TUDO ESTÁ DE MORO A PIOR

     Eu li uma obra alentada sobre o trabalho do então juiz Sérgio Moro na Lava Jato, escrita pelo jornalista Vladimir Netto. Ali podemos ver o excelente trabalho que ele realizou, enfrentando interesses poderosos e a corrupção em voga, conseguindo colocar atrás das grades uma plêiade de sanguessugas nacionais e alguns com ligações internacionais. E foi gente de vários partidos, majoritariamente os que integravam a base aliada que deu sustentação aos governos de Dilma e Lula, sem falar que o próprio ex-presidente foi preso por ser quem deveria primar por governar com probidade, o que nunca foi o seu forte.
     Antes de qualquer mi-mi-mi dos petistas e afins, é preciso que se diga que as sentenças condenatórias prolatadas por Sérgio Moro passaram praticamente incólumes pelas instâncias superiores, como o Tribunal Regional Federal da Quarta Região (TRF4), o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o próprio Supremo Tribunal Federal (STF), não obstante ter este último órgão aliados históricos da impunidade. Apesar de algumas derrapadas, como a divulgação de um diálogo entre Lula e Dilma no qual ele pleiteava espertamente foro privilegiado, seu trabalho foi imprescindível nessa quadra da vida brasileira.
     Todavia, de forma um tanto quanto inexplicável, esse céu de brigadeiro acabou turvado, assim como resultou tisnada uma certa carta branca. Ao aceitar o convite de Jair Bolsonaro para ser ministro da Justiça, Sérgio Moro, sabedor do seu imenso capital popular, imaginou que poderia implementar suas ideias no novel governo praticamente sem oposição. Afinal, já se constituíra como uma figura pública marcada por uma imagem de paladino da luta contra a corrupção. Mas as coisas não sairiam bem assim e o eficiente juiz se meteu numa enrascada que arruinaria sua reputação e o transformaria em um personagem caricato da política brasileira, algo como um Sancho Pança de um Dom Quixote malévolo.
     Não foram poucos os constrangimentos que Jair Bolsonaro impôs ao seu ministro. Entre eles, pode-se citar a revogação da nomeação de Ilona Szabó para o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, a assinatura de um decreto de armas que desmoralizou o direito de autodefesa do brasileiro e a passagem do Coaf para as mãos do ministro Paulo Guedes, um serviçal dos empresários e do sistema financeiro.
     O que se viu na evolução dos acontecimentos é que a força de Sérgio Moro no governo federal não passou de chuva de verão. Foi uma ilusão. Em vez de ele enquadrar Jair Bolsonaro, usando de sua presumível força política, o capitão do mato fez valer sua força e seus compromissos retrógrados para transformá-lo em uma figura decorativa do Palácio do Planalto. Quando dois bicudos se encontram, o mais matreiro transforma o outro em pajem.
     Diz um provérbio africano que não se pode lavar a água suja. A biografia de Sérgio Moro, que, até algum tempo atrás, poderia ser disputada no ombro a ombro por bons historiadores e escritores interessados em escrevê-la, agora parece estar definitivamente comprometida. Jair Bolsonaro já se afunda rapidamente perante a história. Com ele, leva a trajetória de um juiz que um dia pensou em dar uma grande cartada em sua senda jurídica. Só que o dono da carpeta já tinha terceirizado a jogatina.
Landro Oviedo
Enviado por Landro Oviedo em 12/08/2019
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