é bem o sintoma do que falei.

Se você for pobre e perceber que seus interesses de melhoria de vida são condicionados pelos interesses de quem não é pobre como você, Olavo não terá nada a te oferecer - talvez alguma religiosidade que te conforte com sua miséria e um intelectualismo que não lhe dará respostas para a realidade em que você vive.

Volto a dizer, não li nenhum livro sequer do Olavo de Carvalho. Tudo que falei é com base em seus inúmeros vídeos e nas mais conhecidas de suas opiniões. Elas claramente manifestam um desconhecimento ou indiferença com o pensamento empírico, base da ciência moderna.

Se seus livros são diferentes de seus vídeos, a ponto de mostrar que este desprezo ou indiferença são enganos de seus críticos, posso afirmar que seus vídeos, pelos quais ele se tornou tão conhecido, tem fundamentos radicalmente contrários aos livros que ele escreve. Se ele fala coisas tão discrepantes daquilo que ele escreve, não recomendo a leitura de Olavo de Carvalho a quem preza a coerência no pensamento.

>> Se você não está em busca de algo empírico, tudo bem, quer mais filosofia mesmo? Também não aconselho Olavo de Carvalho. Se você pode ler um livro introdutório ao pensamento de Spinoza, Nietzsche, São Tomas de Aquino feito por um estudioso da área (o analfabeto funcional que pesquisa muito e se sujeita a debates e escrutínio de colegas de área) por que conhecer estes autores por meio de autor que não se sujeita a debates acadêmicos e escrutínio de outros estudiosos?

Qual é a novidade de Olavo de Carvalho?

Posso trazer para discussão inúmeros exemplos de como o Olavo despreza ou é indiferente à pesquisa empírica é possível também discutir os fundamentos do pensamento empírico, mas dificilmente questionar seus resultados práticos: remédios, vacinas, internet, máquinas, tecnologias diversas, engenharia genética, satélites, etc.

Procurei ao máximo não fazer considerações ideológicas sobre Olavo de Carvalho, não o julgo, pelo menos aqui, por apadrinhar e promover o conservadorismo que alimentou a extrema direita no Brasil. Nem o julgo pelo conjunto de sua obra, pois não li nenhum dos seus livros e nem vi todos os seus vídeos.

Critico as consequências de pensar a partir de filosofias medievais e seus interpretes, um mundo fundamentado na ciência e tecnologia, tendo estas como fundamento o empirismo e a crítica ao dogmatismo do pensamento religioso. Se olavistas refletirem bem, o maior adversário do pensamento de seu mestre não é o comunismo, mas algo mais abrangente que se encontra nas formas mais modernas de se produzir ciência, conhecimento e tecnologias.

Wendel Alves Damasceno
Enviado por Wendel Alves Damasceno em 04/04/2020
Reeditado em 04/04/2020
Código do texto: T6905986
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