O DEMÔNIO DE NIETZSCHE

 
Ás vezes acordo com o demônio do Nietzsche soprando no meu ouvido: “ hás de viver por toda a eternidade esse mesmo momento.” Talvez esse seja um mal de quem consegue chegar à terceira idade. Quem vive tanto tempo sempre tem a impressão que já passou pelo mesmo momento muitas vezes.

O eterno retorno é um fato. Se não for, é a minha mente que está me pregando uma peça, fazendo-me voltar, por exemplo, aos idos de 1966,  quando era adolescente e assistia, inconformado, a nossa seleção de futebol, depois de dois títulos mundiais conquistados, dar o maior vexame na Inglaterra, voltando para casa desclassificada na primeira fase da competição. Pensei que nunca veria uma seleção brasileira pior do que aquela, mas me enganei. A do Filipão, em 2014, a superou em tudo que pode haver de ruim.
Há outros paralelos que não podem ser esquecidos. Em 1966 a ditadura ainda não havia sido instalada. Os milicos haviam se apropriado do governo em 1964, mas todo mundo esperava que eles fossem verdadeiros democratas que só tinham assumido o poder para resolver a bagunça que o Jango instalara no país. Igualzinho ao que os petistas e o PMDB fizeram agora. Todo mundo achava que eles iam devolver logo o poder aos civis, depois de fazer uma limpeza no mundo político, que, diga-se de passagem, era um lixo só.  Como agora.
Mas todos sabem o que aconteceu. Foi tanta gente brigando por uma fatia do bolo, que quem tinha a faca (e as armas) gostou da fruta e resolveu não dividir com ninguém: daqui não saio, daqui ninguém me tira. E o país teve que curtir mais de vinte anos de ditadura militar. 
Escrevo este texto pensando no que vai acontecer ao país se as coisas seguirem o rumo previsível.  Metade do Congresso Nacional está sendo processada. A outra metade é constituída de gente nova buscando espaço. Farão qualquer coisa para obtê-lo. O Bolsonaro lembra o Collor querendo mudar tudo. O Collor tinha um irmão maluco que acabou derrubando-o. O Bolsonaro tem os filhos, que ao que parece, ainda vão espalhar muita caca no ventilador do pai.
Os militares estão de volta ao poder. Pelo voto direto. Mas se o Congresso e o STF começarem a botar areia nas intenções deles, o que poderá acontecer? Há um cheiro de mil novecentos e sessenta e quatro no ar. E para piorar, tem essa seleçãozinha do Tite. Será que o maluco do Nietzsche tinha razão? Estamos mesmo condenados a viver eternamente o mesmo momento? Alguém já disse que é o vai e vem das ondas, com seu imutável marulho, que fabrica as pedras da praia. Mas até as pedras cansam. Confesso que já estou cansado disso. Gostaria mesmo é que algo diferente acontecesse para quebrar de vez esse eterno padrão de macunaimisse que, ao que parece, estamos condenados a viver neste paraíso dos trópicos.