BEIJANDO O AÇOITE.
Por Anderson Du Valle.
Dias difíceis. Quando tudo tínhamos, queríamos mais, mas quando pouco temos o de antes parece tão suficiente. Inebriados por uma onda gigante, alicerçada por uma base efêmera, mas que possui um poder avassalador e que de verdade sempre esteve pronta a eclodir. É importante dizer que só passou a ser possível cortar tão profundamente, quando os grandes “pensadores” obscuros encontraram ressonância na ignorância de alguns e na autoafirmação de tantos, pautados por sua própria integridade apodrecida.
Os novos tempos, onde o pensamento pode ser compartilhado a profusão, não faz distinção entre bons e maus pensamentos, não se consegue distinguir prodígios nesta grande ambiguidade, tampouco caráteres, tendências e índoles. Estes tempos passaram a enunciar em caixa alta o advento do caos, o prenúncio de um período sombrio onde quem deveria proteger, mata, legisla para os seus e conhecendo os meandros do grande cipoal legal, destorce os fatos, manipula a opinião e apresenta o “cordeiro” como uma ameaça real ao que se pode chamar de “pavimentação ao poder” para uns, mas que fundamentalmente se fortalece ante o povo menos esclarecido, como uma “vitória” contra um sistema que até então lhe era favorável e que passa a atuar de forma reversa atirando os incautos e inocentes úteis ao desterro de suas próprias escolhas equivocadas.
Sonâmbulos nos tornamos, caminhando em direção a um precipício do qual já nem lembrávamos a sua profundidade, talvez por isso fizemos coro a “nova era”, sem nos darmos conta de que já havíamos conseguido a duras batalhas nos afastarmos desta “beira”, por metros que fosse.
A palavra discernimento há muito deixou vaga sua singularidade nos livros sem acesso e permitiu que transparecesse o imediatismo das frases curtas produzidas em um micro aparelho, por uma mente do mesmo quilate, porém atingindo em cheio e com precisão milimétrica os alvos mais vulneráveis e não estou falando só do ignorante que lê e se satisfaz com a informação, mas também e principalmente, a quem, por se sentir representado e sem escrúpulo algum, replica, mesmo sabendo a medida exata do seu ato.
Imaginei que o tempo nos levaria a um modo de pensamento justo, porém, embora tenhamos um choque de realidade tão duro, ainda encontramos nestes agentes, a defesa incondicional do erro, a ofensa gratuita e o engrossamento das fileiras reacionárias latentes.
A população, grande vítima deste desregro social, não entende onde está o ponto fora curva que os levou ao desfiladeiro, mas sabe que o retorno será lento e doloroso. Arrependimento, maldizeres e desespero, colide frontalmente com aquele indivíduo que lhe é caro e que se faz tão presente, mas que de alguma forma desenvolveu e se entrincheirou na barreira hostil do interesse alheio e aliou-se ao patronato, a isso chamamos de convicção, ou seja, o último estágio do convencimento, onde evoluir, devido ao pensamento refratário, já não cabe, e retornar é impossível devido ao alto grau de comprometimento que o convicto provoca a si próprio.
A esperança, outra vez se instala nos corações de quem já teve suas forças sugadas e desgastadas a serviço do sistema que o engole. A esperança não é uma grande aliada, pois onde há esperança é por que há falta ou por que nunca houve por completo o que tanto se busca.