O Ponto de Inflexão e O Espírito das Ruas.
(Milton Pires)
O Governo de Jair Bolsonaro, no seu oitavo mês, chegou, assim eu o afirmo, no seu ponto de inflexão, no seu ponto de “não retorno”.
Àqueles que não são fanáticos capazes de alegar “petismo” por parte de qualquer um que questiona os atos celerados, as decisões absurdas (que prefiro nem citar) que Bolsonaro já tomou até aqui, é mais do que evidente que metade da “gasolina ideológica”, metade do combustível mitológico capaz de levar o avião governamental até 2022, já acabou.
O Brasil voa com menos de meio tanque de querosene sobre o mar do caos.
Esse ponto de inflexão, essa marca de “não retorno” que eu mencionei acima, manifesta-se pela decisão que Bolsonaro será obrigado a tomar no que diz respeito à sanção ou ao veto deste delírio hermenêutico, desta teratogenia jurídica, chamada Projeto de Lei 7.596/2017 – a famosa “Lei do Abuso de Autoridade”.
Sobre este Projeto de Lei de menos de dezoito páginas que eu, sem qualquer formação em Direito, sem ajuda de qualquer dicionário, fiquei completamente perplexo, fiquei estarrecido de ler, basta dizer o seguinte: ou uma autoridade age DENTRO da Lei, e aí não existe “abuso”; ou uma autoridade age FORA da Lei, e daí também não existe “abuso” porque o nome disso é CRIME.
“Lei do Abuso de Autoridade” é uma teratogenia, um absurdo que somente uma Nação no mais completo colapso institucional, legal e moral poderia pensar em criar. Nem mesmo a República de Weimar aceitando Adolf Hitler como um legítimo postulante democrático ao Governo poderia pensar numa coisa assim.
Toda ciência política, tudo que se escreveu até hoje sobre ela, tem, no conceito de “representação”, o seu fundamento. Em ciência política, o único capital, o único verdadeiro poder de um mandatário, é a sua capacidade de simbolizar, de personificar, de representar aqueles que o elegeram. O Poder é a possibilidade de gerar, eu faço sempre questão de lembrar Hannah Arendt, consenso. Sem consenso não há Poder Político. Sem Poder Político não há governo representativo.
Não adianta pensar, como fez questão de dizer Mao Zedong, que o "Poder Político nasce do cano de uma arma", ou acreditar como João Dória cortejando Joice Hasselmann, que o Poder está na BOVESPA ou outros endereços da Avenida Paulista.
Quem elegeu Bolsonaro foi o “espírito das ruas” que derrubou Dilma Rousseff mas Dilma, todos nós o sabemos do ponto de vista real, do ponto de vista histórico, foi derrubada por uma Organização Criminosa chamada hoje de “MDB”, por uma das maiores crises econômicas de toda história brasileira, por uma Operação da Polícia Federal e do Ministério Público chamada “Lava Jato” e pelas redes sociais.
Foi a conjunção dos fatores que apontei acima que derrubou o Governo Petista. Hoje a Organização Criminosa passou a se chamar “Centrão”, a crise econômica está voltando por causa da guerra comercial entre a China e os Estados Unidos e do horror que se aproxima para Argentina e as redes sociais já não são mais suficientes para defesa das barbaridades que Bolsonaro faz e diz.
“Ah, mas e o cabo e o soldado, Dr. Milton??” “E o artigo 142??” O cabo e o soldado, meus caros amigos, estão preocupados com a reforma da previdência dos militares; não com Lei de Abuso de Autoridade!
Resta, dos elementos que enumerei acima, a Operação Lava Jato. A Operação Lava Jato nunca foi e jamais vai ser, eu assim já o disse, a manifestação do Estado de Direito no Brasil.
Mais bem é ela um estertor, uma convulsão final, daquilo que o Estado de Direito um dia já foi, mas ela é, no presente momento, tudo que restou de combustível político ao Governo Bolsonaro – e agora chegou a hora do fim desse combustível.
Se vetar o Projeto de Lei de Abuso de Autoridade, o avião político de Bolsonaro vai cair; se não vetar, será o fim desse restinho de querosene político chamado Operação Lava Jato, e aí o avião também cai.
Se não houver veto TOTAL dessa barbaridade (mais uma) cometida pelo Congresso, o Ministro Sérgio Moro não tem mais qualquer condição de permanecer no Governo sem levantar dúvidas sobre seu próprio caráter e ambição chegar ao STF.
Se houver vetos que desagradem a Organização Criminosa dentro do Congresso e do STF, Bolsonaro dificilmente conseguirá colocar um de seus filhos como embaixador em Washington e evitar o processo ou até a mesmo a prisão do outro que é senador aqui no Brasil.
Não há “solução salomônica”, não! Não existe o meio termo de “deixar algumas coisas no Projeto de Lei que foi aprovado como elas estão e de vetar outras”.
Bolsonaro disse, em recente entrevista, que “de um jeito ou de outro ele vai apanhar”. Se eu estivesse no lugar dele, diria que “de um jeito ou de outro eu vou ser derrubado”.
A diferença entre eu e ele é que eu escolheria cair com um mínimo de vergonha na cara e de dignidade.
17 de agosto de 2019.