Repensar a efetivação da Democracia é tarefa urgente
Repensar a efetivação da Democracia é necessidade urgente
Publicado no Blog Diário do Poder, Brasília/DF, em 8/11/18
A democracia como sistema politico, organizando a convivência social, fundamenta-se em princípios morais e regras de comportamentos, constantemente explicitados e aceitos pela maioria das pessoas. É uma vagarosa e persistente construção, uma conquista da Humanidade. Não é um bem natural como a vida e a consciência.
Este ideal vem funcionando com altos e baixos desde o sec. XIX. Prestou grandes serviços ao aperfeiçoamento do Humanismo, do desenvolvimento científico e tecnológico e inegáveis conquistas econômicas e sociais. Permitiu, também, que se estabelecessem injustas distinções na distribuição da riqueza gerada, entre pessoas e regiões de um mesmo país e do planeta, fruto da ganância e da prepotência de muitos que se assenhoraram do poder político. A educação da população, com gritantes desníveis de qualidade, conseguiu, no entanto, que os povos passassem a ser mais bem informados. Assim sendo, as injustiças sociais e as formas de dominação politicas foram mais bem entendidas por milhões de homens e mulheres, forçando, com o correr das décadas, por meio de revoluções e das instituições e leis, a melhoria da qualidade de vida de grandes parcelas das populações embora permanecendo outra expressiva parcela na mais abjeta miséria sem perspectivas, no atual sistema de convivência, de ascenderem a mais dignos patamares de existência.
Os políticos utilizam refinadas técnicas de marketing para obter os necessários votos, em escrutínios espaçados no tempo, para as suas eleições como parlamentares e executivos públicos. Esses políticos vão estabelecer as leis que regularão o comportamento coletivo, muitas vezes sem atender as reais e ainda mal expressas aspirações populares de justiça social. As lentas conquistas modernizadoras, dos ideais de igualdade e de dignidade das pessoas, advêm das ações dignas e competentes de uma minoria de perseverantes idealistas, homens e mulheres que se dedicam à causa publica por amor ao ideal da democracia.
Há que se pensar no aperfeiçoamento desse sistema que prestou inestimável auxílio à promoção da liberdade e da justiça, cumprindo o seu papel histórico. Por exemplo:
- o papel e a organização dos partidos políticos, representações que pretendem ser das grandes alternativas do pensamento sobre as formas de organização e de funcionamento das sociedades, inclusive da próxima futura sociedade global;
- a liberdade de iniciativas pessoais e os limites de intervenção do Estado para a promoção do bem comum;
- eleições periódicas diretas com um eleitorado adequado, até que os sistemas educacionais de qualidade promovam uma efetiva igualdade de condições de discernimento para todos, pois num mundo cada vez mais complicado deveria ser exigida alguma escolaridade, para que os votos possam expressar maior consciência e responsabilidade sobre os temas que estão sendo decididos. As sociedades não podem ser geridas por detentores de conhecimentos superficiais ou por aqueles que têm acesso às aprimoradas técnicas de propaganda para serem eleitos;
- níveis adequados de representação parlamentar qualificada para o enfrentamento correto dos problemas dos municípios, estados, regiões, país e planeta;
- regulação da propaganda politica de tal forma que o povo seja honestamente informado e que não seja submetido a falsas noticias ou meias verdades, transmitidas pelos modernos meios de comunicação, como forma de convencimento politico, como tem acontecido com as atuais “redes sociais”;
- que se resolva, com o auxílio da informática, a morosidade da justiça em suas várias instancias, o que resultaria em confiança crescente no sistema social representativo adotado;
- consultas diretas e mais frequentes para determinados assuntos relevantes para a vida dos povos, o que já é possível com o auxilio da tecnologia;
- as relações, mais rápidas e desburocratizadas, entre o poder legislativo – “o supremo poder” - e o executivo e o judiciário, em função das sempre novas aspirações da população, fato que causa natural instabilidade nas sociedades que, no entanto, não deveriam se perturbar por conta da confiança que devem ter na solidez crescente das Instituições criadas para assegurar a instabilidade democrática, motivada pela alternância do poder: - instituições sólidas e eficientes são a maior garantia da liberdade e do sistema democrático de convivência;
- além das liberdades tradicionais outras liberdades deverão ser garantidas no futuro próximo, como a liberdade da opressão da fome e das doenças, da humilhação de moradias indecentes e do vestuário miserável, do desgastante afastamento da vida social pela não existência de transporte publico acessível, do angustiante desemprego, que não é mais uma questão econômica, mas sim uma tragédia humana a ser resolvida, mesmo com as dificuldades colocadas pelo irreversível e vertiginoso desenvolvimento da tecnologia, que desemprega, aumentando progressivamente os desníveis de renda entre pessoas e regiões de um mesmo país e do planeta;
- a construção de uma convivência fraternal e solidaria que será fruto da pregação das religiões, dos sistemas legais e jurídicos, mas principalmente o resultado de sistemas educacionais fundados nos princípios do Humanismo Integral que consolidará, vagarosa e progressivamente, a densidade moral das sociedades, aspecto necessário ao entendimento da indispensável interdependência democrática de todas as pessoas na busca do ideal da solidariedade, da paz e da justiça;
- o meio ambiente, entendido como um direito de toda a humanidade ao seu usufruto em condições sadias, condição mesma para a vida no planeta Terra;
- e, por fim, o papel de uma imprensa livre, moralmente obcecada pela verdade, honesta e competente na permanente necessidade de informar a população, de tal forma que a mesma possa, consciente e responsavelmente, participar dos processos decisórios e das escolhas dos seus melhores representantes, nos vários níveis de poder.
Com a atual velocidade de disseminação das informações e com o empobrecimento progressivo da formação intelectual da juventude, é aconselhável que se trate logo da discussão do aperfeiçoamento dos mecanismos de expressão dos novos objetivos e exigências da democracia.
Eurico Borba, escritor, ex-professor da PUC Rio e ex-Presidente do IBGE, mora em Ana Rech, Caxias do Sul.