A República contra Bolsonaro
A República reage aos desatinos de Jair Bolsonaro. Se antes as palavras dos seus não eleitores em 2018 eram tomadas como inconformidade com o resultado das urnas e medo de perder a "mamata", agora podemos ouvir as mesmas ojerizas e temores pelas bocas dos que antes o apoiavam e de grupos que rejeitaram o petismo há muito ou pouco tempo atrás.
Logo nas primeiras semanas de seu mandato, vimos o STF se opor a suas medidas, vimos parte de seus eleitores arrependidos, vimos o próprio Congresso resistente a forma como ele conduzia a política e seus pronunciamentos conflituosos e nada diplomáticos. Vimos OAB, cientistas, imprensa, governadores, prefeitos, servidores públicos, e membros do seu antigo partido se manifestando contra o presidente e apontando claramente seus equívocos em suas mais diversas políticas - meio ambiente, economia, educação, saúde, segurança.
Sem falar na atitude ambígua, para a nossa sorte, do Ministério da Saúde que concorda com o presidente, mas opta pelo bom senso e responsabilidade social.
Em outras palavras, Bolsonaro conseguiu fazer com que aqueles setores importantes e vitais para o funcionamento da sociedade entendessem o que é uma República. Repúplica significa, a grosso modo, que o Estado e o governo de uma nação não agem como se o poder lhe fosse uma propriedade particular, como se um mandato fosse uma carta branca dada pela maioria para o mandatário fazer o que bem entendesse.
A Res Publica, a coisa pública, sua gestão e leis implicam em processos racionais que eliminem das decisões e procedimentos a vontade que não seja oriunda do povo. As decisões são políticas, mas nunca contra a coisa pública e nunca como se fosse uma coisa privada e particular, a qual se permite conduzir conforme caprichos e desejos de quem a possui.
As decisões técnicas servem como um instrumento para que a coisa pública seja atendida e não submetida a anseios e preconceitos particulares de quem governa. Por isto a ciência, a tecnologia, a erudição e os saberes diversos não só fortalecem a República como também se tornam seu fundamento e sustentáculo. São elas que permitem que as decisões repulicanas, responsáveis coletivamente, sejam as melhores a serem tomadas.
É óbvio que quem lida com algo privado e de sua posse faz quase o que bem entender com o que tem: experimenta, modifica, testa e submete aos seus caprichos e devaneios - e ainda assim, contanto que não cause prejuízo a bens comuns e de terceiros.
A luta contra os efeitos nefastos do Covid-19 é de responsabilidade coletiva, cabe ao Estado e os entes federados, tendo eles a responsabilidade do poder conferido pelo povo, de zelar pelo bem comum. Cientistas, estudiosos, mídia, profissionais da saúde, servidores e professores também possuem responsabilidade pública e não estão fugindo dela espalhando impaupérios e motivando comportamentos nocivos a preservação da saúde pública.
Agora, por outro lado, vejam o presidente e seus ainda fieis apoiadores e outros que evitam serem reconhecidos como tais, mas que sabemos pela conversa o tipo de ideologia em que suas mentes se encontram imersas. Estas pessoas são republicanas? Cabe, segundo o que descrevi chamar a estes disseminadores da praga da última década também chamada de fake news, ainda mais nociva que o Covid-19, de republicanos? Chamariam a partir de como se comportam e falam de republicanos?
A Republica rejeita Bolsonaro como um corpo estranho que ameaça a adoecer o resto do organismo social. É notório para qualquer analista político como o Congresso e o Poder Judiciário não tem feito outra coisa que inibir e moderar atitudes inconsequentes daquele que ocupa neste momento a presidência.
É notório como suas reformas e medidas provisórias precisam ser devidamente ajustadas e mesmo alertadas para que não esbarrem na Constituição e ou causem grave prejuízos aos interesses públicos.
Independente da ideologia de cada, com suas identificações políticas particulares, o momento agora é de defender o que temos de mais precioso, ainda que muito a desejar, que é a República. Até quando o congresso, o judiciário e as organizações da sociedade civil conseguiram que a coisa pública não seja prejudicada gravemente por um presidente que nunca se mostrou a altura da responsabilidade confiada a mesma?
Será necessária uma tragédia de grandes proporções para entendermos que a tolerância com o intolerante levará a tirania deste último ou a um caos social de grande prejuízo para o coletivo?