Território como sagrado ancestral

Território como sagrado ancestral

O atual presidente da República, Jair Bolsonaro, é declaradamente um inimigo dos povos indígenas. Nas suas falas e ações enquanto presidente do país, Bolsonaro ataca os povo originários de nossas terras, tendo propagado o preconceito e a discriminação através de suas falas e a perda de direitos e o genocídio através de suas ações. Recentemente Bolsonaro afirmou publicamente que o índio está evoluindo e quer ser gente como nós, declarando assim a ideia, sua ideia e de seus seguidores, que a população indígena de nossa nação não faz parte de nossa espécie e só se tornarão seres humanos na medida em que abandonarem sua terras e seus costumes em troca das terras e costumes do homem branco. Terras e reservas queimadas devido ao enfraquecimento da fiscalização e mortes por conflitos territoriais devido a confiança que os latifundiários hoje estão voltando a ter graças a decretos do governo e ao enfraquecimentos das instituições de fiscalização. Esse é um resumo muito resumido do atual cenário de luta quotidiano pela resistência territorial e de identidade que estão travando nossos povos originários. E podemos consensuar que um dos maiores motivos responsáveis por estes conflitos é a questão territorial, haja vista que os grandes latifundiários e o próprio governo quer expropriar, roubar, explorar e usurpar estas terras para fins lucrativos, de enriquecimento e manutenção da garantia da propriedade privada e os povos indígenas lutam por suas reservas e territórios para garantirem a continuidade da ancestralidade dos povos originários e suas identidades, costumes, línguas, comidas, tradições, bem como dar continuidade a sua cosmovisão do mundo e do universo, da relação do ser com a terra e do cultivo ao sagrado ancestral.

A relação dos povos indígenas com seus territórios perpassa o sagrado ancestral. Para que nós tenhamos uma ideia minimamente formada acerca da relação ser e terra, expropriação territorial e luta de resistência, é preciso que caminhemos entre dois termos, muito bem contextualizados por Nêgo Bispo (2015) em Colonização, Quilombos, que é a colonização e a contra colonização. Todos temos conhecimento de que estas terra denominadas Brasil a qual pertencemos já era habitada antes de os portugueses e europeus chegarem a elas. Aqui viviam centenas de milhares de tribos, povos, reinos que há anos se constituíram com seus costumes, culinárias, tradições, cosmovisões e línguas. Povos hoje denominados e apropriados do termo indígenas. Os não originários, a qual concordamos com o autor em denominar eurocristãos, invadiram estes territórios construídos e já constituídos por um povo, cultura, riquezas e línguas e escravizaram os originais, exploraram suas terras, expropriaram suas riquezas, tentaram destruir suas tradições, culinárias, línguas, cosmovisões e religiões em função do estabelecimento de um único modelo padrão de sociedade, o modelo eurocristão, branco, hétero, cristão, monoteísta. E assim instituíram a colonização ao que hoje é a República Federativa do Brasil. Todavia, a instauração da maldosa e cruel colonização não se deu sem a resistência guerreira dos povos originários. Desde as primeiras tentativas de exploração e expropriação por parte dos portugueses, as populações indígenas resistiram bravamente para defender seu povo e seu território, inaugurando assim o que hoje podemos denominar de contra-colonização.

A colonização se reproduz até hoje por outras vias, foi se atualizando e se renovando em suas formas de operar ao longo dos anos passados e sempre sistematicamente através das instituições de poder, como sobretudo a Igreja e o Estado. E, também, a contra-colonização acompanhou todos esses processos de colonização travando resistência sistemática a cada um deles, na busca de um país justo, que faça justiça ao seus povos originários e que combata a exploração e expropriação da colonização. Antônio Bispo (2015) nos convida a seguinte análise:

"Vamos compreender por colonização todos os processos etnocêntricos de invasão, expropriação, etnocídio, subjugação e até de substituição de uma cultura pela outra, independentemente do território físico geográfico em que essa cultura se encontra. E vamos compreender por contra colonização todos os processos de resistência e de luta em defesa dos territórios dos povos contra colonizadores, os símbolos, as significações e os modos de vida praticados nesses territórios." (BISPO, A. 2015. p 47-48)

Quando, em 2020, o presidente da república emite a opinião de que os povos originários precisam ser gente como nós, ele manifesta sua política colonizadora, estabelecida a partir de um processo etnocêntrico eurocristão delirante e atualizado, neocolonial, que se pauta pela substituição de uma cultura pela outra, tal qual aponta Bispo (2015). E é neste contexto de neocolonização que o atual cenário do território dos povos indígenas está situado, todavia não sem respostas. A contra-colonização, que é esse processo de luta em defesa da terra e da relação sagrada do ser com ela acontece diuturnamente quotidianamente. Os povos originários, que têm uma cosmovisão politeísta do mundo, têm uma sagrada conexão com a natureza, haja vista que diviniza muitos aspectos da natureza e a tem como mãe, que cria, alimenta, sustenta e ama. O originário não tem e nem possui as terras, as terras o tem e o possui. O originário precisa da terra, para o cultivo, sobrevivência e vivência. A terra é mãe, é sagrada. É nesse sentido que se pauta a luta da contra-colonização, para que caia todo o sistema opressor que se reproduz e insiste em explorar e expropriar povos, riquezas, religiões, culturas e línguas dos povos originários, seus territórios e territorialidades.

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA:

BISPO, A. Colonização, Quilombos: modos e significados. Brasília, 2015.

Whallison Rodrigues
Enviado por Whallison Rodrigues em 10/03/2020
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